Noites de Outubro

Noites de Outubro

Capítulo 1: O Encontro

Celine gostava do silêncio das noites de outono. O vento frio que dançava pelas folhas secas, o cheiro de maresia misturado com terra molhada. Era naquele cenário que ela se sentia mais viva. Saía sempre com sua câmera pendurada no pescoço, procurando momentos escondidos na cidade para capturar.

Naquela noite, ela caminhava pelas ruas quase desertas de um bairro antigo, onde casas centenárias contavam histórias com suas janelas quebradas e muros cobertos de heras. Uma luz amarelada escapava de um antigo lampião, iluminando suavemente a calçada. Ela levantou a câmera e clicou. O som do obturador quebrou a quietude, mas trouxe um pequeno sorriso ao seu rosto.

— Bonita escolha de ângulo — disse uma voz atrás dela, profunda e serena.

Celine virou-se devagar. Um homem estava parado a poucos passos de distância. Alto, magro, de pele pálida e olhos escuros como a noite. Havia algo antiquado em sua presença, como se ele pertencesse a outro século. Ele usava um sobretudo escuro, e as mãos estavam enfiadas nos bolsos.

Ela se afastou um passo, instintivamente.

— Desculpa, não quis assustá-la — ele disse, erguendo as mãos. — Só achei curioso alguém fotografando esse lugar.

— Eu gosto de lugares esquecidos — respondeu ela, ainda observando-o com cautela.

Ele sorriu, um sorriso pequeno, contido, quase triste.

— Isso diz muito sobre você.

— E você? O que faz aqui? — perguntou, tentando parecer segura.

— Caminho — disse apenas. — Às vezes, é tudo o que posso fazer.

Algo em sua voz tocou Celine. Era como se cada palavra carregasse décadas de cansaço. Mas ao mesmo tempo, ele não parecia velho. Talvez fosse só impressão.

— Sou Celine — disse, meio sem pensar.

— Ethan.

O nome combinava com ele. Soava antigo, fora de lugar, assim como seu olhar. Eles ficaram em silêncio por um instante. Nenhum dos dois parecia ter pressa.

— Você é fotógrafa? — ele perguntou.

— Não profissional. Mas tento capturar aquilo que ninguém vê.

Ele assentiu levemente, depois ergueu o olhar para as estrelas. A luz do lampião iluminava seu rosto com delicadeza, revelando traços quase perfeitos, como se esculpidos. Celine sentiu um arrepio — não de medo, mas de algo desconhecido, uma sensação nova.

— Posso te fotografar? — perguntou de repente.

Ethan a encarou, surpreso. Por um instante, ela achou que ele fosse recusar, mas então ele assentiu.

Celine levantou a câmera, ajustou o foco, e clicou. A imagem capturada foi estranha: o fundo apareceu, mas Ethan... não.

Ela baixou a câmera, confusa.

— Aconteceu alguma coisa?

— Acho que a lente embaçou — disse, mesmo sabendo que não era verdade.

Ele sorriu de novo, e dessa vez havia algo diferente. Uma espécie de cumplicidade silenciosa.

— Talvez eu não saia bem em fotos — brincou.

— Talvez você seja feito de sombras — disse ela, sem pensar.

Ele a olhou, como se soubesse exatamente o que ela queria dizer.

— Pode ser — respondeu, enigmático.

Celine não sabia explicar o porquê, mas não queria que aquela conversa terminasse. Havia algo nele que a atraía, como um livro antigo que você encontra por acaso e sente que precisa ler, mesmo sem saber do que se trata.

— Você mora por aqui? — ela perguntou.

— Há algum tempo. Mas não me prendo a lugares por muito tempo.

— Por quê?

— Porque pessoas notam demais quando você não envelhece.

O silêncio que se seguiu foi pesado, carregado de significados.

— Você tá brincando, né? — ela disse, tentando rir, mas algo dentro dela dizia que não era brincadeira.

Ethan não respondeu. Apenas a olhou, e naquele olhar havia uma verdade antiga, profunda, assustadora e bela.

Celine sentiu o coração acelerar.

— É melhor eu ir... — disse, recuando um passo.

— Eu não te farei mal, Celine — disse ele, calmo.

Ela não sabia se acreditava. Mas também não conseguia sair.

— Por que me falou tudo isso?

— Porque você é diferente. Porque quando me olhou, não viu só o estranho na noite. Viu algo mais.

Celine engoliu em seco. O vento soprou outra vez, fazendo as folhas dançarem aos pés deles.

— Talvez eu queira te ver de novo — ela disse, baixinho.

Ethan sorriu, pela primeira vez com algo de esperança.

— Então venha aqui amanhã. Mesma hora.

Ela assentiu. Virou-se, finalmente, e começou a caminhar de volta, sem olhar para trás.

Mas no fundo, sabia que aquela noite havia mudado tudo.

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Comments

Ester

Ester

hum um livro bem curto vamos ver como termina

2025-04-08

1

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