A noite estava quieta, quase monótona, enquanto eu terminava de mexer no celular. Sentado à beira da cama, com o quarto iluminado apenas pela luz fraca da luminária, eu estava à beira de desligar tudo e ir dormir. Mas algo na janela chamou minha atenção.
No começo, achei que fosse só o reflexo de uma sombra qualquer, mas quando olhei direito... Ah, era ela.
Mavis Evernight.
Ela estava do lado de fora da casa dela, tentando subir pela janela do próprio quarto, como se fosse uma ladra amadora invadindo a própria residência.
— O que você está aprontando agora, Evernight? — murmurei, sem conseguir conter um sorriso.
Fiquei observando, encostado na janela do meu quarto. Ela parecia determinada, mas sua habilidade em escaladas deixava a desejar. Em um momento, perdeu o equilíbrio e quase escorregou.
— Elegância, zero. Teimosia, cem por cento.
Era fascinante assistir. Mesmo sabendo que ela não tinha a menor ideia de que estava sendo observada, havia algo intrigante naquela cena. Por que diabos ela não usava a porta como uma pessoa normal?
Depois de alguns minutos — e muito esforço —, ela finalmente conseguiu entrar. Antes de fechar a janela, parou por um instante e olhou na minha direção. Não sei se ela me viu ou apenas estava verificando se havia alguém por perto, mas fiquei parado, segurando a risada.
Assim que ela desapareceu, deixei escapar um suspiro e me joguei de volta na cama.
— Com certeza, Evernight, você é a pessoa mais estranha que já conheci.
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Na manhã seguinte
O sol mal havia nascido, mas minha irmãzinha, Ivy, já estava correndo pela casa, segurando um pedaço de pão na mão e gritando como uma sirene.
— Josh! Josh! Você viu a Luna?
Pisquei algumas vezes, ainda meio grogue, antes de responder:
— A Luna? Não... Ela deve estar no quintal, não?
— Não está! — ela respondeu, cruzando os braços e fazendo um bico. — Eu procurei em todo lugar.
Sentei-me à mesa, pegando minha xícara de café enquanto ela continuava seu drama. Ivy era uma pequena força da natureza, com um amor incondicional por aquela gata.
— Tudo bem, tudo bem. Eu ajudo você a procurar.
— Promete? — Ela me olhou com aqueles olhos brilhantes que eram impossíveis de ignorar.
— Prometo.
Ivy sorriu, mas eu não conseguia afastar uma sensação estranha. Luna era uma gata esperta, difícil de simplesmente desaparecer. Algo estava fora do normal
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Na escola
Cheguei mais cedo do que de costume. Enquanto esperava o sinal tocar, sentei no banco de sempre, observando o movimento do pátio. Foi então que vi Mavis.
Ela estava de costas para mim, agachada em um canto do jardim, mexendo em algo. Franzi o cenho, curioso. Ela estava brincando com um bichinho, provavelmente um inseto ou talvez um passarinho .
A cena era quase cômica. A garota que parecia odiar o mundo inteiro, inclinada com cuidado, como se fosse uma criança fascinada.
— Com certeza, o amor que ela não tem pelos humanos, ela guarda para os animais — pensei, sorrindo de canto.
Apesar de toda a dureza que Mavis fazia questão de exibir, havia algo diferente nela quando estava perto de animais. Quase... genuíno. Era estranho, mas eu não conseguia desviar o olhar.
Ela terminou o que estava fazendo — provavelmente soltando o bichinho — e levantou, ajeitando o cabelo e dando aquele olhar indiferente para todos ao redor.
— Voltamos ao normal, Evernight — murmurei para mim mesmo, antes de me levantar quando o sinal tocou.
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Mais tarde, em casa
Assim que entrei pela porta, fui recebido pelo som de Ivy choramingando na sala.
— Ainda não voltou, Josh! — ela soluçou, abraçando uma almofada.
— Ei, calma. — Me abaixei na frente dela. — Você já olhou no quintal de novo?
— Olhei em todo lugar! — Ela esfregou os olhos, fungando. — E se aconteceu alguma coisa com ela? E se ela não voltar nunca mais?
— Não diga isso, Ivy. — Pus a mão no ombro dela, tentando parecer mais confiante do que me sentia. — Vou dar uma olhada na rua mais tarde, tá? Tenho certeza de que ela só se perdeu um pouco.
Ivy assentiu, mas continuava com o rosto cheio de lágrimas. Meu peito apertou. Eu precisava encontrar Luna, não só por ela, mas também para acalmar minha irmãzinha.
— Vou encontrar essa gata, nem que eu tenha que virar a cidade de cabeça para baixo — prometi a mim mesmo, enquanto Ivy continuava choramingando no sofá.
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Eu estava começando a ficar desconfiado. Depois de um tempo notando pelos brancos na blusa de Mavis, sendo que a gata dela é preta, algo em minha cabeça começou a gritar que ela tinha a ver com o sumiço de Luna. Por que outra razão ela estaria coberta de pelos da minha gata? Não era como se Mavis fosse do tipo que oferecia carinho a qualquer coisa que não fosse um animal em apuros. Mas ainda assim, eu precisava de provas.
Naquela noite, depois do jantar, Vesti uma blusa preta e calcei meus tênis mais silenciosos. Não era a primeira vez que invadia o quintal deles — já tinha feito isso antes, mas nunca para algo tão sério. Dessa vez, eu tinha um objetivo claro: descobrir o que Mavis estava escondendo.
Pulei a cerca e me escondi entre as sombras das árvores. Fiquei lá um tempo até ver ou ouvir algo estranho. Eu estava prestes a desistir quando ouvi vozes vindo de dentro da casa.
— Mavis, espero que você tenha resolvido o problema da gata dos Thornes — a voz fria e autoritária do pai dela ecoou.
— Já disse que sim. Eu me livrei dela, está bem? — Mavis respondeu, irritada, mas com um tom que parecia... hesitante?
Minha respiração ficou presa no peito. Meu sangue gelou. Se livrou dela? O que exatamente isso significava? Meu primeiro instinto foi correr para a porta e exigir respostas, mas me forcei a ficar no lugar. Se eu invadisse agora, ela poderia inventar qualquer mentira.
— Ótimo — disse o pai dela, com aquela frieza que dava arrepios. — Porque se eu descobrir que ela ainda está viva por aí, você vai se arrepender de ter me desobedecido.
Um silêncio tenso seguiu. Eu não conseguia mais ouvir as palavras deles, mas a mensagem já estava clara. Mavis Evernight tinha feito algo com Luna. E, pelo jeito, não havia sido algo bom.
Afastei-me do quintal, engolindo o nó que se formava na minha garganta. Quando voltei para casa, minha cabeça estava girando. Eu precisava confrontá-la, e dessa vez, ela não escaparia sem uma explicação.
No dia seguinte, esperei até o intervalo para confrontar Mavis. Ela estava sozinha no corredor que levava à sala de biologia, mexendo no celular como se nada estivesse acontecendo. Meu sangue ainda fervia desde a noite anterior, mas eu me obriguei a me controlar. Se eu queria respostas, não podia perder o foco.
— Mavis! — chamei, minha voz carregada de tensão.
Ela olhou para mim com aquela expressão de sempre: um misto de irritação e tédio.
— O que foi agora, Thorne? Está sem ninguém para atormentar hoje? — ela disse, guardando o celular no bolso.
— Eu quero saber o que você fez com Luna — disparei, sem rodeios.
Ela arqueou uma sobrancelha, fingindo não entender.
— Do que você está falando?
— Não se faça de sonsa! Eu ouvi seus pais ontem à noite. Eles estavam falando sobre você ter “se livrado” da minha gata. Não tente negar, Mavis. Eu sei que você é fria, mas fazer isso com um animal inocente? Isso é crueldade, até para você!
As palavras saíram mais agressivas do que eu pretendia, mas eu estava cego pela raiva. Mavis cruzou os braços, sua expressão se fechando em uma máscara de desprezo.
— Primeiro de tudo, não grite comigo. Segundo, você não sabe de nada, Josh. Você sempre acha que tem razão, mas mal enxerga um palmo à sua frente.
— Não sei de nada? — avancei um passo, sentindo minha paciência se esgotar. — Então me explica, Mavis! O que exatamente você fez com Luna? Porque, pelo jeito, você acha que sua versão dos fatos vai me fazer parecer o idiota aqui.
Ela balançou a cabeça, soltando um riso sem humor.
— Você quer saber a verdade? Tudo bem. Eu salvei a sua preciosa Luna, porque, caso você não tenha notado, meus pais estavam prontos para fazer algo muito pior. Eu escondi a gata para que ela ficasse segura.
Fiquei em silêncio por um momento, absorvendo suas palavras.
— Você... o quê? — perguntei, confuso.
— Foi isso mesmo que você ouviu, Thorne. Eu levei Luna para um lugar seguro, longe dos meus pais. Mas, é claro, você não pensou nisso, né? Para você, eu sou só a vilã da sua história, então deve ser mais fácil me culpar de tudo.
— Mavis, eu...
— Nem começa! — ela interrompeu, sua voz mais alta agora. — Estou cansada disso, Josh. Cansada de você sempre me acusar, sempre me julgar, sem nem se dar ao trabalho de tentar entender.
O olhar dela queimava de raiva, mas havia algo mais ali — um cansaço profundo, como se ela realmente estivesse esgotada.
— Luna está numa casa abandonada, perto do bosque — Mavis continuou. — Se você quiser, pode ir vê-la. Mas ela ainda não pode voltar para casa, não enquanto meus pais estiverem tão determinados a se livrar dela.
Engoli em seco, a culpa começando a pesar sobre mim.
— Eu... Mavis, me desculpe. Eu não sabia.
— Claro que não sabia, porque você nunca para para pensar antes de abrir a boca.
Ela se virou para sair, mas hesitou por um momento.
— Se você se importa mesmo com a gata, Josh, tome cuidado. E se os meus pais descobrirem que ela ainda está viva, vai ser pior para todo mundo.
Mavis saiu do corredor, me deixando sozinho com meus pensamentos e o peso de minhas ações. Mais uma vez, eu tinha julgado Mavis sem entender a situação. E, mais uma vez, ela havia provado que era muito mais complexa do que eu estava disposto a admitir.
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Atualizado até capítulo 25
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