O Estranho de Ébano
A névoa cobria o mar como um véu cinzento, e as ondas rugiam contra as rochas negras da costa de Baekje. Era uma noite sem lua, e os pescadores do vilarejo de Haeryong dormiam em suas cabanas de palha quando um estrondo ecoou ao longe. Um navio, perdido nas correntezas traiçoeiras, havia colidido com os recifes. Ao amanhecer, os primeiros raios de sol revelaram os destroços espalhados pela praia — tábuas quebradas, cordas rasgadas e um único sobrevivente.
Kofi abriu os olhos, a areia fria sob seu rosto. O sal ardia em seus cortes, e o som das ondas parecia um eco distante. Ele tentou se levantar, mas suas pernas cederam. Antes que pudesse entender onde estava, vozes desconhecidas o cercaram. Homens magros, com cabelos presos em coques e roupas de linho grosseiro, apontavam varas de pesca para ele, gritando em uma língua que ele nunca ouvira.
"Quem é esse demônio?" exclamou um pescador, com os olhos arregalados. "Olhe a pele dele! Negra como a noite! É um espírito maligno!"
^^^"Não é espírito coisa nenhuma", retrucou outro, mais velho, segurando um remo. "É um homem, mas de onde? Nunca vi alguém assim." ^^^
Kofi ergueu as mãos, tentando mostrar que não era ameaça, mas os pescadores o agarraram, amarrando seus pulsos com cordas ásperas. Ele não resistiu — sabia que lutar só pioraria as coisas. Enquanto o arrastavam para o vilarejo, sua mente girava. Ele era um escravo fugitivo, capturado por mercadores em terras além do mar, forçado a embarcar em um navio que jazia agora em pedaços. Onde quer que estivesse, era longe de casa.
No mesmo dia, Sohn Min-ho cavalgava pela estrada costeira, liderando um pequeno grupo de soldados. Aos 20 anos, ele tinha o porte de um guerreiro, mas seus olhos castanhos brilhavam com uma curiosidade que irritava seu pai, o General Sohn Baek. Min-ho fora enviado para inspecionar os vilarejos próximos, uma tarefa simples que ele aproveitava para escapar da rigidez da fortaleza.
"Senhor, olhe ali!" chamou um dos soldados, apontando para o vilarejo à frente. Uma multidão se reunia na praça central, gritando e gesticulando. Min-ho esporeou o cavalo e chegou ao local, desmontando com agilidade.
No meio da confusão, ele viu Kofi — amarrado, ajoelhado, cercado por aldeões nervosos. Min-ho congelou por um instante, fascinado. A pele escura do estrangeiro contrastava com tudo ao seu redor, e seus olhos, embora cansados, tinham uma força que o jovem nunca vira.
"O que está acontecendo aqui?" perguntou Min-ho, sua voz firme cortando o barulho.
"É um demônio, senhor!" respondeu o pescador mais velho, inclinando-se em respeito. "Naufragou na praia. Não fala nossa língua!"
"Demônio?" Min-ho franziu a testa, aproximando-se de Kofi. Ele se abaixou, olhando nos olhos do estranho. "Você entende algo do que dizem?"
Kofi balançou a cabeça lentamente, confuso. Min-ho notou os cortes em seus braços e o tremor em suas mãos. Não era um demônio — era um homem, exausto e perdido.
"Soltem-no," ordenou Min-ho, levantando-se. Os aldeões hesitaram, mas obedeceram. "Ele vem comigo. Meu pai decidirá o que fazer.;
Na fortaleza do General Sohn Baek, a chegada de Min-ho com o estrangeiro causou alvoroço. Os soldados cochichavam, e os servos espiavam pelas janelas. O general, um homem de meia-idade com cicatrizes no rosto e uma expressão severa, recebeu o filho no salão principal.
"Que absurdo é esse?" rugiu Sohn Baek, apontando para Kofi, que estava ao lado de Min-ho, ainda com as mãos livres, mas sob o olhar atento dos guardas. "Por que trouxe essa… criatura para minha casa?"
"Ele é um sobrevivente, pai," respondeu Min-ho, mantendo a calma. "Naufragou na costa. Não sabemos de onde veio, mas não é uma ameaça."
"Não é uma ameaça?" O general riu, um som seco e cortante. "Olhe para ele! Não pertence a este lugar. Pode ser um espião de Goguryeo ou pior!"
"Ele mal consegue andar," retrucou Min-ho. "Deixe-me cuidar dele até descobrirmos mais."
Sohn Baek estreitou os olhos, desconfiado, mas cedeu. "Ele será um servo. Mas se causar problemas, você responderá por isso, Min-ho."
Enquanto isso, nos aposentos dos servos, uma mulher observava tudo em silêncio. Hye-jin, uma curandeira viúva de 40 anos, trabalhava na fortaleza desde a morte do marido, um soldado leal ao general. Seus cabelos grisalhos estavam presos em um coque simples, e suas mãos habilidosas carregavam ervas e bandagens. Ela viu Kofi ser levado para um canto, sozinho e ignorado pelos outros servos.
"Venha cá, rapaz," disse Hye-jin em voz baixa, aproximando-se com um pano úmido. Kofi a encarou, hesitante. Ela sorriu, um gesto maternal que aqueceu o ar frio. "Não sei de onde você veio, mas aqui ninguém vai te machucar enquanto eu estiver por perto."
Kofi não entendeu as palavras, mas o tom gentil o fez relaxar. Pela primeira vez desde o naufrágio, ele sentiu um fiapo de esperança.
No pátio, outro par de olhos seguia Kofi com interesse — mas não era um olhar amigável. Kang Dae-sung, um oficial jovem e ambicioso, amigo de infância de Min-ho, cruzou os braços. Ele notou como Min-ho olhava para o estrangeiro, com uma mistura de curiosidade e algo mais. Dae-sung apertou os punhos. Ele sempre quis o respeito de Min-ho, talvez até mais do que isso. E agora, aquele estranho de pele negra ameaçava roubar o que ele julgava ser seu.
"Você não vai durar muito aqui," murmurou Dae-sung para si mesmo, já tramando seus próximos passos.
Fim do Capítulo 1
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Atualizado até capítulo 28
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