William desceu para o porão com sua panela de comida, equilibrando-a em uma mão e uma colher gigante na outra. O ambiente era frio e mal iluminado, com caixas antigas empilhadas nos cantos e teias de aranha nas vigas. No centro, a garota pálida estava sentada contra a parede, os joelhos abraçados ao peito e os olhos fixos no chão.
— Tá na hora da proteína, garota misteriosa. — William disse, tentando soar amigável enquanto estendia a panela para ela. — Se quiser comer, melhor aproveitar antes que eu coma tudo.
Ela levantou os olhos lentamente, o olhar sombrio e cheio de medo. Mas em vez de fome, o que William viu neles foi algo que o fez estremecer: uma mistura de sede e desespero.
— Não como isso. — murmurou ela, com a voz trêmula e rouca.
— Você não come? Tá de brincadeira? Isso aqui é macarrão com frango, o melhor que consegui fazer. — William insistiu, empurrando a panela um pouco mais para perto.
Ela desviou o olhar, segurando o próprio corpo como se estivesse lutando contra algo interno. William deu de ombros, se sentou em um velho banco e começou a comer.
— Sua escolha, garota estranha.
Enquanto isso, na sala...
Marcos estava em frente ao notebook, revisando as filmagens. Os segundos antes da câmera queimar mostravam algo perturbador: duas sombras se movendo rapidamente pela floresta, quase imperceptíveis, até que uma mão branca como a neve cobriu a lente e o vídeo cortou para estática.
— Isso é real. — Marcos afirmou, com a voz cheia de certeza. — Olha isso, Rita. Não tem edição, não tem truque.
Rita cruzou os braços, inclinando-se sobre o sofá.
— Tá. Eu admito que é estranho. Mas não significa que ela é uma vampira.
Marcos olhou para ela com uma expressão desafiadora.
— Sério? Depois de tudo? As marcas no pescoço, o medo da luz do sol, e agora isso? O que mais precisa acontecer para você acreditar?
— Só estou dizendo que precisamos de mais provas. — Rita respondeu, firme. — Não vou sair correndo gritando "vampiros" só porque vi um vídeo esquisito.
De repente, um grito agudo ecoou pelo porão. Ambos congelaram.
— William! — Marcos largou o notebook e correu para as escadas, com Rita logo atrás dele.
Ao chegarem ao porão, encontraram William no chão, a panela tombada ao lado dele. Ele estava pálido, respirando com dificuldade. A garota estava encolhida contra a parede, com os olhos brilhando em um vermelho ameaçador.
— Eu... eu não consegui me controlar... — disse ela, com a voz cheia de culpa.
— O que você fez?! — Marcos gritou, ajoelhando-se ao lado de William.
William levantou a mão, tentando acalmá-los.
— Ela não me mordeu, relaxa. Só me empurrou. — Ele tentou se sentar, mas caiu de novo, parecendo tonto.
— O que está acontecendo com ele? — Rita perguntou, tentando manter a calma.
A garota apenas olhou para eles, seus olhos cheios de lágrimas e culpa.
— Ele está fraco porque eu... absorvi um pouco da energia dele. Não posso evitar. Estou faminta.
Marcos e Rita trocaram olhares de pânico.
— A gente precisa de respostas. Agora. Quem é você? O que está acontecendo? — Marcos exigiu, olhando diretamente para a garota.
Ela respirou fundo, como se estivesse reunindo toda a coragem que tinha.
— Meu nome é Luna. E se vocês não me ajudarem... eles vão me encontrar. E vão matar todos nós.
Marcos se aproximou de William e passou o braço dele por cima do ombro.
— Anda, vamos levantar. Você parece que foi atropelado por um caminhão. — disse Marcos, ajudando o amigo a ficar de pé.
William gemeu, tentando recuperar o equilíbrio.
— Não foi um caminhão... foi uma vampira esquisita com problemas de autocontrole.
Marcos olhou para Luna, ainda encolhida no canto, e respirou fundo.
— Gente, temos que arrumar sangue pra essa aí. — Marcos falou, olhando de William para Rita. — Se ela não comer, da próxima vez talvez a gente não tenha tanta sorte.
William assentiu, ainda tentando recuperar o fôlego.
— Eu moro numa fazenda, e temos um galinheiro. Posso dar um jeito de conseguir algum sangue lá. Mas vai demorar umas horas.
— Beleza. Enquanto isso, eu preciso voltar pra casa e pegar umas coisas. — Marcos se aproximou de Luna, seu olhar cheio de desconfiança. — Você vai ficar aqui. Não confio em você o suficiente pra te deixar sozinha com a Rita.
Luna abriu a boca para protestar, mas a expressão de Marcos foi firme. Ele se virou para Rita.
— Vou trancar o porão. Só pra garantir.
Rita revirou os olhos, cruzando os braços.
— Sério, Marcos? Agora você tá bancando o caçador de vampiros?
— Precaução nunca matou ninguém. — ele respondeu, caminhando até a porta do porão.
Marcos fechou a porta, trancou com a chave e olhou uma última vez para Rita.
— Se ela tentar alguma coisa, me liga.
— Relaxa, não vou deixar uma vampira adolescente me assustar. — Rita respondeu, mas havia uma ponta de preocupação em sua voz.
Marcos e William saíram, deixando Luna e Rita sozinhas no porão. Um silêncio pesado tomou conta do lugar, quebrado apenas pelo som distante do motor da moto de William.
— Eu não queria machucá-lo... — Luna disse, sua voz quase um sussurro.
Rita olhou para ela, seu ceticismo vacilando por um momento.
— Vamos ver se isso é verdade. Porque se não for, você vai ter que lidar comigo.
Marcos e William montaram na moto, saindo rapidamente da casa de Rita, deixando para trás uma atmosfera de tensão e mistério.
Rita suspirou, olhando para os restos de comida que Marcos havia deixado espalhados pela cozinha. Ela começou a limpar com movimentos rápidos e impacientes.
— Como alguém consegue ser tão desorganizado em tão pouco tempo? — resmungou para si mesma.
Após limpar tudo, ela foi até a porta do porão, trancada por Marcos, e ficou parada por um momento. Algo sobre Luna a deixava inquieta.
— Ei, Luna... — começou, encostando a testa na porta. — Você está bem aí?
Houve um longo silêncio, e então veio a voz de Luna, baixa e um pouco hesitante:
— Estou.
Rita respirou fundo.
— Olha, eu sei que você é... esquisita. Mas você não parece perigosa. Só... confusa.
Luna não respondeu imediatamente. Quando falou, sua voz soou vulnerável:
— Eu não queria machucar ninguém. Só não consigo controlar direito...
Rita franziu a testa.
— Não consegue controlar o quê exatamente?
— O sol me deixa fraca. Ainda sou uma adolescente... E isso me afeta mais do que aos meus irmãos. Eles são adultos. Eles podem sobreviver ao sol se se transformarem em morcegos.
Rita congelou, arregalando os olhos.
— Irmãos?
Do outro lado da porta, Luna percebeu que havia dito mais do que deveria.
— Eu... eu não deveria ter dito isso.
— Quem são seus irmãos? — Rita perguntou, sua voz agora cheia de preocupação.
— Eles vão me buscar. — Luna murmurou. — E vão matar quem estiver no caminho.
Rita sentiu um arrepio percorrer sua espinha.
William chegou em casa após deixar Marcos, o peso da noite passada ainda em seus ombros. Ele empurrou a porta da frente, chamando pela família:
— Mãe? Pai? Jujuba? — gritou, referindo-se à sua irmã mais nova.
O silêncio respondeu. Ele andou pela casa, mas não encontrou ninguém.
— Acho que não chegaram ainda...
Sem perder tempo, William pegou um pedaço de papel e deixou um recado na mesa da cozinha: "Vou dormir na casa do Marcos. Não se preocupem."
Ele então se lembrou da escola.
— Droga! A prova de química...
Suspirando, ele saiu da casa e foi até o galinheiro. Olhando para as galinhas, William coçou a nuca, sentindo-se culpado.
— Desculpa por isso. — Ele pegou uma das galinhas, segurando-a firmemente enquanto voltava para o galpão.
Marcos, por outro lado, chegou em casa e foi recebido com uma tempestade.
— Chegou o rebelde! — A voz de seu pai ecoou pela sala.
Marcos mal teve tempo de tirar os sapatos antes de seu pai se aproximar, os olhos cheios de raiva.
— Você passou a noite fora e faltou a escola! — gritou o pai. — O que você acha que está fazendo com a sua vida?
— Quem é você pra me criticar? — Marcos rebateu, tirando a mão do ombro dele bruscamente e subindo as escadas, sem dar chance para outra discussão.
Sua irmã, mais jovem e cheia de energia, correu atrás dele.
— Ei, espera!
Quando Marcos abriu a porta do quarto, a irmã soltou uma risadinha provocadora:
— Nossa, você arrumou uma namorada? Muito linda. Achei que você ia casar com a esquisita da Rita!
Marcos franziu a testa, confuso. Ele entrou no quarto e, naquele instante, congelou.
Em cima de sua cama estava uma garota de pele pálida, vestida com um longo vestido branco. Ela era parecida com Luna, mas claramente mais velha e mais ameaçadora. Seus olhos brilhavam em um tom vermelho suave.
— Se você gritar, eu mato os dois. — Ela lambeu os beiços lentamente, um sorriso predatório se formando em seus lábios.
A noite caiu, e a casa de Rita mergulhou em um silêncio inquietante. O porão estava escuro e abafado, e Luna, que antes parecia um poço de mistério e tensão, agora dormia, encolhida no canto.
Na sala, Rita havia tentado ficar acordada, mas o cansaço a venceu. Ela cochilou no sofá, ainda com os pensamentos rodopiando sobre a conversa que teve com Luna sobre os irmãos.
De repente, uma batida forte e ensurdecedora sacudiu a porta da frente. A madeira estalou como se fosse se partir.
BAM! BAM! BAM!
Rita acordou num pulo, o coração disparado.
— Quem é? — gritou, ainda atordoada, seu corpo tremendo levemente.
Mais uma pancada pesada, quase quebrando a porta.
— Foi mal! É só a gente! — A voz inconfundível de William veio do outro lado, e ele riu nervosamente.
Rita correu até a porta e abriu, revelando William segurando um saco grande com as duas mãos e respirando pesadamente. Atrás dele, Marcos parecia exausto e cheio de pressa.
— Não dá pra bater normal, não? — reclamou Rita.
— A galinha quase fugiu! — William levantou o saco. — Trouxe o jantar da nossa hóspede especial.
Rita revirou os olhos.
— Isso aqui não é um hotel de vampiros! — resmungou, enquanto os dois entravam rapidamente e fechavam a porta atrás deles.
— É o melhor que conseguimos, ok? — Marcos deu de ombros e trancou a porta com força, verificando duas vezes para garantir. — Agora vamos descobrir o que ela quer de verdade. Porque não gosto nada disso.
— Bem-vindos ao clube, — Rita murmurou, ainda olhando para o porão com uma sensação desconfortável.
Marcos estava parado no centro da sala, os olhos fixos no chão. Ele parecia diferente. Havia uma aura estranha ao seu redor, algo que Rita não conseguia definir, mas que gelava seus ossos.
— Sabe... estive pensando. — Marcos quebrou o silêncio com uma voz suave, quase casual. — Por que não deixamos ela na floresta de novo? Tipo, fim da história. Tudo volta ao normal.
Ele soltou uma risada baixa, mas nada em seu tom parecia divertido.
— Marcos... você tá bem? — Rita perguntou, estreitando os olhos para ele.
Marcos levantou a cabeça lentamente e olhou diretamente para Rita. Seus olhos... estavam vermelhos. Um vermelho profundo e sanguíneo.
— O que foi isso? — Rita recuou um passo, assustada. — Seus olhos...
— Você também...? — William franziu a testa, olhando para Marcos com uma mistura de desconfiança e preocupação.
Marcos assentiu lentamente.
— É. Acho que sim.
Antes que Rita pudesse dizer mais alguma coisa, William decidiu agir. Ele desceu rapidamente até o porão e abriu a porta. Luna saiu, os passos leves e silenciosos, o olhar dela indo direto para Marcos.
William entregou o saco de sangue para Luna. Sem hesitar, ela arrancou o saco das mãos dele e o bebeu, seus olhos brilhando intensamente enquanto o líquido vermelho desaparecia.
Quando terminou, Luna limpou os lábios com as costas da mão e, ainda sem tirar os olhos de Marcos, disse:
— Eles vieram até você, não foi? Meus irmãos.
Marcos não respondeu, mas o silêncio que se seguiu foi ensurdecedor
— Ele está hipnotizado. Minha irmã faz isso. — Luna revelou, os olhos fixos em Marcos com uma mistura de preocupação e urgência.
No mesmo instante, Marcos deu um passo para trás, os olhos vermelhos brilhando ainda mais intensamente. Sem aviso, ele correu para a porta da frente e a escancarou, como se estivesse sendo guiado por uma força invisível.
Antes que William e Rita pudessem reagir, duas figuras entraram pela porta com uma rapidez sobre-humana.
A primeira era uma mulher alta e elegante, com longos cabelos negros que contrastavam com sua pele pálida. Seu vestido branco esvoaçava ao seu redor como uma sombra viva. Os olhos dela eram de um vermelho profundo, e um sorriso predatório brincava em seus lábios.
— Irmãzinha, que bom te ver novamente. — A voz dela era doce, mas havia algo mortal por trás das palavras.
Ao lado dela estava um homem magro, de traços esqueléticos e uma expressão arrogante. Ele tinha o mesmo olhar frio e pálido que Luna, mas seus olhos eram ainda mais ferozes.
— Chegou a hora de voltar para casa, Luna. — Ele disse com desprezo, ignorando completamente os outros na sala.
Luna deu um passo à frente, os punhos cerrados.
— Eu não vou voltar com vocês.
A mulher deu uma risada fria.
— Ah, mas você não tem escolha, irmãzinha. Não devia ter fugido. E agora... seus amiguinhos mortais estão no meio de tudo isso.
William deu um passo à frente, os músculos tensos.
— Se encostar em qualquer um aqui, vai ter que lidar comigo.
O homem estreitou os olhos.
— Que adorável. O mortal acha que pode lutar.
Marcos, ainda hipnotizado, ficou parado entre os dois grupos, um peão no jogo sombrio que estava prestes a começar.
— Rita... fique atrás de mim. — William murmurou, sentindo que o pior estava por vir.
Vicente deu um passo à frente com um ar de superioridade, os olhos vermelhos brilhando com diversão.
— Sou Vicente. E valorizo sua coragem. — Ele deu um sorriso predatório. — Vamos fazer o seguinte: se você conseguir me fazer sangrar, eu e minha irmã vamos embora agora.
A irmã ao lado dele soltou uma risada contida, cobrindo a boca como se achasse a ideia de William uma piada.
William respirou fundo, os olhos fixos em Vicente. Ele pegou um pequeno frasco de água do bolso e jogou nas mãos, esfregando os dedos rapidamente.
— Não quero me machucar, né? — William disse, com um tom desafiador.
Sem hesitar, ele partiu para cima de Vicente com velocidade. Seus punhos cortaram o ar com força e precisão, o fruto de anos de treino em boxe e caratê.
Vicente desviou com facilidade dos primeiros golpes, movendo-se com uma rapidez sobrenatural. Ele parecia estar se divertindo, brincando com William como um gato brinca com um rato.
Mas William não desistiu. Ele girou, acertando um chute em direção ao abdômen de Vicente. Dessa vez, Vicente não foi rápido o suficiente para desviar completamente. O chute acertou de raspão, e William sentiu algo estranho ao entrar em contato com a pele de Vicente.
Vicente recuou ligeiramente, e quando olhou para sua mão, uma pequena gota de sangue escorria.
O sorriso de Vicente desapareceu.
William continuou seus ataques com força e precisão, sua respiração pesada ecoando pela sala. Soco após soco, ele forçava Vicente a recuar, e, em um movimento rápido, um de seus socos acertou o rosto do vampiro em cheio. Vicente foi jogado para trás, cambaleando com o impacto.
A irmã dele, ainda parada na porta, arregalou os olhos.
— Seu nariz, irmão... — disse ela, alarmada.
Vicente tocou o rosto e sentiu algo úmido. Quando olhou para os dedos, viu sangue escorrendo. O ódio tomou conta de seu olhar.
— Água benta, babaca. — William disse com um sorriso cansado. — Posso ser cabeça de vento, mas não sou burro.
Vicente rangeu os dentes, furioso. — Um vampiro é obrigado a cumprir uma promessa... você tem sorte, humano.
E então, em um piscar de olhos, Vicente desapareceu, junto com sua irmã.
Marcos caiu de joelhos, os olhos voltando ao normal enquanto o transe se dissipava. Ele olhou para William com confusão, mas não disse nada.
William, por outro lado, caiu no chão, exausto e com as mãos machucadas, os nós dos dedos sangrando por causa dos golpes.
Em uma sala escura e gótica, Vicente estava ajoelhado diante de um homem alto, com uma aura assustadora e cruel. O homem o segurava pelo pescoço, os dedos pálidos como garras.
— Você me envergonha, Vicente. Um humano de merda te fez sangrar! — rugiu o homem.
Vicente olhava para baixo, humilhado e envergonhado.
— Traga ele e os amiguinhos dele. Eles serão meus escravos... assim como sua irmã.
Com um movimento brutal, o homem jogou Vicente no chão, o barulho ecoando pela sala fria e sombria.
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Atualizado até capítulo 20
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