A manhã surgiu suave na mansão Vasconcellos. O céu estava tingido de tons alaranjados e rosados quando Victoria desceu as escadas, guiada pelo cheiro do café fresco e do pão quentinho. A governanta Marta já estava acordada, organizando os ingredientes para o café da manhã, como fazia todos os dias há anos.
— Bom dia, Marta. — Victoria cumprimentou com um sorriso.
A mulher ergueu os olhos do balcão e a analisou por um breve momento antes de devolver o cumprimento.
— Bom dia, querida. Vejo que já está se acostumando à casa.
Victoria riu levemente, puxando uma cadeira e se sentando à mesa.
— Ainda estou aprendendo. Mas quero aproveitar cada momento com Liz.
Marta parou por um instante, observando-a com mais atenção. Então, soltou um suspiro e voltou ao que fazia.
— Você realmente gosta dela, não é?
— Muito. — Victoria respondeu sem hesitação. — Ela é uma menina incrível.
A governanta mexeu o café e lhe lançou um olhar carregado de algo que Victoria não soube interpretar de imediato.
— Já vi muitas babás entrarem e saírem desta casa. Algumas eram boas, outras nem tanto. Mas todas foram embora.
Victoria cruzou os braços.
— Por quê?
Marta suspirou.
— O senhor Vasconcellos.
Victoria piscou, surpresa.
— Como assim?
A mulher limpou as mãos no avental antes de se virar completamente para ela.
— Ele não facilita as coisas. É um bom homem, mas carrega um peso que não divide com ninguém. Acha que está protegendo Liz, mas, às vezes, a protege tanto que a impede de seguir em frente.
Victoria mordeu o lábio, refletindo sobre aquilo. Já havia percebido que Christopher era um homem difícil de lidar, mas ouvir aquilo de Marta apenas reforçava sua intuição. Ele não apenas erguia barreiras entre ele e o mundo — ele também as erguia para Liz.
— Eu não vou desistir. — Victoria declarou, com convicção.
Marta sorriu de lado.
— Espero que não. Liz precisa de alguém que fique.
Victoria sentiu um aperto no peito. Já havia se apegado a Liz mais do que deveria. Mas algo dentro dela dizia que não era só a garotinha que precisava dela.
O Desejo de Liz
Quando Liz desceu para o café da manhã, parecia mais animada do que o normal.
— Dormiu bem? — Victoria perguntou enquanto a menina se sentava.
Liz assentiu.
— Tive um sonho bonito.
— Ah, é? Quer me contar?
Liz hesitou por um momento, depois deu um pequeno sorriso.
— Eu estava num jardim. Tinha um balanço enorme e muitas flores.
Victoria sentiu um calor suave no coração.
— Parece um lugar maravilhoso.
A menina brincou com a borda do prato antes de levantar os olhos para Victoria.
— Você gosta de jardins?
— Eu adoro! Passei minha infância brincando no jardim da minha avó.
Liz pareceu considerar aquilo por um momento.
— Eu queria ver um jardim bonito de verdade.
Victoria trocou um olhar com Marta, que apenas levantou as sobrancelhas, sugerindo que ela tomasse a iniciativa.
— Talvez possamos sair hoje para um passeio. — Victoria sugeriu.
Os olhos de Liz brilharam.
— Sério?
— Claro! Se seu pai permitir.
A animação da menina diminuiu um pouco, e Victoria sentiu o peso daquela resposta. Liz já esperava um “não” antes mesmo de perguntar.
Mas Victoria não ia desistir tão fácil.
A Conversa com Christopher
Mais tarde, Victoria encontrou Christopher em seu escritório. Ele estava, como sempre, imerso em papéis e relatórios, os óculos de leitura apoiados na ponta do nariz.
— Preciso falar com você.
Ele levantou os olhos, visivelmente surpreso por ela ter entrado tão direto no assunto.
— Sobre o quê?
— Liz quer passear.
Christopher suspirou, tirando os óculos e massageando as têmporas.
— Passear onde?
— Em um jardim. Algo ao ar livre, longe da rotina de casa.
Ele ficou em silêncio por um instante.
— Isso é mesmo necessário?
Victoria cruzou os braços.
— Christopher, Liz tem oito anos. Ela precisa ver o mundo lá fora.
— Eu sei disso. Mas não quero que ela… se frustre.
Victoria estreitou os olhos.
— Se frustre?
Ele desviou o olhar.
— Não quero que ela crie expectativas sobre coisas que podem não durar.
Victoria percebeu, naquele momento, que ele não estava apenas falando do passeio.
Estava falando dela.
Ela deu um passo à frente, suavizando o tom.
— Não podemos proteger Liz de tudo. E, sinceramente? Não acho que o problema seja ela se decepcionar. Acho que o problema é você ter medo de vê-la feliz e perder isso de novo.
A mandíbula de Christopher se contraiu.
— Você não sabe do que está falando.
— Sei mais do que imagina.
Os dois se encararam por alguns segundos, até que Christopher respirou fundo e se recostou na cadeira.
— Está bem. Mas só se eu for junto.
Victoria não pôde esconder o sorriso satisfeito.
— Perfeito.
O Jardim Secreto de Liz
No final da tarde, os três saíram juntos — Liz, Victoria e Christopher.
Foram até um parque afastado, onde havia um jardim botânico repleto de flores, árvores imponentes e fontes de pedra.
Liz estava deslumbrada.
— É ainda mais bonito do que no meu sonho! — Ela exclamou, correndo pelo gramado.
Victoria observava a cena com um sorriso.
Christopher, por outro lado, estava tenso. Ele a acompanhava de perto, como se estivesse pronto para protegê-la de qualquer coisa — mesmo que não houvesse perigo algum ali.
— Você está sempre assim? — Victoria perguntou, cruzando os braços.
— Assim como?
— Tão preocupado.
Christopher desviou o olhar para Liz, que agora examinava uma flor com pura fascinação.
— Ela já perdeu muito. Não quero que perca mais nada.
Victoria o observou por um momento antes de responder.
— Você acha que protegê-la assim vai impedir que ela se machuque. Mas, na verdade, está só impedindo que ela viva.
Ele não respondeu. Apenas permaneceu olhando para Liz, um conflito visível em seus olhos.
Por mais que tentasse negar, havia algo de verdadeiro nas palavras de Victoria.
E talvez, pela primeira vez em anos, ele estivesse começando a enxergar isso.
Um Pequeno Passo
Naquela noite, Liz dormiu com um sorriso no rosto.
E Christopher ficou parado na porta de seu quarto por alguns minutos, observando-a.
Victoria apareceu ao lado dele, sussurrando:
— Obrigada por confiar em mim.
Ele virou o rosto para ela, seus olhos escuros analisando-a por um longo instante.
— Não confio em você.
Victoria ergueu uma sobrancelha, surpresa.
Mas então Christopher completou:
— Ainda.
Ela sorriu suavemente.
Era um começo.
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Atualizado até capítulo 26
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