O sol da tarde tingia o céu de tons alaranjados quando atravessei os ocultos da propriedade Lancaster pela última vez como estudante do ensino médio. O cansaço pesava nos meus ombros, mas uma motivação frenética crescia dentro de mim.
Último dia de aula. Último dia dessa vida.
Subi as escadas de mármore branco correndo e entrei no meu quarto. O espaço era imaculado, como tudo que minha mãe supervisionava, mas faltava qualquer traço de personalidade de minha ali. Cada móvel, cada quadro, cada almofada foi escolhida para exibir sofisticação, não conforto.
Joguei a mochila na cama e liguei o notebook, minha respiração presa no peito. Meus dedos tremiam quando cliquei no e-mail.
"Parabéns, Joyce Lancaster! Você foi aceita na Escola de Veterinária da Ohio State University."
O mundo pareceu parar por um instante.
Aprovado.
Meu coração disparou. Eu estava livre. Eu estava livre.
Mas a alegria durou um pouco. Meus pais não aceitariam tão facilmente. A tradição estava contra mim. Meu destino já havia sido selado desde o momento em que nasci. Joyce Lancaster, futura esposa de Dominic Montgomery, o homem perfeito para manter o legado de ambas as famílias.
Me obriguei a descer as escadas, tentando controlar minha respiração. O piso polido refletia a luz do brilho de cristal, e os quadros de ancestrais me observavam das paredes, como se pudessem julgar minha decisão. O perfume floral da casa me sufocava.
Na sala de estar, a cena era sempre a mesma. Meu pai, Edward Lancaster, afundado em sua poltrona de couro escuro, escondida atrás do jornal. Minha mãe, Isabelle Lancaster, sentada com costas em um sofá de veludo azul, bordando com precisão cirúrgica.
Ao me ver, ela franziu o nariz.
— Que horror, menina! — Sua voz é tão ou quanto um suspiro exasperado. — Descabelada, suada… chega a dar nojo! Nem parece um Lancaster.
Revirei os olhos. Eu tinha acabado de voltar da escola, mas ela esperava que eu descesse das escadas como uma boneca de porcelana.
— Venha cá , — ela continua, o tom mudando para uma afeição forçada. — Separei seu vestido para a formatura. Ou pensou que sua mãe deixaria você vestir de qualquer jeito?
Quando vi o vestido, preciso conter uma gemido de desespero.
Rosa-choque. Tomara que caia. Pedrarias reluzentes que fariam de mim um farol ambulante.
— Nem morri eu uso isso, mãe.
Ela me lançou um olhar frio.
— Vai usar, sim. Ainda mais para estar apresentável ao lado do seu futuro noivo.
Ao ouvir aquele nome, meu estômago revirou. Dom Montgomery, sempre impecável, sempre cortês, sempre certo de que meu futuro lhe pertence.
Meu pai abaixou o jornal apenas o suficiente para me encarar.
— Logotipo Fala, Joyce. Não tenho tempo para suas brigas com sua mãe.
Respirei fundo.
— Fui aceito na Escola de Veterinária da Ohio State University. Estou indo estudar lá.
Silêncio.
O jornal escorregou das mãos do meu pai, caindo sobre sua mesa de mogno. Ele me olhou como se eu tivesse falado algo absurdo.
— Nem por cima do meu cadáver. — Sua voz era firme, inquestionável. — Você tem um dever. Está prometida a Dom.
Engoli em seco, mas mantive a postura.
— Não estou fugindo do meu dever. Assim que eu voltar, cumpro a promessa e me caso com Dom.
Meu pai estreitou os olhos, avaliando-me.
— Sem hesitação. Assim que voltar.
Minha mãe concordou, satisfeita, como se tivesse fechado um acordo de milhões.
— Menina esperançosa. Sabe negociar tão bem quanto seu pai. Assim que voltar, faça o casamento do século.
Assenti e me aposentei.
Atravessei os corredores da mansão sentindo o peso daquelas paredes me esmagando.
Cinco anos.
Cinco anos de liberdade.
Cinco anos longe da jaula dourada que me fez acreditar ser meu lar.
E principalmente, cinco anos longe de Dom Montgomery e sua perfeição irritante.
A noite chega, e minha mãe me obriga a usar aquele vestido rosa horroroso. Era o jeito, já que eu ia embora, eu tinha que agradá-la de algum modo. Meu pai, como esperado, não iria ao encerramento do meu ensino médio.
Minha mãe me observa de cima a baixo com aquele olhar satisfeito e diz: "Você está uma verdadeira princesa. O Dom não vai resistir aos seus encantos." Quase provo uma careta ao ouvir o nome de Dominic. Ele era o meu carma da vida toda.
Quando chegamos à festa, o salão está repleto de lustres brilhantes que iluminam as mesas decoradas com toalhas de linho e arranjos florais. As paredes de um dourado sutil refletem a luz, dando um ar sofisticado à noite. O palco, montado no centro do salão, é decorado com um grande painel onde se lia o nome da escola e a turma daquele ano. Uma fileira de cadeiras estava disposta no fundo do palco, onde os professores e diretores estavam sentados. No centro, uma mesa imponente segurava os canudos da formatura, todos amarrados com fitas douradas.
Dom está lá, de pé, usando uma gravata rosa da cor do meu vestido. Com certeza, ideia da minha mãe e da mãe dele. Ele me olha e dá aquele sorriso sarcástico. Minha vontade é lhe dar um murro, mas escondo minhas feições.
Dom diz: "Você está brilhando hoje."
Reviro os olhos. "Culpa das nossas mães."
Avisto minha professora de biologia, Meire. Ela sorri ao me ver e comenta como estou bonita. Meire era a única professora que sabia que eu ia escrever para estudar veterinária.
Eu sorrio e digo: "A senhora não vai acreditar... Passei para veterinária nos Estados Unidos, em Ohio!"
Ela me abraça e responde animada: "Na apresentação das entregas dos canudos, vamos anunciar os aprovados. Quer que o seu nome seja mencionado?"
Sem hesitar, aceito.
O diretor chama os jovens para a entrega do canudo. Ele começa a falar em ordem alfabética. Quando ouço o nome de Dominic Montgomery ser chamado, prendo a respiração.
"Dominic Montgomery vai cursar gestão financeira na faculdade Università Commerciale Luigi Bocconi, em Milão, Itália."
Reviro os olhos. Quase escuto a voz dele na minha cabeça: típico para um certinho arrogante, estudando para agradar o pai, Charles Montgomery.
O momento chega.
"Joyce Lancaster vai estudar na faculdade Escola de Veterinária da Ohio State University, nos Estados Unidos."
Caminho até o palco sob os aplausos. Pego meu canudo e lanço um olhar rápido para Dom. Seu rosto está pálido, como se o sangue tivesse sumido de repente. Por um momento, sinto um peso no coração, mas então me lembro... Ele é Dominic, o certinho insuportável e futuro noivo que eu não suporto.
Assim que termina a cerimônia, sinto um aperto no braço. Dom me arrasta sem dizer uma palavra. Tento me soltar, mas ele é mais forte do que eu.
Ele me leva para uma sala reservada nos fundos do salão. O espaço é pequeno, com paredes de madeira escura e uma única janela semiaberta, onde a brisa noturna entra de leve. A luz amarelada das lâmpadas cria sombras alongadas pelo cômodo, tornando o ambiente ainda mais tenso.
Dom me olha furioso. "Quando você pretendia me contar, Joyce?"
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Atualizado até capítulo 53
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