A corte era um lugar onde os sussurros tinham o poder de cortar mais fundo que lâminas afiadas e onde um simples olhar podia incendiar uma reputação. Desde cedo, eu sabia disso, mas nunca tinha sentido o veneno dos rumores tão de perto como agora. Cada movimento meu era observado, cada palavra que eu dizia tornava-se matéria para interpretações distorcidas. Aos poucos, percebi que estava sendo arrastada para o centro de um jogo traiçoeiro — um jogo que eu mal compreendia, mas ao qual estava decidida a resistir.
Havenswood, minha morada, era uma fortaleza imponente, mas até mesmo suas paredes espessas não conseguiam bloquear o eco das fofocas da corte. Nos corredores enfeitados com tapeçarias e armaduras antigas, os murmúrios insidiosos pareciam ganhar vida própria. Os criados, antes respeitosos e discretos, agora trocavam olhares furtivos quando eu passava. Sabia que eles tinham ouvido as mesmas coisas que eu. Senti uma fúria fria crescer dentro de mim, uma raiva dirigida tanto a mim mesma, por me importar, quanto aos que ousavam questionar minha integridade.
As conversas pareciam seguir um padrão — começavam com elogios superficiais à minha aparência, seguidos de insinuações venenosas sobre meu comportamento. "Ela é bela, sem dúvida," diziam. "Mas há algo... algo inquietante nela." E assim, as pequenas fagulhas de dúvida cresciam, alimentadas por aqueles que preferiam o conforto das convenções à tempestade de um espírito livre e audaz.
Lisbet, com sua aparência angelical e modos impecáveis, estava sempre presente, uma sombra constante que, de alguma forma, parecia exacerbar minha situação. Ela era tudo o que uma dama deveria ser: doce, recatada, sempre com um sorriso nos lábios. Mas havia algo em seus olhos verdes que sugeria uma compreensão calculada. Com sua doçura ensaiada, ela se consolidava como favorita da corte, a noiva perfeita para o príncipe Theodore, e qualquer ameaça a essa posição era eliminada com precisão impiedosa.
Numa tarde, durante uma recepção no palácio, percebi o alcance do estrago. Conversava de forma banal com Lady Eleanor, uma velha amiga da família, sobre as novidades da moda, quando notei um grupo de jovens damas cochichando em um canto do salão. Seus olhares furtivos estavam fixos em mim e, ao perceberem que eu as observava, fingiram concentrar-se em suas bebidas. Logo depois, abafaram uma risada, deixando claro que eu era o motivo de sua diversão.
A raiva e a humilhação arderam dentro de mim, mas mantive a compostura, agradecendo a Lady Eleanor antes de me afastar. À medida que caminhava pelo salão, senti os olhares caírem sobre mim, e captava os fragmentos das conversas que não eram tão discretas quanto deveriam ser.
"Dizem que ela foi vista sozinha com o Príncipe Theodore na varanda durante o último baile..."
"...E que não recusou os avanços dele. Que atrevimento!"
"Mas, claro, uma jovem como ela... sempre tão provocativa, só poderia ser assim."
Cada palavra era uma lâmina que cortava fundo, mas eu não deixaria que percebessem isso. Mantive a cabeça erguida e o rosto impassível, como se estivesse acima de tudo aquilo, mas por dentro, uma tempestade rugia. Sabia que, se não agisse, esses rumores poderiam se tornar incontroláveis.
Quando a noite caiu sobre a corte, retirei-me para os jardins, ansiando por um momento de paz, longe das línguas afiadas. As sombras das árvores moviam-se com a brisa suave, e o perfume das flores noturnas deveria ter acalmado meu coração, mas minha inquietação era impossível de ignorar. Perdida em pensamentos, ouvi passos se aproximando.
"Você parece perturbada, Lady Lissara." A voz, doce e delicada, trazia uma ponta de malícia oculta em sua suavidade. Virei-me e encontrei Lisbet a poucos metros de mim, as mãos graciosamente entrelaçadas à frente do corpo. Sua aparência era a de sempre: angelical, imaculada. Mas seus olhos, serenos, agora traziam uma centelha de algo mais — um prazer sutil no meu desconforto.
"Perturbada, Lady Lisbet?" perguntei, esforçando-me para manter meu tom neutro. "Por que estaria?"
Ela avançou um passo, ainda com a expressão doce. "Ouvi... rumores. Na corte, as palavras podem ser mais perigosas do que ações, não concorda?" Ela inclinou a cabeça, os olhos fixos nos meus, sondando minhas reações. "Quis apenas me certificar de que estava bem."
A preocupação em sua voz soava mais falsa do que o brilho do luar ao nosso redor. Cada palavra dela era um lembrete de que, não importa o quanto tentasse, não escaparia dos rumores. E, pior ainda, talvez ela fosse a origem deles.
"Estou perfeitamente bem, obrigada," respondi, mantendo o tom firme. "Mas agradeço sua... preocupação."
"É claro," murmurou ela, com um sorriso delicado e cheio de insinuações. "Afinal, somos todas amigas aqui, não é? E devemos sempre nos apoiar."
Com essas palavras, virou-se e se afastou, deixando-me sozinha, mas agora ainda mais ciente do jogo que estava sendo jogado. Suas palavras ecoavam em minha mente, e entendi que a verdadeira batalha na corte não se travaria apenas com olhares e sorrisos, mas com palavras afiadas e insinuações veladas.
Naquele instante, compreendi que recuar não era uma opção. Se a corte desejava uma vilã para culpar pelos escândalos e intrigas, então eu lhes daria o que queriam. Mas faria isso do meu jeito. Não me esconderia de nenhuma forma; caminharia de cabeça erguida, enfrentando insinuações com uma frieza calculada que aperfeiçoei ao longo dos anos.
A partir dessa noite, as danças na corte deixariam de ser mero entretenimento. Elas se tornariam um campo de batalha onde máscaras seriam erguidas e, eventualmente, despedaçadas. E enquanto Lisbet consolidava sua imagem de noiva ideal para o príncipe, eu, Lissara de Havenswood, começaria a trilhar o caminho da antagonista que todos esperavam.
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Atualizado até capítulo 25
Comments
elenice ferreira
esse pai da Lissara é um idiota, como uma criança mata a mãe ao nascer? e amaldiçoa uma criança inocente de td! AFF
2024-10-21
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