A Caçada
Asthara Varyneus
...***...
Com certeza o final de um longo e exaustivo dia de aulas, havia se tornado o meu momento preferido. Embora assistir as aulas impactantes e carismáticas do Sr. Aneton, meu professor de mitologia, fossem uma das coisas que eu mais gostava naquela escola, ainda assim não se comparava com finalmente poder voltar para casa.
Arrumei a minha mochila de forma apressada e esperei Kaio estar pronto para irmos embora. Kaio era meu melhor amigo desde sempre, moramos perto e sempre estudamos nas mesmas escolas.
Sentado no fundão da sala, o moreno levantou o polegar em confirmação e juntou-se a mim para sairmos da sala.
— Você é lento demais, Kaio. — repreendi quando ele chegou bem perto da minha carteira.
Ele bufou, um sorriso tranquilo nos seus lábios.
— Você que é apressada demais. — murmurou de volta — Vamos para casa. — disse, recebendo a minha mochila e a colocando no ombro oposto a sua.
Apenas assenti, estava mortinha para me deitar na minha cama e dormir o resto do dia.
Estávamos a sair da sala quando alguém chamou o meu nome:
— Srta. Varyneus. — me virei para trás, me esquivando de alguns adolescentes que assim como eu, corriam apressados para fora daquele lugar.
— Sim — respondi ao homem conhecido — Em que posso ajudá-lo, Sr. Aneton? — perguntei ao homem mais velho.
Lucas Aneton, era um homem por volta dos 45 anos, de estatura baixa e um corpo rechonchudo. Ele era um bom professor, aparentava ser gentil e eu gostava muito das suas aulas, mas havia algo nele que sempre me deixava alerta. Ou era porque simplesmente não gostava da maneira que ele olhava para mim. Era repulsiva.
— Nada de mais. Como vai o clube de jornalismo?
Achei estranha a sua pergunta, não a pergunta em si, como presidente do clube de jornalismo era comum fazerem-me essa mesma questão por parte dos professores e até alguns alunos, mas o Sr. Aneton pelo que eu conhecia dele, não era o tipo de professor que se envolvia nesse tipo de assunto.
— Muito bem, obrigada. — foi tudo que eu respondi, eu realmente estava com pressa de ir para casa, mas não queria ser grosseira.
— Eu vejo. Vi a machete que você escreveu sobre o festival de boas-vindas dos novos alunos. Estava muito bom. — disse, se sentando na sua cadeira.
— Obrigada, professor.
Sr. Aneton estava prestes a dizer mais algo, mas a presença de Kaio cortou todo o seu raciocínio.
— Thara? — chamou o meu amigo, ancorado na porta da sala e com um olhar estranho direcionado para o nosso professor — Vamos embora. — Kaio simplesmente pegou a minha mão e puxou-me para longe do nosso professor.
Segui os seus passos largos para que eu não escorregasse nos meus próprios pés e desse de cara no chão.
— Ei, Kaio!
— O que foi? — perguntou ainda me puxando para o estacionamento da escola.
— Eu é quem pergunto. O que foi isso? — perguntei, quando chegamos perto do seu carro.
Kaio soltou o meu braço lentamente e passou as mãos nos fios revoltos da sua cabeleireira escura. Os seus olhos se voltaram aos meus, e eu não os reconheci por um momento.
— Fique longe daquele homem, Asthara — alertou — Tem algo de muito estranho com ele. Não confio nele.
Assenti, pois, algo também não me cheirava muito bem na história de Lucas Aneton. Mas, o que mais foi estranho foi a reação de Kaio. Ele só reagia assim quando sabia de alguma coisa, mas não falei nada porque eu sabia que ele não ia responder, não agora. E, porque eu confiava na sua capacidade de ler pessoas tanto como no meu instinto.
— Não se preocupe. Eu também não confio nele, bebezinho Del Rey. — brinquei, o chamando pelo apelido que eu sabia que ele tanto odiava.
Kaio revirou os olhos, um sorriso tranquilo no rosto em que ele lutava tanto para fazer uma carranca, sem sucesso.
— Não começa, Tara Varinha. — rebateu, entrando no carro.
Abri a porta de passageiro e entrei logo a atrás.
— É Varyneus! — contestei, ele sempre conseguia me tirar do sério com esse apelido.
Kaio riu, fechando o cinto de segurança assim como eu. Ele virou-se para mim, o sorriso zombeteiro brilhando nos seus lábios.
— Oh, então você admite que o seu nome é Tara? — foi a minha vez que revirar os olhos e dar um tapa no seu ombro.
— Idiota. — murmurei embirrada, mas logo dando um sorriso — Você pode me levar ao Nycolas primeiro? — perguntei assim que ele deu a partida.
O Nycolas é um pequeno restaurante no centro da cidade em que servem as melhores comidas de sempre, o motivo que me fazia ir tanto para aquele local além da boa comida é a dona. Nona, uma amiga de longa data do meu pai e a minha madrinha e a sua filha, Nora Nycolas, minha amiga e a de Kaio.
— Você tem ido muito ao Nycolas, ultimamente. — Kaio ponderou, focado nas ruas a nossa frente.
Dei de ombros, relaxando na cadeira.
— Eu gosto de lá. — falei — Você também tem ido muito lá que eu sei, não tente negar.
Kaio sorriu malicioso, curvando uma das poucas ruas antes do restaurante.
— Claro que eu tenho ido. Eu não vivo sem a comida da Nona. — o seu rosto se iluminou nesse segundo, como se apenas falar de comida o iluminasse por completo.
Mas embora nós gostássemos muito da comida de Nona, eu sabia que aquela não era o único motivo.
— Seu mentiroso — apontei assim que ele parou o carro do outro lado da rua do Nycolas — Você tem ido ver a Elise! — como se fosse apanhado no flagra meu amigo congelou.
Eu soltei uma gargalhada saindo da sua, BMW série 1 e fechando a porta logo em seguida.
— Não esquenta, Kaio — entrelacei o meu braço ao seu quando atravessamos a rua — Eu sei que você gosta da Elise já a um tempo.
Não parecendo nada surpreso, ele soltou um riso contido, e um suspiro resignado.
— Parece que eu sou um livro aberto para você, Asthara. — disse.
Eu sorri confiante, andando a passos largos.
— Claro que sim. Eu te conheço a minha vida inteira, bebezinho Del Rey. — falei de forma confiante.
— Se você me chamar assim mais uma vez, eu te bato. — gargalhei alto fugindo dele. Nunca que eu pararia de o chamar bebezinho Del Rey.
— É mais provável eu te bater, do que o contrário. — falei assim que abri a porta de vidro do restaurante.
O sininho no alto da porta tilintou assim que nós adentramos o ambiente, anunciando a nossa chegada.
O Nycolas estava especialmente cheio naquela tarde de segunda-feira. Alguns estudantes e fregueses conversavam animados enquanto apreciavam as suas próprias refeições.
Atravessamos todas as outras mesas e nos sentamos nas poucas, das cadeiras restantes do enorme balcão castanho.
— Asthara! Que bom ver você. — Nora gritou do outro lado do balcão, segurando as minhas mãos animada.
— Também é bom ver você, Nora. O final de semana sem você, foi tedioso. — falei a observando andar apressada entre o pequeno espaço servindo bebidas e anotando pedidos.
— Desculpe por isso amiga — o semblante da loira tornou-se culpado — Podemos ficar esse fim de semana todinho juntas.
Sorri agradecida quando ela dispôs um copo de suco de limão a minha frente, já sabendo que seria o que eu provavelmente pedia.
— Não precisa se desculpar. Como está o Matthew? — Nora sorriu para um novo cliente o atendendo logo em seguida. — Como sempre, está uma delícia.
Matthew era o namorado dela, com quem ela foi passar um divertido final de semana nas praias de Miami.
— Muito bem! Mas teve que voltar para a universidade. Acho que só nos veremos no próximo mês. — me senti mal por ela, ter o namorado estudando em outra cidade deveria ser difícil.
Kaio coçou a garganta forçadamente do meu lado, chamando atenção da garota de olhos castanhos.
— Eu também estou aqui, Nora. Machuca o meu coração ser ignorado dessa forma, sabia? — perguntou com a mão no coração, uma falsa expressão de choro no seu olhar azul.
Nora olhou surpresa para o nosso amigo de infância, como se realmente só o tivesse notado agora.
— Oh, meu deus, Kaio. Quando você chegou? — perguntou abobada, agarrando o seu rosto com as duas mãos e os olhos brilhando.
— Eu... cheguei com a Thara. — se esforçou a dizer, com as mãos de Nora esmagando as suas bochechas.
— Sério? — perguntou o soltando — Não é para menos, Asthara é uma figura notável demais. Ela ofusca qualquer um ao seu redor. — a loira disse confiante voltando a servir os seus clientes.
Kaio bufou uma risada, mas logo ficando sério e comendo o arroz com bife que havia pedido antes.
— Não culpem o meu cabelo de novo. — murmurei bebendo da minha bebida.
Os dois riram cúmplices, me olhando divertidos.
— Claro que é o seu cabelo! — disseram juntos e eu revirei os olhos — E os olhos! — continuaram.
Eles sempre diziam que o meu cabelo chamava atenção demais. Eu sabia que o meu cabelo vermelho sangue revolto de cachos chamava a atenção em contraste com a minha pele negra e os meus olhos dourados, mas eles exageravam. Não era tão chamativo assim, eu acho.
— Por que só tem você e o Nolan atendendo? — perguntei apontando ao rapaz clarinho que apontava os pedidos e levava a cozinha — Onde estão Nona e Elise?
Nora estava servindo um refri para uma garota morena que havia chegado a pouco quando respondeu:
— Mamãe e Ellie foram fazer compras. Temos tido muita clientela ultimamente e as compras estão acabando mais rápido do que o esperado. — respondeu feliz, sabendo que o negócio da família estava prosperando.
Eu gostava de a ver feliz, e ficava ainda mais feliz que o sonho de Nona estava finalmente se realizando.
Ficamos mais tempo no Nycolas do que esperado. O sol já estava quase se pondo quando decidimos ir para casa.
— Até amanhã, Nora. Eu te ligo assim que chegar em casa. — me despedi, com Kaio perto da porta de vidro.
— Até amanhã, Tha...— a minha amiga parou a fala no meio e me olhou com uma expressão séria — Tenha cuidado esses dias e não ande sozinha.
O olhar sério no seu rosto não contrastava nada com o seu estado de humor de sempre, me deixando apreensiva.
— Por quê? Aconteceu alguma coisa? — perguntei apertando a alça da minha mochila.
— Parece que tem um animal selvagem a solta na cidade. — disse, ainda com a expressão séria.
— Animal selvagem? — Kaio perguntou entrando na conversa. Nora assentiu.
— Parece que o Sr. Moris, foi atacado ontem a noite na sua oficina e ainda continua desaparecido. A polícia só encontrou um rastro de sangue e o que pareceu ser o osso de um dos seus braços.
Um arrepio passou pelo meu corpo, suor se acomodando na minha testa. Eu morei em Screamsville a minha vida toda e nunca se ouviu casos de desaparecimentos, animais selvagens e nem nada atacando moradores do dia para a noite.
Os únicos registos que se tinham de animais selvagens atacando pessoas eram retratados como monstros que apareciam em noites de lua cheia e comiam humanos. Tudo isso eram apenas rumores, mas numa cidade coberta por florestas e esquecida do mundo tudo era possível.
Embora eu tentasse, não conseguia tirar da mente as palavras de Nora e os ‘flashs’ do pesadelo que eu tive na noite anterior.
Havia algo de muito estranho acontecendo comigo e com essa cidade e a notícia de um animal selvagem atacando pessoas só me deixava mais alerta.
Algo me dizia que não era apenas um animal selvagem, o meu instinto gritava isso. Parece que há mistérios sombrios batendo nas portas de Screamsville!
Asthara Varyneus ( 19 anos)
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Atualizado até capítulo 70
Comments
CLARA CRISTINA FERREIRA DE PAULA
apaixonada estou lendo pela segunda vez
2024-09-16
2
Thaís Saraiva
ela é linda!
e chama sim atenção.
2024-10-12
1
Thaís Saraiva
não foi um simples ataque. Quiseram mesmo matá-lo
2024-10-12
1