A ansiedade me deixa dormir até certo horário.
Eu sou uma pessoa muito ansiosa. Tenho crise de ansiedade sempre
que algo importante vai acontecer ou quando me esgoto no trabalho. Eu sou
toda complicada, essa é a verdade.
Além da imunidade baixa, por conta de um transplante de fígado
que fiz quando era pequena, que me causa hemorragia se eu fico nervosa ou
algo fora do normal altera meu metabolismo, eu tenho crise de ansiedade e
tendência a depressão.
Eu sempre me senti muito presa, então sempre tive depressão. Até
minha mãe casar de novo e afrouxar as rédeas do controle um pouco.
Melhorei muito depois que Pedro e Sérgio entraram nas nossas
vidas. Babi e minha tia sempre tentaram me ajudar, mas nunca foi fácil.
Ainda mais depois que Igor me traiu e foi embora. Ele simplesmente se foi
e os amigos dele que me contaram da traição. Aquela foi a última vez que
tive uma crise, a última vez que chorei também.
Eu só tinha 18 anos na época e aquela situação foi realmente difícil de aguentar. Fiquei internada por quase 3 meses. Foi quando minha mãe conheceu Sérgio, nos corredores do hospital. Ele foi levar Pedro, que tinha deslocado o ombro.
Foi ali, naquele momento, que as coisas começaram a melhorar para mim.
Desde então eu não entre mais em depressão ou tive hemorragia.
Minha vida ficou mil vezes melhor depois que minha mãe casou de novo e
eu passei a ter Pedro. Ele é realmente como um irmão para mim.
Essa é a primeira vez, em 5 anos, que eu tenho uma crise de
ansiedade. Eu vou me mudar, vou pra São Paulo, vou fazer uma faculdade e
vou finalmente ser livre, sem amarras ou controle. Não é mais um sonho, é
real.
E me dou conta disso quando meu celular desperta às oito da manhã
e Babi acorda eufórica, já pegando as bolsas para colocarmos os itens
básicos, que vão com a gente no avião. A euforia da minha melhor amiga
me faz levantar animada e ir terminar de arrumar as coisas junto com ela.
Quase nove horas Lari aparece no meu quarto com a maior cara de
sono do mundo. Ela dorme mal, porque fica estudando pro cursinho. Podia
estudar de dia? Podia, mas ela diz que não consegue se concentrar. Eu
entendo. Às vezes não consigo me concentrar durante o dia também e fico
escrevendo a noite. Só que prefiro trabalhar de dia e dormir à noite.
— Bom dia, Larissa.
— Bom dia, Isabella — Lari balbucia, se jogando na minha cama.
— Dormiu nada, né? — Babi pergunta.
— Dormi sim. É sono acumulado — minha cunhada responde,
reprimindo um bocejo. — Que horas vocês vão sair daqui?
— Umas dez, eu acho.
— A virginiana é você e tá sugerindo só uma hora antes do vôo? —
Babi ri.
— Me erra com isso de controladora — reclamo. — O aeroporto é
perto daqui, acho que dá tempo tranquilo.
— Ótimo. Posso cochilar um pouco — Lari murmura, fechando os
olhos e se cobrindo.
— Cochila. Te acordo nove e meia. — garanto.
— Você é maravilhosa, Isabella.
— Eu sei — Suspiro, fazendo as duas rirem.
— Preparadas? — Pedro entra no quarto quase gritando e eu ataco
uma almofada na cara dele.
— Cala a boca, idiota. Lari tá dormindo — repreendo-o. Ele olha
pra namorada dormindo na minha cama e se senta na poltrona, em silêncio.
Lari dorme super-rápido na minha cama e demora horas até na dela, vai
entender.
— Tá. Estão preparadas? — pergunta de novo, o tom de voz mais
baixo.
— Sim e não — respondo, fazendo-o rir. — Que cara é essa?
— Meu pai e sua mãe chamaram a gente lá embaixo, tipo, todos nós
— Pedro coça a nuca. Ergo as sobrancelhas.
— Eu disse que só ia acordar a Lari às nove e meia. Então eles vão
esperar até nove e meia.
Babi ri. Comigo é assim. Ou espera, ou paciência. Posso fazer nada.
— Acho que eles esperam — Pedro dá de ombros.
— Sabe o que é? — pergunto.
— Sei não, Bell.
Será que minha mãe inventou alguma coisa? Mas o Sérgio não vai
deixá-la me atrapalhar.
Respiro fundo.
Só descendo pra saber o que é tão importante que eles querem todo
mundo junto. Fico preocupada só de pensar no que pode ser.
Um pouco depois das nove e meia a gente desce. Foi fácil acordar
Lari, mas só acordei ela às nove e meia, como disse que faria.
E já estou arrumada: calça jeans cinza, blusa cinza, jaqueta de couro
preta e coturno de couro preto de cano baixo com salto e cadarço. Eu amo
minhas botas assim e não largo.
O que encontro na sala de jantar me surpreende. E acho que não só a
mim, a julgar pelas expressões de Pedro, Lari e Babi. Pedro e eu nos
entreolhamos, antes de nos aproximar da mesa de café da manhã.
Tem de tudo. Suco, café, leite, cappuccino, torradas, bolacha, pão de
queijo, pão de trigo, croissants, waffles, queijo, requeijão, manteiga, pasta
de amendoim e geleia de morango.
Fico até tonta só de olhar para o tanto de coisa. Meu Deus. Por que
de tudo isso? Só por que tô indo embora? Podia ter falado antes, se
soubesse que eles iam encher a mesa de comida desse jeito em todas as
refeições.
— Por que tudo isso? — Pedro indaga.
— Pra Isabella. Último café da manhã dela com a gente — Sérgio
esclarece. Minha mãe permanece muda. Tá calma demais. Tem coisa aí.
Eu tenho pé atrás com a minha mãe sim, porque a conheço. Não sou
uma filha ruim, não mesmo. Tenho meus defeitos, como todo mundo. Mas
ela é impossível, sem exagero. E pra mim esgotou.
— Tudo isso só por causa da Isabella? Credo. — Lari faz um tom de
voz de nojinho e eu faço uma careta pra ela.
— Senta, gente. Vamos comer — Sérgio incentiva. Respiro fundo,
antes de me sentar entre Lari e Babi.
Tem tanta coisa na mesa que é quase impossível escolher. Mas
acabo pegando waffles e geleia de morango. Lari me olha, com a testa
franzida, enquanto pega um croissant, e eu dou de ombros. Melhor comer
pouco pra não enjoar no avião. Me conheço bem, pra saber que meu
estômago pode escolher revirar bem quando estiver no ar.
Fica um silêncio estranho enquanto comemos. Minha mãe não
parece totalmente satisfeita com a situação, já meu padrasto está fazendo de
tudo para amenizar o clima, mas não faz nenhum comentário. E esse é meu
medo, quando ela tá quieta demais.
Mas aproveito o café da manhã, que está melhor do que nunca. Tem
coisa melhor que waffles no café da manhã ou em qualquer horário?
— Vocês vão com a gente no aeroporto levar a Bell e a Babi? —
Pedro pergunta. Puxo o ar. Que timing, Pedro, que timing.
Se minha mãe fizer um show eu juro que mato o língua solta do
Pedro. Eu o mato, de verdade.
— Eu vou. A Flávia ainda tá decidindo — Sérgio responde. Solto o
ar. — Ela não se opôs à decisão da Bell de ir embora, mas não sei se quer ir
lá ver ela indo embora sabe-se lá por quanto tempo — Ele dá de ombros.
Saindo do controle dela? Era algo que ela tinha que ver. Não se opôs
e nem podia, né? Eu tenho 23 anos, faço o que eu bem entender da minha
vida.
Como minha tia diz: “Só tome decisões se puder aguentar as
consequências e lidar com elas.” E eu posso, posso aguentar e lidar com as
consequências dessa minha decisão.
Acho que talvez essa tenha sido a melhor decisão que tomei na vida.
Depois do café, subo com a Babi para o quarto, para terminar de
arrumar as coisas. Pedro e Sérgio já desceram com as nossas malas para a
garagem e Lari entra no quarto quando coloco meu carregador do celular e
o fone de ouvido na bolsa de mão.
— Eles já guardaram as malas nos carros e Sérgio disse que vai
mandar seu carro, que você pode levar a chave. — Lari informa. Balanço a
cabeça.
— A gente te espera lá embaixo. — Babi avisa, saindo do quarto
com sua mala de mão. Lari vai logo atrás dela. Elas sabem que preciso de
um momento pra me despedir daqui, porque não sei quando volto. Vai ser
muito difícil voltar pra cá quando eu sentir o gosto da liberdade que nunca
tive, sei disso. Me conheço o suficiente pra saber que vou adiar o máximo
voltar, até para as festas de fim de ano.
Observo minha mesa, minha cama, meu closet quase vazio, minha
varanda, minha estante de livros.
Vou sentir falta do meu quarto, do meu closet, do meu banheiro, do
meu espaço... Eu vou sentir falta de tudo aqui.
Mas eu tô indo seguir meu sonho e não me arrependo dessa decisão.
Como poderia? É tudo o que eu sempre quis, tudo o que sonhei por anos.
É o que eu quero fazer. E é o que vou fazer. Vou fazer essa
oportunidade ser inacreditável. Eu vou viver.
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Atualizado até capítulo 41
Comments
mari
não gostei das atitudes dela com absurdo isso hein autora
2024-05-25
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