CAPÍTULO — Raiva e Jantar
Era impossível dormir naquele lugar. Latidos cortavam a noite como lâminas; alguém gritava lá embaixo a cada meia hora; um líquido calor úmido parecia se infiltrar nas paredes. Eu me virava e revirava na cama, a raiva e o medo brigando por espaço no peito. Quando Breu entrou, só consegui encará-lo com sono e fogo nos olhos.
— Espero que tenha tido uma ótima noite — ele disse, notando a bandeja intacta de café ao lado da cama.
— Seria, se seus cães não resolvessem fazer festa a madrugada inteira — resmunguei, bocejando.
Ele cruzou os braços e examinou meu rosto como se eu fosse um objeto novo no armário.
— Vejo que não comeu nada.
— Eu não consigo comer quando não durmo — respondi, fitando o chão. — Quando eu volto pra casa?
A resposta veio dura, fria.
— Já falei. Você não volta. Entendeu? Pare de perguntar.
— E se eu ficar aqui, quem garante que meu irmão não vai morrer? — encarei-o e senti o olhar dele travar. Minha voz saiu mais firme do que eu esperava.
— Garanto que, se você não fugir, teu irmão ficará bem. Se fugir, morrem os dois. — Breu cravou a faca na carne com força, fazendo minha mão gelar.
— Não acredito em você — disse, rindo sem humor.
Ele bateu a mão na mesa. — Acabou o jantar pra você. Sobe pro teu quarto.
— Não — retruquei, me recusando a ceder.
— Como é, garota? — Breu levantou-se. A irritação crescia nele como um tornado.
— Eu não terminei de comer — bati as mãos na mesa de propósito.
Ele avançou. — Eu mandei você subir. Você me obedece.
— Eu não sou cachorro! — gritei. — Não sou mercadoria que se manda e desmanda!
A mão de Breu foi ao meu pescoço. Levantou-me pelo colarinho; a pressão foi ameaça e promessa ao mesmo tempo.
— Repete o que falou — ele rosnou — e eu te mostro o inferno que você chama de vida.
Senti o mundo estreitar. Engoli medo e respondi com aquilo que me restava de coragem.
— Faz da minha vida um inferno e eu te mostro o capeta.
Ele me soltou de repente. Caí sentada no chão, ofegante. Os olhos dele brilhavam de um modo que irritou até a minha raiva.
— Eu vou acabar com sua vida se continuar me desafiando — disse ele, frio.
— Ótimo. Faz um favor — respondi, tão seca que até me assombrei com a minha própria voz.
Breu cerrou os punhos. Havia a ameaça física e outra ameaça: o orgulho ferido de alguém que não aceita ser contrariado.
Mais tarde, já no meu quarto, o ar parecia vibrar pelo ódio que eu tentava segurar. Arremessei um copo na parede quando não aguentei mais o nó no peito. Nina tentou intervir; eu nem percebi a mão dela quando joguei outro copo.
— Senhora! — Nina gritou, e essa voz foi como um choque que me fez parar.
— O que foi? — arfava, pronta pra pegar o primeiro vaso que visse.
— Desculpe o grito — Nina disse, a voz baixa. — Mas o senhor Breu escuta tudo o que a gente fala.
O chão sumiu por um segundo.
— Como assim? — sentei na cama, as mãos tremendo.
— A casa tem escutas. Faz parte da segurança — explicou ela, tentando ser gentil.
Pensei nas minhas palavras, em cada grito, em cada plano maluco que eu havia sussurrado naquele quarto. Eu estava ferrada.
— Então ele ouviu tudo — falei, quase chorando.
— Talvez não tenha ouvido tudo. Talvez estivesse dormindo. — Nina tentou um sorriso que não convenceu ninguém. — Dorme um pouco. Amanhã a gente pensa.
Li um romance para tentar me desligar. Aquelas páginas foram um remendo temporário na minha sanidade: gente que sofria, que tinha escolhas, que, às vezes, conseguia recomeçar. Adormeci com o livro no colo, sem saber que Breu não só ouviu: também viu meu surto. Havia algo naquela raiva que mexia com ele — não sei se ódio, posse ou curiosidade.
Quatro dias se passaram. Eu praticamente não saí do quarto. Comia ali,
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 41
Comments
Lima escritor
tá ficando interessante essa história
2024-10-24
1
Eloi Silva
tomara que seja inimigo do Breu e encontre a Verônica la
2024-09-28
1
Raquel Luz
pode ser mafioso também 😄
2024-09-02
2