Vendida Pelo Meu Irmão
Cheguei em casa tarde, exausta como se tivesse corrido uma maratona invisível. A rua estava escura, só a luz mortiça do poste marcando as sombras. Quando vi um carro preto parado em frente ao meu portão, um frio subiu pela espinha. Alguma coisa não batia.
Entrei correndo. Antônio estava no chão — meu irmão, desmaiado — e três homens vestidos de preto o cercavam. Meu coração bateu tão forte que parecia querer pular do peito.
— Antônio, fala comigo, por favor — gritei, jogando-me ao lado dele, tentando acordá-lo.
Um dos homens me empurrou sem cerimônia.
— Esquece, menina. Ele está desmaiado — ele disse, puxando-me para cima pela camisa.
Gaguejando, perguntei quem eram e o que tinham feito com ele. O homem se apresentou: Marco. A voz dele tinha um tom de meia-idade, áspera o suficiente para me gelar.
— Esse verme é seu irmão? — apontou, e eu senti o mundo encolher.
Tentei saber o que Antônio havia feito. Marco respondeu seco:
— Nos poupou tempo. Venha.
Puxou meu braço. Eu me debati. Gritei que não o conhecia, que soltassem minhas mãos. Nesse momento apareceu um quarto homem: alto, ombros largos, olhos cor de mel e uma cicatriz que cruzava a sobrancelha. Vestia-se todo de preto. Quando ele passou, os outros se curvaram de leve. Havia algo de rei na maneira como ele andava.
— Quem são vocês? O que querem comigo e com meu irmão? — disse, tentando não mostrar o quanto tremia. Eu não tinha nem metro e sessenta, mas fingi coragem.
— Me chame de Breu — respondeu o homem alto. Sem mais cerimônia, chutou Antônio adormecido.
— Quanto ele te deve? — perguntei, respirações curtas. Se havia alguma chance de resolver com dinheiro, eu pagaria.
Breu me olhou como se eu fosse um objeto.
— Ele não apostou dinheiro. Apostou você. — E riu.
Senti o chão desaparecer. Meu irmão — minha única família — havia me vendido como se eu fosse uma cabra. As lágrimas vieram tão rápido que mal pude pensar. Breu tirou sarro do meu desespero.
— Esse sentimentalismo me irrita — disse, e eu vi desdém em cada músculo do rosto dele.
Recusei-me a ir com ele. O que me deram em troca foi um aperto no pescoço. Breu segurou firme.
— Escuta aqui, garota. Você é minha. Faz o que eu quiser. Se quiser continuar viva, cale a boca. — Aperte. A pressão subiu, o mundo virou uma mancha, e eu acabei desmaiando.
Acordei em um quarto escuro. Uma moça delicada, com cara de empregada, me chamava:
— Senhorita? Está bem?
Toquei o pescoço — a marca da mão dele ainda ardia. Perguntei onde estava. Ela se apresentou: Nina. O nome parecia pequeno diante daquela casa grande e estranha.
— A senhora está no império do senhor Breu — disse Nina, com uma tristeza que pesava.
Não demorei a reparar nos cortes cicatrizando no pulso dela. Havia algo quebrado ali, e eu pensei em pedir ajuda para voltar para casa, para avisar alguém, qualquer coisa. Nina olhou para mim com pena.
— Duvido que consiga — disse baixinho. — Meu pai, Maco, faz a ronda todas as noites com seus cento e noventa homens.
Antes que eu pudesse argumentar, ouviram-se passos do lado de fora. Maco entrou carregando roupas limpas e itens de higiene. Ele chamou Nina de “minha filha” e me deixou um monte de roupas como se aquela fosse minha nova rotina. Assim que a porta se fechou, trancando-se sozinha, senti-me mais presa do que nunca.
Maco falou com frieza prática:
— Essa agora é sua casa.
Percebi o olhar dele: não era afeição, era propriedade. Tentei negociar. Perguntei se Nina poderia ir até minha casa para ver meu irmão. Maco negou. Disse que eu pertencia a Breu, que não devia desafiar Breu, e me aconselhou a evitar provocações. Depois, saiu, trancando a porta. Fiquei sozinha, rodeada de roupas estranhas e de pensamentos apavorados.
Passei a noite em vigília. Tomei banho, mas não dormi. Meus planos iam do absurdo ao desesperado — sair correndo, seduzir Maco, criar uma confusão — tudo parecia inútil. Breu não era homem de perder a cabeça à toa, e Maco, apesar do jeito mais contido, parecia inteiramente submisso ao tal Breu.
Enquanto eu tentava reunir forças, ouvi vozes na casa de Breu. Marco e Breu conversavam na sala, minhas palavras eram objetos que eu não podia ouvir, mas que me perfuravam.
— Você poderia ter matado a moça — Marco murmurou, tentando ser razoável.
— Ninguém me desafia — Breu respondeu, servindo-se de whiskey. — Eu mato. Isso vale também pra você.
Marco disse que havia pegado “o dedo duro”, alguém que havia falado demais. Breu, com calma cruel, apertou o copo até o vidro estourar. Depois nos levou a um galpão nos fundos. Um homem estava pendurado pelos punhos, sangrando, olhos revirados. Breu, sempre teatral, pegou um bastão.
— Vai, Miguel. Fala quem te mandou — ordenou.
O homem, Miguel, tentou resistir, rindo no começo, até que Breu acertou sua perna. O grito dele me gelou. Quando, com dor, Miguel falou o nome Salverine e disse que ele queria todos mortos, Breu sorriu de um jeito doentio.
— Deixe ele vir. Faz anos que quero a cabeça dele — disse Breu. Liberou os cães. O que veio depois foi uma cacofonia de dor e gritos que ficou martelando na minha cabeça.
Na volta ao quarto, ainda com o cheiro de sangue como memória, sentei-me na beirada da cama e percebi a verdade nua: eu estava presa a um homem que gostava de quebrar gente. E havia algo pior — meu irmão havia me traído para salvá-lo. Essa descoberta era um corte que doía de um jeito diferente. Não apenas a traição; a sensação de que eu não tinha mais ninguém.
Às vezes me pego pensando em sonhos banais: voltar ao meu emprego, pagar as contas da faculdade, ver Antônio acordar e rir do susto. Mas agora cada um desses desejos soa distante, como se vivesse em outra vida. Sento, olho para a janela gradeada do meu quarto, e faço planos que não sei se vou conseguir executar. Planejo acordar cedo, observar os guardas, aprender rotinas, qualquer coisa que me dê vantagem. Porque, se o mundo me transformou em aposta, preciso me tornar carta vencida demais para ser jogada.
E é assim que eu sobrevivo por ora: lembrando quem eu sou, mesmo quando o resto insiste em me chamar de mercadoria. Tento não chorar à noite, e prometo a mim mesma que, por mais que Breu pense o contrário, ainda tenho escolha. Ainda posso lutar.
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Atualizado até capítulo 41
Comments
Lima escritor
História Boa e muito bem elaborada gostei 👏👏👏👏👏
2024-10-24
1
Klebéa Freitas
tchau. É difícil lê 😛
2024-10-03
0
Luci Nascimento
o enredo parece ser bom, o problema é a quantidade de erros de gramática e na língua portuguesa.
2024-09-18
1