No pomar que passei boa parte da minha infância, me reencontro com o
balanço feito de cordas trançadas. Meus dedos passeiam por seus nós, chego em
seu velho assento de madeira e não resisto em me balançar mais uma vez. Pego
impulso e me sinto aquela criança sonhadora de anos atrás. Fecho os olhos,
lembrando e sentindo o cheiro da felicidade perdida. Meus pés encostam nas
folhas e galhos, me fazendo sentir cócegas.
Abro meus olhos, e o que vejo não é a paisagem do velho pomar que estava
a pouco em minha frente, o que vejo é uma imensa escuridão. Meus pés freiam a
velocidade do meu balançar até que eu pare por completo. Abro e fecho meus
olhos, e até os esfrego com as mãos na esperança de ser uma ilusão. Levanto já
com o coração acelerado e o choro embolando em minha garganta porque não tenho
a quem pedir socorro: estou sozinha. Concentro todas as minhas forças em
lembrar que estou assim porque quero, é uma opção minha. Ergo a cabeça e mesmo
sem enxergar, caminho ereta e destemida rumo a uma solução. Meu medo não vai me
parar, já tenho vinte e um anos e mais do que tudo, preciso tomar conta da
minha vida. Dou dezenas de passos sozinha, mas meu caminho é interrompido por
um par de mãos enormes que puxam velozmente meus ombros, fazendo-me chocar em
seu peito e então...
Acordo com o som do despertador.
Com o corpo encharcado pelo suor, tento me livrar das cobertas ao mesmo
tempo que saio da cama, mas essa mistura só resultou em minha queda no chão.
Olho meu quarto e a penumbra que as cortinas fazem me deixam duvidar se é sonho
ou realidade, ainda no chão gelado, vou rememorando minhas prioridades e assim,
consigo me livrar das cobertas emboladas em minhas pernas, para depois, abrir
as cortinas e acender a luz.
Agora sim, caminho o mais rápido que posso e chego até o espelho. Nele,
observo meu rosto e fico aliviada em descobrir que foi apenas um pesadelo. Como
é bom ver meu reflexo sem qualquer sinal de manchas escuras. Há! É inexplicável
a sensação de que hoje o pesadelo não se tornou realidade! Respiro
profundamente, como se eu estivesse inalando a própria felicidade. Mais um dia
maravilhoso se iniciou.
Ainda no espelho contemplo mais uma vez meus olhos, a única parte que
considero bonita em meu corpo, mas que esconde minhas fraquezas, meus medos,
minhas torturas. Mesmo assim, me permito gastar um tempo os admirando e os
maquiando com lápis preto e rímel todas as manhãs. Durante minha higiene
matinal, renovo meus votos de cuidar dos meus pais.
Se tem pessoas aqui na terra que eu preciso agradecer por estar viva,
literalmente são eles: Rose e Anselmo Schmitz. Meus pais se privaram até mesmo
de uma vida tranquila no campo, para me manter viva. Embora nunca esse assunto
seja mencionado, eu me sinto em dívida vitalícia com eles. E é nesse ponto que
me sinto tão decidida em não viver uma paixão. A paixão é algo inacessível para
mim, que não posso deixar acontecer. Meu psicológico estremece só de pensar que
serei responsável por mudar os sonhos de mais um ser humano, condenado pelas
minhas fraquezas.
Esse voto não é difícil de cumprir, já que não me considero uma garota
bonita que desperta interesse nos homens, como descendente de alemães, eu,
Luísa Schmitz, sou loira mel de longos cabelos ondulados, 1,70 de altura, muito
magra, pele muito branca, quase albina e olhos cor de mel esverdeado, com um
círculo preto bem definido. Meus olhos ficam mais verdes quando choro (acredite
eles também me condenam).
É fácil desviar de relacionamentos amorosos, quando sempre se anda com
uma beldade afrodescendente — minha melhor amiga Cássia — pois qualquer um que
se aproxima sei que não podem resistir aos seus olhos pretos como noite sem
luar e ao seu corpo voluptuoso. Ela é uma ótima amiga, mas que também
mantenho certa distância.
Estamos na segunda quinzena de outubro e por ser no norte do Paraná, o
calor é bem intenso. Hoje é segunda-feira e minha semana está de agenda cheia:
faço faculdade de pedagogia todas as noites, tenho prática pedagógica quase
todas as manhãs e graças ao bom Deus muitas encomendas de suspiro italiano
(minha especialidade) e sobremesas para fazer e entregar. Então que comece a
semana!
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Atualizado até capítulo 59
Comments
Dora Branco
Parece interessante!!
2024-03-11
0
.🌱Pomhy.☕
Autora, você está me deixando ansiosa demais! Quero mais capítulos agora!
2023-08-15
3