Capítulo 3

O suor frio escorria pela minha têmpora, embora o quarto estivesse gelado. Abri os olhos para a escuridão úmida da madrugada e a imagem do cartão prateado de Damien dançou diante de mim. O bilhete, com sua caligrafia elegante e enigmática, parecia sussurrar promessas e perdições. “Espero por você no Sétimo Céu. Não se arrependerá.” Não me arrependeria? Meu estômago se contorceu. A ideia de sequer pesquisar sobre aquele clube de acompanhantes me enojava, mas a agonia da minha mãe, a pilha crescente de contas médicas e o olhar faminto de Fernando sobre mim transformavam o nojo em um desespero quase palpável. Meu dedo traçou a borda do cartão, a textura fria parecendo zombar da minha hesitação. O “Sétimo Céu”… um nome irônico para o inferno que eu sentia que estava prestes a explorar.

Mais tarde, enquanto eu tentava engolir o café amargo, Renata me observava com seus olhos perspicazes.

“Ana, você está pálida. Aconteceu alguma coisa?” ela perguntou, sua voz suave, mas carregada de preocupação.

Forcei um sorriso, tentando soar casual. “Só o estresse de sempre, Ren. Trabalho, contas… você sabe.”

Ela suspirou, pegando minha mão. “Eu sei que a situação da sua mãe é difícil. Mas, por favor, Ana, não faça nenhuma loucura. Certos caminhos… eles podem parecer a solução, mas só te levam para um poço mais fundo.”

Meu coração disparou. Será que ela sabia? Ou era apenas um pressentimento? Soltei minha mão delicadamente. “Não sei do que você está falando, Renata. Estou apenas tentando me virar, como sempre.”

Seus olhos fixos nos meus, uma advertência silenciosa. “Às vezes, a dignidade é a única coisa que nos resta, Ana. Não a troque por nada que pareça fácil.” As palavras dela ecoaram, acusadoras, em meus ouvidos.

No escritório, a pressão de Fernando era um nó na minha garganta. Ele se inclinou sobre minha mesa, o cheiro de seu perfume amadeirado me invadindo.

“Ana, preciso daqueles relatórios até o final do dia. Sem atrasos, sem desculpas. Entendeu?” Sua voz era baixa, controlada, mas o olhar que me lançou era tudo, menos profissional. Havia um brilho possessivo em seus olhos, uma fome que me deixava desconfortável.

“Sim, Fernando. Serão entregues”, respondi, minha voz mais firme do que eu me sentia.

Ele sorriu, um sorriso lento que não alcançou seus olhos. “Sua determinação é admirável, Ana. Gosto disso. Mas preciso ver mais. Mais foco. Mais… entrega.” Sua mão roçou meu braço ao se afastar, um toque que queimou como brasa, uma provocação velada que eu não podia ignorar.

Com as mãos trêmulas, peguei o telefone. O número de Damien, aquele que ele havia escrito no verso do cartão, pairava na minha mente. Disquei, meu coração batendo tão forte que pensei que ele saltaria para fora do meu peito.

Uma voz grave, polida e um tanto misteriosa atendeu no segundo toque. “Sétimo Céu. Em que posso ajudar?”

Respirei fundo. “Meu nome é Ana. Recebi um cartão… do senhor Damien.”

Houve uma pausa, um silêncio carregado de expectativa. “Ah, sim. A senhorita foi recomendada. Nossas clientes são selecionadas com o mais alto critério. Discreção é primordial, e a excelência é o nosso padrão. Buscamos beleza, inteligência, e acima de tudo, a capacidade de proporcionar experiências inesquecíveis.”

As palavras eram um bálsamo e um veneno. “E… quais são as exigências?” minha voz mal um sussurro.

“Nossas exigências são tão altas quanto as expectativas de nossos clientes. Mas a recompensa… a recompensa é proporcional. Podemos oferecer a você uma vida que jamais imaginou, sem as preocupações que a afligem agora.” A voz era suave, quase sedutora, e eu podia sentir o vislumbre de um mundo de luxo e facilidade, contrastando violentamente com a realidade cinzenta da minha vida. Tentada, assustada, e mais curiosa do que eu gostaria de admitir, eu me senti puxada para o abismo.

Minha mente era um campo de batalha. O rosto pálido da minha mãe, seus lábios rachados enquanto tossia na cama, era a imagem que mais me atormentava. "Minha filha, você é a luz dos meus olhos", ela sempre dizia. Essa luz agora estava se apagando sob o peso das dívidas e do desespero. Eu me lembro de suas mãos, antes tão fortes, agora tão frágeis, segurando as minhas. "Não se preocupe, mãezinha. Eu vou cuidar de tudo. Eu prometo." A promessa era um fardo. Como eu poderia quebrar essa promessa? Como eu poderia deixá-la sofrer mais? O Sétimo Céu parecia a única saída, por mais sujo que fosse.

Fernando se aproximou novamente, seu olhar fixo em mim enquanto eu tentava organizar uns documentos.

“Ana, você está tensa”, ele disse, sua voz um tom abaixo do habitual. “Precisa relaxar.”

Eu me encolhi um pouco. “Estou bem, Fernando. Apenas focada no trabalho.”

Ele riu, um som baixo e perturbador. “Eu sei que está. Vejo o quanto você se dedica. É uma qualidade que admiro… e que me atrai.” Sua mão pousou na minha nuca, os dedos pressionando levemente. Um arrepio percorreu minha espinha, uma mistura de repulsa e uma estranha, quase imperceptível, atração. O jogo de poder era evidente, e eu me sentia como uma presa encurralada, com meu caçador desfrutando da espera. “Você tem um brilho, Ana. Algo que eu não vejo em mais ninguém.”

O telefone tocou novamente. Era a voz misteriosa do Sétimo Céu. “Senhorita Ana, gostaríamos de convidá-la para uma entrevista. Um encontro seletivo, se preferir. É uma oportunidade para você conhecer melhor o nosso… ambiente. E para nós, de conhecermos você.” A palavra “entrevista” parecia um eufemismo cruel. Era uma audição, uma inspeção. Meu estômago se revirou, mas minha mente já estava calculando os prós e os contras. O dinheiro. A liberdade. A salvação para minha mãe. O preço? Minha alma, talvez. Minha dignidade. Minha voz falhou quando respondi, uma única palavra que selaria meu destino. “Sim.”

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