Á Primeira Vista
"É incrível como a vida pode mudar em uma fração de segundo."
Joseph R. Russo.
Houve alguns momentos que definiram minha vida.
Este foi o primeiro.
Fortaleza, Ceará
Brasil
Há onze anos atrás
Aos seis anos de idade.
— Voglio andarci! Adesso! Voglio tornare a casa!
Eu gritei o mais alto que pude, dizendo para a minha mãe que eu queria ir embora. Eu queria voltar para casa!
— Não vamos voltar para casa, Joseph. E não vamos embora. Nossa casa é aqui agora.
Ela respondeu em português. Ela se agachou e me olhou bem nos olhos.
— Joseph!
Disse, suavemente
— Eu sei que a mudança tem sido difícil, mas seu pai conseguiu um emprego novo aqui no Brasil.
Ela me abraçou, mas eu não me senti melhor. Eu não queria ficar naquele lugar.
Eu queria ir para casa.
— Smettila di parlare portoghese!
Reagi.
Eu odiava falar português. Desde que tínhamos saído da Itália e chegado ao Brasil, mamãe e papai só falavam comigo em português. Eles diziam que eu tinha que praticar.
Mas, eu não queria!
Minha mãe ficou em pé e levantou uma caixa do chão.
— Nós estamos no Brasil, Joseph. Eles falam português aqui. Você estuda português há tanto tempo, está na hora de usá-lo.
Fiquei parado, olhando minha mãe enquanto ela entrava na casa. Olhei ao redor, a pequena rua onde a gente ia morar. Havia muitas casas. Eram todas parecidas, mas cada uma tinha uma cor diferente. A nossa era amarela, minha cor preferida, com janelas brancas e uma pequena varanda. Meu quarto era grande e ficava no térreo mesmo. Na Itália, meu quarto ficava no segundo andar.
Prestei atenção nas outras casas. Todas tinham cores vibrantes:
Verde, azul, laranja… Então olhei para a que ficava ao lado. Bem ao lado, pois, dividíamos um pedaço da cerca. As duas casas eram grandes, e os jardins eram lindos.
A casa era azul celeste, com uma varanda ao redor. Ela tinha cadeiras de balanço e um balanço suspenso na frente. As beiradas das janelas estavam pintadas de branco, e tinha uma em frente à do meu quarto. Bem na frente! Eu não gostei daquilo. Não gostei que pudessem me ver dentro do meu quarto.
Eu estava triste com tudo aquilo, mas, não poderia fazer nada, me virei para seguir minha mãe, quando ouvi um barulho.
Vinha da casa vizinha. Olhei para a porta da frente deles, mas ninguém saiu. Caminhei em direção à minha varanda quando notei um movimento ao lado da casa, na janela do quarto da casa ao lado, aquela em frente à
minha.
As minhas mãos congelaram e fiquei olhando enquanto uma garota, usando uma fantasia de pirata, se pendurava na janela. Ela pulou para fora e limpou as mãos na roupa. Eu franzi a testa, com as sobrancelhas para baixo. Ela tinha cabelos ruívos, cacheados. Usava um chapéu de pirata na cabeça.
Quando ela olhou para cima, deu de cara comigo. E então sorriu. Acenou e aí correu e parou na minha frente.
Ela estendeu a mão e disse:
— Oi, meu nome é Lara Marinho, eu tenho seis anos e moro aqui do lado.
Encarei a garota. Ela tinha um jeito engraçado. Fazia as palavras em português soarem diferente do modo como aprendi na Itália. A garota, Lara, estava toda suja de lama.
Ela era esquisita.
A olhei da cabeça aos pés e reparei na sua mão. Que ainda estava estendida. Eu não sabia o que fazer. Eu não sabia o que ela queria.
Lara suspirou. Balançando a cabeça, ela pegou minha mão e a apertou. Sacudiu-a para cima e para baixo e disse:
— Um aperto de mãos. Minha avó sempre diz que temos que apertar a mão das pessoas que você conhece.
Ela apontou para nossas mãos.
— Isso é um aperto de mãos. E isso foi educado, porque eu não conheço você.
Eu não consegui dizer nada; minha voz não saía. Quando olhei para baixo, percebi que era porque nossas mãos ainda estavam grudadas.
— Qual o seu nome? perguntou Lara.
Sua cabeça estava inclinada para o lado de uma forma engraçada.
— Ei!
Ela disse, soltando nossas mãos
— Perguntei seu nome.
Limpei a garganta.
— Meu nome é Joseph. Joseph Ricci Russo.
Lara torceu o rosto, os lábios rosados sobressaindo de um jeito todo estranho.
— Você fala esquisito garoto!
Ela afirmou.
— No, in no!
Reagi.
Seu rosto se contorceu ainda mais.
— O que você disse garoto?
Perguntou Lara, enquanto eu me virava para entrar em casa. Não queria mais falar com ela.
Com raiva, eu me virei:
— Eu disse: “Não, eu não falo esquisito!”. Eu estava falando Italiano!
Respondi, dessa vez em português. Os olhos claros de Lara ficaram enormes.
Ela chegou mais perto, e ainda mais perto, e então perguntou:
— Italiano? Como Giuseppe Garibaldi? Minha avó leu para mim, um dia, um livro sobre ele.
Seus olhos estavam ainda maiores.
— Joseph, você é um herói italiano, como Giuseppe? A voz tinha ficado ainda mais engraçada.
Aquilo fez com que eu me sentisse bem. Estufei o peito. Meu pai sempre dizia que eu era um herói, como todos os homens da família.
— Sì!
Eu disse.
— Somos heróis de verdade, na Itália.
Um grande sorriso se abriu no rosto de Lara, e um risinho alto de garota saiu de sua boca. Ela levantou a mão e pegou no meu cabelo.
— É por isso que você tem cabelo comprido e olhos claros e grandes. Porque você é um herói.
Passei a mão no meu cabelo. Ele chegava ao ombro. Todos os meninos em Sardenha tinham o cabelo assim.
Lara colocou a mão no meu ombro. Seu rosto havia ficado sério, e sussurrou.
— Joseph, não conte para ninguém, mas eu sou uma caçadora de aventuras.
Eu torci a cara. Não entendi. Lara chegou mais perto e me olhou nos olhos. Apertou meus braços. Inclinou a cabeça. Olhou para os lados e então se curvou para falar.
— Normalmente não levo ninguém comigo nas jornadas, mas você é um herói, e todo mundo sabe que os heróis ficam altos e fortes e que eles são muito bons em aventuras e explorações, em longas caminhadas e… em todo tipo de coisa!
Eu ainda estava confuso, mas Lara se afastou e estendeu a mão de novo.
— Joseph!
Ela disse, com a voz séria e forte.
— Você mora na casa ao lado, é um herói e eu amo heróis. Acho que devemos ser melhores
amigos.
— Melhores amigos?
Perguntei Lara assentiu com a cabeça e levantou a mão ainda mais para o meu lado. Levantei a minha, lentamente, apertei a mão dela e a chacoalhei para cima e para baixo, como ela havia me mostrado.
Um aperto de mão.
— Então agora somos melhores amigos? perguntei, quando Lara puxou a mão de volta.
— Somos! disse ela, empolgada.
— Joseph e Lara.
Ela encostou o dedo no queixo e olhou para cima. Seus lábios se projetaram de novo, como se estivesse pensando em algo difícil.
— Fica legal, não fica? Joseph e Lara, melhores amigos além do infinito!
Fiz que sim com a cabeça porque realmente soava legal. Lara colocou a mão na minha.
— Me mostra seu quarto! Eu quero te falar sobre a nossa próxima aventura.
Ela começou a me puxar, e entramos correndo na casa.
Quando chegamos ao meu quarto, Lara correu direto para a janela.
— Este é o quarto bem em frente ao meu!
Eu concordei com a cabeça, e ela deu um gritinho, correndo para pegar minha mão de novo.
— Joseph!
Ela disse, empolgada.
— Nós podemos conversar de noite e fazer um telefone sem fio com latas e barbante, para podemos falar sobre nossos segredos um para o outro quando todo mundo estiver dormindo, e podemos planejar, e brincar, e…
Lara continuou falando, mas eu não liguei. Eu gostava do som de sua voz. Eu gostava do seu riso e do seu cabelo.
Talvez o Brasil não seja tão ruim, pensei, não se eu tiver Lara Marinho como minha melhor amiga.
E então éramos Lara e eu desde aquele dia.
Joseph e Lara.
Melhores amigos além do infinito.
Era o que eu pensava.
Engraçado como as coisas mudam com o tempo.
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Atualizado até capítulo 125
Comments
Gelcinete J. Rebouças
Cheguei aqui porque vim da leitura das 3 obras do caminhante da morte que são minha paixão
2024-07-02
0
Hilda F.P Marchesin
Iniciando Leitura
03/03/2024 20:26 PM
Domingo
2024-03-04
1
Eduardo Maciel
curtindo a leitura
2023-01-01
8