Capítulo 4 — Paixão

Duas semanas tinham se passado desde a última vez que Oliver e Kai tinham se visto, dando no total de oito visitas nesses dias. Alguns dias eles chegavam a conversar antes do sexo, mas sempre acabava do mesmo jeito: o Florence tendo que ir embora de madrugada ou de manhã, pois eles não eram namorados para ficar o dia todo na casa do outro como se fosse algo normal. 

Eles se conheceram um pouco mais nesses dias. O acastanhado descobriu que Kai era um pessoa bastante otimista, que mesmo tendo um passado muito triste, ele ainda conseguia sorrir genuinamente. Na realidade, Oliver pensou que talvez isso fosse um mecanismo de defesa, mesmo que fosse difícil colocar um sorriso no rosto estando destruído por dentro, deveria ser mais fácil do que confiar em alguém para falar o que realmente sente. Também descobriu que o rapaz era apaixonado em dois tipos de filmes um tanto quanto controversos, já que no próprio quarto havia alguns dvds antigos de filmes de terror e animações. 

Já Kai, cada vez descobria um pouco de Oliver já que ao contrário dele, gostava bastante de falar sobre a sua vida e seus gostos, mas não chegava a ser chato, na realidade, o rapaz poderia ficar horas e horas ouvindo-o falar sem se cansar. Sua voz era tão boa de se ouvir, parecia que ele estava ouvindo a melhor música feita e que todos desejavam ser infinita só para nunca mais parar de escutar. O Florence contava a sua versão da vida, o que era muito interessante para Kai que achava que todos riquinhos eram extremamente esnobes e só pensavam no próprio umbigo, quando o próprio Oliver demonstrou ser bem diferente disso, que não se importava com a classe social dos outros e sim, o que eles eram por dentro. Isso era encantador na visão dele.

Como mais um dia, Oliver procurava sua roupa, dessa vez não passando mais de um minuto para encontrá-la. Kai ficou na cama, observando toda a cena da novamente, reclamando mentalmente de o Florence ter um corpo tão lindo e ter que cobri-lo com tantas peças de roupa.

Era duas da manhã, logo, Kai não tinha nenhuma desculpa para fazê-lo ficar um pouco para conversar mais, já que também não se sentia no direito de pedir algo assim. 

Oliver suspirava, enquanto colocava uma de suas meias no pé, percebendo que o outro par havia sumido.

— Como que minhas meias sempre acabam sumindo? — Oliver riu baixo, tentando localizar no quarto escuro, embora a luz da lua iluminava parcialmente o cômodo. — Suspeito que você esconde elas só para me fazer voltar.

— Eu? Jamais faria uma coisa dessas. — Kai sorriu travesso, visto que fora exatamente o que fez no dia que se conheceram, mas não precisava contar isso para ele. 

Oliver continuou a procurar a meia em silêncio, conseguindo encontrá-la sobre a cama. Após colocar a sua outra meia, suspirou, mas dessa vez um longo suspiro sendo percebido por Kai.

— O que foi? Juro que não escondi seus sapatos. — Brincou, mas vendo que sua fala não tinha surtido efeito em Oliver, seu sorriso murchou. — Aconteceu algo?

O Florence não se sentia usado, afinal, ele também queria estar com Kai sem ter nada a mais que uma boa compatibilidade no sexo. Mas, mesmo que tenha fingindo a si mesmo se convencer que seria o melhor para si nesse pouco tempo que lhe restava nos Estados Unidos, no fundo não podia negar que não era isso que queria. Estava necessitando de um relacionamento duradouro e sério, então desde quando saiu de casa estava disposto a terminar aquilo, mesmo cogitando várias vezes que era por pouco tempo, ele não podia se enganar mais. 

— Sim, eu… — Seu olhar foi para o chão, não conseguia encarar Kai, nem mesmo se quisesse. Respirou fundo antes de continuar. — Eu não devo mais aparecer aqui.

— Hum? — Kai fez uma cara de desentendido. — Aqui na cidade?

— Não. Aqui, no seu apartamento. — Oliver conseguiu levantar o olhar para encarar Kai. — O que eu estou tentando falar é que esse tipo de relacionamento sem rótulos não é o que eu quero. Sei que vai soar bobo e igual a um adolescente iludido, mas eu não quero ser um simples sexo casual. Quero namorar e quem sabe um dia me casar, então quero dar um ponto final nessas nossas noites.

Kai ficou surpreso com as palavras, ainda mais vindo tão de repente. Estava acostumado a receber esse tipo de comentário toda vez que passava da terceira noite com alguém, então sabia bem reagir a isso, sorrindo de uma forma simples e falando as delicadas palavras:

— Bem, foi um prazer lhe conhecer!

Para Kai, Oliver foi apenas mais um que até durou mais que todos os outros. Infelizmente, Oliver achava que era algo a mais, mas com a resposta tão indiferente, enfim caiu a ficha no que tinha se metido desde o primeiro dia que transou com o rapaz.

Oliver riu anasalado e sem dizer mais nada deixou o apartamento de Kai no meio da madrugada, embora aquela pequena cidade estivesse longe de ser a mais perigosa. 

Kai passou a mão pelos cabelos negros, tentando entender o por que de Oliver ter aparentado estar tão chateado, pois foi ele quem disse que queria parar com tudo.

É, só que o pobre Kaihin não sabia era que sentiria uma dor incomodando-o como se estivesse um vazio dentro de si e que não sabia explicar o por que e como ela apareceu ali.

...***...

— Tio Kai, fecha os olhos. — Maeve ordenava e Kaihin obedecia, enquanto a menina de cinco anos passava a sombra do kit de maquiagem para crianças que havia ganhado sobre os olhos dele. 

— Eu vou ficar bonito? — Kaihin entrava sempre em qualquer brincadeira que Maeve inventava.

— Eu não faço milagres. — A menina riu com o próprio comentário, assim como a mãe que começou a gargalhar alto.

— Essa é minha garota! — Foi a vez de Mabel imitar o gesto que Maeve só tinha com o padrinho, com um “toca-aqui” bem na frente da cara de Kaihin.

Os dois  adultos se encontravam sentados no sofá de dois assentos, enquanto a pequena Maeve estava sentada no colo de Kai, revezando entre maquiando-o e vendo o desenho que passava na televisão.

— Mas me conta, como está o menino que você está ficando? — Mabel perguntava sorrindo.

— Primeiro, não estávamos ficando. Segundo, ele não quis mais. — Falou simples como se fosse algo normal, o que de fato era para uma conversa deles. — Ele inclusive falou aquela palavra que eu tenho medo…

— Comprometimento? Namoro? Relacionamento? Casam-

— Rótulos!

— Quase acertei! 

Ela riu. Mabel conhecia Kaihin muito bem e sabia que ele nunca quis ter algum rótulo com alguém a mais que sexo casual, então não ficou surpresa, mas como o conhecia, também sabia que tinha algo muito estranho nele.

— Desembucha, o que aconteceu?

— Do que está falando? Não aconteceu nada. Ele falou que queria um relacionamento duradouro e eu falei que havia sido um prazer conhecê-lo. Só isso! 

Kaihin não estava mentindo, mas talvez omitindo uma informação. Se passou um dia desde que não mandava mensagem para Oliver e não podia esconder de si mesmo que sentia falta de provocá-lo, de conversar com ele e principalmente do beijo viciante que o acastanhado tinha. Bem, ele teria que aprender a conviver agora sem isso.

Mabel sorriu, parecia que ela conseguisse ler os pensamentos dele.

— Saudades não mata, mas dá uma dor… — Mabel falou como quem não quer nada. 

— Eu não estou com saudades dele! — Mentiu na cara dura.

— Você ficou com esse garoto por nove dias.

— Dez, na verdade!

— Esse não é o ponto, idiota!

Mabel quis bater na própria cara, mas preferiu dar um soco fraco no ombro do amigo.

— Estou dizendo que ninguém que passa tanto tempo com a pessoa não acaba sentindo uma falta disso. — Mabel explicou. — Cara, qual foi a pessoa que voltou depois da quarta vez? Ninguém! Além do mais, você contou o seu passado que estava escondido a onze chaves, você inclusive fez um macchiato para ele de café da manhã e mandava mensagem até no horário de trabalho. Sério que você não percebeu isso?

A mulher parecia um pouco mais séria do que o normal. Kaihin não escondia nada dela, então todas essas coisas ele tinha contado e ela foi armazenando-as na memória.

— Isso o que? — Kai revirou os olhos.

— Que você gosta dele, mas tem medo.

— Medo de que?

— Medo de se apaixonar perdidamente e não saber lidar com esses sentimentos.

Mabel foi até um pouco grossa ao falar, mas como uma quase irmã mais velha para Kaihin, ela às vezes precisava falar as coisas que ele queria ouvir e também as coisas que ele precisava ouvir. 

— Eu não quero um relacionamento! 

— Sei disso e você sabe que eu irei te apoiar em qualquer decisão que você tomar, mas também não posso ficar calada enquanto vejo meu melhor amigo perdendo uma grande oportunidade de ser feliz! — Mabel voltou a sorrir simpática. — Dê uma chance, eu tenho certeza que você irá descobrir que pode sim se apaixonar por alguém.

— Bem, se você vai apoiar em todas minhas decisões, apoie a minha decisão de ser solteiro e ficar com quem eu quiser. — Kaihin bufou, deixando Maeve no colo de sua mãe, enquanto ele se levantou do sofá para ir ao seu quarto, batendo a porta com um de força.  

Não estava chateado com o que Mabel falou, pois o que ela falou não era algo para se chatear, apenas relembrar o passado.

Sentando sobre a cama, pegou o porta retrato da mesa de cabeceira, não os de seus pais, mas o que estava com a foto virada para baixo. Não sabia por que continuava com aquela foto ali se nem coragem tinha de olhá-la, mas ao mesmo tempo, não conseguia se desprender do passado.

Um sorriso fraco surgiu nos lábios quando viu uma foto de sua adolescência. Bem, não é como se tivesse passado muitos anos que saiu dessa fase, afinal, só tinha dezenove anos. No entanto, lembrar da sua fase na escola era algo até divertido, mesmo estando longe de ter sido o melhor aluno, com as melhores notas, e as mais diversas frases de depreciação dos seus professores, mas só tinha boas memórias da época de colégio, saindo com seus amigos da época para lugares abandonados, enquanto eles inventavam histórias sobre os tais lugares, brincando serem amaldiçoados e coisas do tipo. Lembra de todas as gargalhadas que teve nessa época, parecia que esses momentos nunca seriam esquecidos.

Na foto estava Mabel que sempre foi a mãe do grupo — antes de virar realmente uma mãe, óbvio — pois como era a mais velha, tinha medo que os três mais novos se metesse em alguma encrenca — coisa que já tinha acontecido, quando eles decidiram pular o muro de uma casa toda destruída, mas descobriram que uma pessoa vivia lá. Também tinha Kaihin, bem mais novo, usando um aparelho dentário e um óculos que não era de grau, mas em sua cabeça ele ficava mais bonito usando–os, embora ele quebrou em três dias depois daquele foto ser tirada. Os outros dois que estavam na foto eram: Isaac Victoria, seus melhores amigos desde quando foi matriculado na escola. Era doido pensar o quão cômica foi a forma que se conheceram e mais doido ainda o quão próximos eles ficaram em tão pouco tempo, parecia até que foram melhores amigos em uma vida passada, pois a conexão deles era sobrenatural.

Não havia nada que eles não fizessem juntos, se Isaac dava ideia de descer ladeira abaixo, Victoria aparecia com um skate, Kai com um carrinho de rolimã e Mabel ficava de olho para que nenhum deles se machucassem, embora acabava descendo junto deles. Eles eram inseparáveis, até que…

— “Eu acho que gosto da Victoria” ah, como eu queria poder nunca ter dito isso. — Kaihin resmungava.

Sim, aos quatorze anos, o Dean teve sua primeira paixão, uma paixão boba de adolescente que todos têm, algo até considerado normal. Pois, depois desse acontecimento, Isaac descobriu e não ficou muito feliz, afinal, ele gostava da menina há muito tempo e tudo isso só fez para que o grupo inseparável, se separassem. Todos os momentos foram colocados em esquecimento, tudo que viveram e fizeram, por causa de uma paixonite de adolescente. Talvez, isso não fosse um grande motivo para Kaihin odiar a ideia de se apaixonar. Porém, pensando mais a fundo nisso, se não se apagasse a ninguém, não teria que viver vários ótimos momentos e depois que a pessoa sumisse, seus sentimentos ainda estariam intactos e não se decepcionaria.

Era uma confusão. Sua cabeça, quanto mais pensava nisso, mais confuso ficava. Afinal, é tão bom estar apaixonado quanto dizem? Ver o mundo cor-de-rosa, sorrir bobo ao ver que o seu amado mandou uma mensagem, ficar observando a pessoa como se ela fosse a coisa mais preciosa do mundo, abraçar a pessoa até renovar todas as energias… na teoria parecia ser algo lindo, mas e se não for mútuo? Se tudo for ilusão? Ninguém era obrigado a retribuir seus sentimentos, sabia disso, mas pensar nisso doía.

— Que merda! — Tacou o porta retrato numa pilha de roupa suja, amortecendo a batida, impedindo-o de quebrar. 

Queria mandar uma mensagem para Oliver naquele momento, perguntar que dia ele estaria livre para “se verem”, ouvir suas histórias de um menino riquinho encantador. Ou simplesmente provocá-lo, vendo ele ficar vermelho e tímido na sua frente.

Mas Oliver tinha tomado essa decisão e deveria respeitá-la.

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Comments

Eu já amei essa Mabel kakakakak

2023-04-08

1

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