Capítulo 2 — Conexões

Ser alguém que mesmo estando na adversidade, ainda encontra um motivo para sorrir, era difícil. No entanto, Kaihin era essa pessoa. Não diria que não era sentimental, mas tudo que já tinha passado o fez ficar distante de ser alguém que confiava fácil ou demonstrava afeto. Até mesmo nas piores dores, conseguia sorrir e fingir que nada aconteceu.

Por isso, se apaixonar estava fora de cogitação. Não era algo que se orgulhasse, até sentia um pouco de inveja de casais como Nicholas e Hannah que pareciam ser muito apaixonados um pelo outro a ponto de fazer de tudo para o outro ficar feliz. 

É, realmente, Kaihin nunca conseguiria se ver nessa situação. Ele era conhecido na cidade como “príncipe de gelo”. Quem deu esse apelido foram as pessoas da sua cidade para dizer que o mesmo não “vale nada” ou então só iria se importar na noite que passarem juntos, sendo que isso não é bem verdade. A questão era que nasceu em uma cidade pacata e monótona, queria se divertir um pouco.

Porém, que raios deu na sua cabeça para ter se aproximado de Oliver, pois não passava um minuto sequer sem abrir seu celular para olhar alguma mensagem que ele mandava ou então para admirar a beleza dele na foto de perfil do aplicativo de mensagens.

A campainha de seu apartamento soou, assustando-o levemente, mas já sabendo de quem se tratava. Não precisava nem sequer abrir a porta, a pessoa do outro lado já tinha a chave.

— Tio Kai. — Uma menina morena de lindos cabelos ondulados do mesmo tom de cor que de Kaihin, ela gritava enquanto entrava no apartamento correndo para os braços do rapaz que a segurou no colo. — Olha só, eu perdi um dente.

Ela falava enquanto apontava para o buraco onde estava faltando um dente. 

— E colocou o dente debaixo do travesseiro como eu ensinei? — Kaihin perguntou enquanto a menina balançava a cabeça para cima e para baixo rapidamente. 

— Sim! Hoje de manhã eu ganhei uma moeda da fada do dente. — Ela falava exibido a moeda, que não valia tanta coisa, mas que para a criança de cinco anos, era a coisa mais incrível do mundo.

— Essa é minha garota! — Kai fez um “toca-aqui” com a criança, que sorriu e fez o gesto bem comum por ambos, já que era algo que eles faziam frequentemente.

Atrás da pequena criança vinha Mabel, a mãe dela. Ela fechava a porta do apartamento atrás de si e suspirava, exausta.

— Eve, vai lá ver televisão enquanto eu converso com o tio Kai. — A mulher falou tomando a criança do colo de Kaihin e a pondo no chão, correndo em direção a sala onde tinha uma pequena televisão, mas se passasse alguns de seus desenhos favoritos, o tamanho da tela era o mínimo de seus problemas. 

— Você está bem? — Kai deu uma rápida olhada para trás vendo Maeve colocando em um canal que passava Bob esponja. 

— Poderia estar melhor. — Ela sorriu. Kaihin talvez não sabia, mas ele tinha aprendido a sorrir mesmo estando desmoronando por Mabel que era expert nisso, só não na frente do rapaz que a conhecia como a palma de sua mão.

— O que houve? Me conta. — Ele cruzou os braços, aquilo não tinha sido uma pergunta e sim, uma ordem.

— Problemas com o banco. Eu pedi um empréstimo e não sei se vou conseguir pagar tudo a tempo. — Ela se lamentava. 

— Por que o empréstimo? 

— Os remédios da Maeve, lembra? São extremamente caros, com meu salário eu não conseguiria pagar tudo. 

O salário da cafeteira era muito baixo. Mabel até entregava currículos para outras lojas, empresas e qualquer lugar que estivesse contratando, mas por causa de seu currículo escasso, não teria nenhum emprego que pagasse mais. 

— Eu já te falei, eu tenho algumas economias, eu posso pagar. — Kaihin disse.

— Claro que não, esse dinheiro é seu. Maeve é minha filha, eu preciso arcar com isso.

— Mas ela é minha afilhada! Eu ficaria mais tranquilo se eu pagasse ao menos isso para ela. — Kaihin acabou levantando um pouco o tom de voz, mas Maeve estava muito concentrada cantando a música de abertura do desenho que nem ligaria para o quê seu padrinho e sua mãe discutiam. 

— Kai, por favor…

— Mabel, você é minha melhor amiga, praticamente minha irmã mais velha. Me deixa fazer pelo menos isso. — Ele quase implorava de joelhos. Mabel revirou os olhos sorrindo, negando com a cabeça logo em seguida. De onde esse menino puxou essa teimosia toda? pensou.

— Tudo bem, mas assim que eu conseguir o dinheiro eu te devolvo. 

— Mas-

— Ok, resolvido então. — Mabel cortou a fala de Kai, pois sabia que ele iria se opor. 

— Bem, eu já disse várias vezes que seria melhor para você vender aquela casa que está caindo aos pedaços e morar aqui comigo. Tem dois quartos, o preço é bom e você não precisaria gastar tanto dinheiro com água, luz e tudo mais. — Kaihin dizia indo para a cozinha que era acoplada com a sala. 

— Deus me livre, quero a Maeve longe das suas p-u-t-a-s. — Soletrou para sua filha não entender, já que ela ainda não sabia juntar as letras para formar uma palavra. Mabel sabia como ele era chamado e como ele levava a vida e nunca o julgou, já que se aquilo o deixava feliz, ela também estava feliz, embora sempre fizesse questão de lembrá-lo de comprar preservativos. — E eu sei que você não vai parar de trazer suas meninas e seus meninos para cá.

— Ah, já que você entrou nesse assunto. Lembra o garoto de ontem da cafeteira? — Kaihin perguntou, não como se fosse difícil de saber, afinal, poucas pessoas iam à cafeteria, ainda mais em um dia de chuva à noite.

— O do macchiato? — A mulher perguntou abrindo a porta da geladeira, pegando uma jarra de água. Kai assentiu. — O que tem ele? 

Kaihin riu. Sério que sua amiga não percebeu o que ele quis dizer com isso? Ela colocava a água da jarra em um copo de vidro, esperando-o responder sua pergunta, até se der conta.

— Você dormiu com ele? — Gritou surpresa, olhando para a sala vendo sua filha ainda entretida com o desenho. — Logo ele? Tinha muita cara de riquinho esnobe.

— Riquinho até vai, mas ele está longe de ser esnobe. — Kai comentou rindo, cruzando os braços. 

— Ok… essa é nova! — A mulher riu enquanto tomava um gole da água. — Você está mesmo defendendo um de seus ficantes de uma noite?

— Não estou defendendo, só fiz um comentário. 

— Lembra da menina que eu falei que parecia a Velma do Scooby Doo? Você riu e concordou e até o contato dela você salvou assim. 

— Isso não tem nada a ver. — Ele riu baixo.

— E daquele menino que falava anasalado e eu o chamei de Perna Longa? — Mabel tomava mais um gole d'água.

— Tá, já entendi. — Kaihin revirou os olhos. — Você fala mal dos meus ficantes e eu concordo sem retrucar. 

— E por que com esse menino é diferente? 

Mabel perguntou já esperando uma resposta rápida, pois sempre que perguntava algo assim Kaihin ria alto e dizia que ela era boba em achar que ele se apaixonaria por uma pessoa depois de só uma noite juntos. No entanto, quase se engasgou quando o seu amigo não respondeu de imediato.

— Nem fodendo… você se apaixonou por ele?

— Tá doida? Claro que não! 

Mabel abria a boca incrédula.

— Kaihin Dean, eu te conheço desde os seus sete anos, você realmente acha que consegue me enganar?

Ela questionava enquanto deixava o copo já vazio sobre a pia, cruzando os braços em seguida. Kaihin riu desacreditado, definitivamente não era paixão, somente uma certa curiosidade sobre aquele menino. 

— Exatamente por me conhecer que você deveria saber que eu não me apaixono. 

— Sempre há uma primeira vez para tudo. — A mulher riu. — Não acredito, meu melhor amigo está apaixonado por um caso de uma noite.

Kaihin negou com a cabeça, não importasse o que tentaria dizer, agora que Mabel estava com isso na cabeça, nem por um decreto que ela conseguiria tirar.

— Já vou encomendar o meu vestido de madrinha e a roupa de daminha da Maeve. — Brincava a mulher indo para sala, sentando-se no sofá de dois assentos, visto que Maeve preferiria ver o desenho sentada no chão. — Mas me conta, o que ele fez para quebrar esse coração de gelo aí? 

— Seguindo nessa sua base hipotética de eu ter me apaixonado… bem, ele tem uma voz legal, é melódica, sabe? Parece que quando fala ele canta uma linda música. Seu jeito é implicante e um pouco tímido, gosto disso e ele é tem um sorriso tão lindo que dá vontade de enquadrar e por na minha cabeceira só para poder ser a primeira coisa a ver antes de dormir e assim que acordar. — Ele falava se sentando ao lado da amiga que abria a boca novamente incrédula. — O que foi?

— Eu não falo nada. — A mulher disse rindo. — Deixa eu pensar como você o seduziu… Olá, meus amigos me chamam de Kai, gostaria de conhecê-lo, amo fazer novas amizades. 

— Já te falei que eu te odeio? 

— Algumas vezes, mas isso eu sei que é mentira.

A mulher se recostou no sofá, fazendo uma cara de vitória, sabendo que tinha vencido Kaihin nos argumentos, afinal, ela era sua melhor e única amiga, não tinha como esconder que ele a amava. Mabel olhou para filha assistindo ao desenho.

— Eve, se prepare para ter que dividir seu amor por seu tio Kai com outra pessoa.

— Hm? — A menina virou a cabeça para trás confusa.

— O tio Kai daqui a pouco vai ter um namoradinho.

— O quê? Não! — Ela se jogou no colo de Kaihin que pegou ela rindo baixo. — O tio Kai é meu!

— Viu, só? Não posso namorar ninguém, eu já tenho minha afilhada. — Kaihin brincou dando língua para Mabel, como se fosse uma criança de cinco anos igual a Maeve.

— Isso que nós vamos ver, Kaihin.

...***...

Oliver jogou o seus livros de estudo no lixo de seu quarto. Afinal, para que tanto se preparava se seus pais iam fazer aquilo com eles? 

“Ficamos com medo de você reprovar no exame de admissão e conseguimos uma vaga para você na faculdade”. Ah, como Oliver sabia o que esse “conseguimos” significava, afinal, sua vida inteira foi feita disso. Se ficou com uma média na escola menor que nove, misteriosamente essa nota aumentava. “Pense no seu futuro” eles diziam, mas tudo que ele conseguia não era por mérito próprio e sim dinheiro. Afinal, dinheiro move o mundo.

Em menos de dois meses partiria para o Reino Unido. Bom, era uma oportunidade de construir sua vida lá, embora gostasse dos Estados Unidos, lá ele poderia ser quem ele é sem medo, já que seus pais não iriam e só os veriam duas vezes no ano — que inclusive foi um dos principais motivos de ter estudado para a prova.

No entanto, não podia negar que não queria ir. Nem era por estar indo para uma universidade que não queria, mas por não querer deixar seu país. Em pensar nisso, parecia um pouco hipócrita da sua parte, pois, não tinha amigos, não tinha um bom relacionamento com os pais, não tinha um namorado ou namorada e no máximo tinha seus avós que via uma vez no mês. Por que raios ele não iria querer ir para a melhor faculdade do mundo e ainda ter a oportunidade de ter uma nova vida? 

O seu celular soou e vibrou em cima de sua escrivaninha, tirando o Florence de seus devaneios. Ele tomou o aparelho, imaginando que fosse algum de seus pais falando que ele poderia comprar qualquer coisa já que ambos não sabiam falar a palavra: desculpa. Surpreendeu-se ao ver que era uma mensagem de Kai, abrindo um sorriso involuntário.

Ele tinha noção que o dia anterior foi só uma noite qualquer e que não devia dar muito caso para isso, porém era inegável o fato que eles tiveram uma conexão tão forte. Seu corpo sentia falta das grandes, quentes e nem um pouco delicadas mãos passando por ele.

Seria um bobo por achar que eles estavam conectados de alguma forma como, por exemplo, almas gêmeas ou pessoas destinadas a se encontrarem? Para quem nunca acreditou em destino, aquilo chegava a ser engraçado em sua cabeça.

A mensagem dizia “Acho que você esqueceu sua meia aqui, acho que você tem que vir aqui em buscar” seguida de uma foto de uma meia toda branca. Oliver riu, digitando em seguida: “Tudo bem, pode ficar com ela”. Não demorou muito para Kai retrucar com uma carinha triste. 

Oliver nunca desejou ser considerado apenas um caso e, aparentemente, era o que seria se continuasse a dar trela para Kai. Como um leitor assíduo de romances românticos e clichês, queria viver um pouco daquilo, mesmo que fosse alguma coisa simples como beijar sobre a chuva. Parecia um pouco idiota, por isso, sempre se lembrava de nunca dizer tal coisa em voz alta.

O celular vibrou com mais uma mensagem de Kai que tinha chegado que dizia “Você esqueceu mais uma coisa aqui” e em seguida uma mais uma foto apareceu no chat que fez Oliver abrir a boca incrédulo. Kai tinha simplesmente mandado foto de seu abdômen definido, o quão pervertido ele era? 

O Florence gargalhava, ainda sem acreditar. Bem, se fosse para viver um romance que nem dos livros, que fosse algum da E. L. James.

“Quando nos encontramos de novo?” 

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