-Guria! Te chamei você não escutou, você está bem?
-Desculpa, estou sim, é só porque... porque eu adoro aquela música! Deixa eu te perguntar, por um acaso você conhece aquela pessoa, a que estava tocando o violão? Perguntou meio receosa com medo de Joaquim entender sua verdadeira intenção.
-A May? Claro! Ela cursa a noite relações internacionais, já está terminando o curso. disse Joaquim tranquilamente sem notar o interesse demasiado.
“Entendi" disse Olívia tentando se recordar de algum encontro anterior. Nunca tinha visto, nem na faculdade nem em outras festas.
-Ela canta muito né? Marcos mora com ela há alguns meses, são do mesmo curso. Disse Joaquim agora percebendo o real interesse da amiga.
- Nunca vi nenhum dos dois. Indagou Olívia.
-Aí amiga, eles costumam ir em festas do povo mais antigo da faculdade. Sei que ela ficou um tempo fora mas não sei direito o babado direito, mas se quiser posso descobrir, o Marcos é amigo dela. Disse Joaquim com um sorriso malicioso em seu rosto.
-Não, não precisa, era só curiosidade mesmo.
Olívia disse rápido sem querer demonstrar muito interesse.
Joaquim a olhou com cara de quem não tinha acreditado.
“Vamos ficar mais um pouquinho e a gente pode ir?” Disse Olívia para o amigo que assentiu com a cabeça.
Joaquim começou a contar sobre seu boy e de como se conheceram na biblioteca, mas mesmo a história sendo engraçada e com riqueza de detalhes a cabeça de Olívia estava distante. Agora sabia que era uma garota, mas suas roupas eram bem masculinas, o que para Olivia a tornava muito atraente. E sua voz era tão bonita que se sentiu naquele velho clichê sapatão. Mas foi a música que ela havia escolhido cantar que foi suficiente para despertar seu interesse. Na verdade, tudo que seu amigo tinha contado, a deixou com mais interesse em descobrir quem ela era realmente.
De vez em quando a olhava na roda de Marcos conversando e tomando alguma coisa. Havia algo e ela podia sentir um frio na barriga que há muito tempo não sentia, como quando descemos em uma montanha russa.
“... Mas daí ele disse que queria me levar pra casa e colocar em ação outras coisinhas, mas eu fui firme amiga, fiz a fina e disse que enquanto ele não se resolver direito com o outro, meu corpinho será preservado.” Disse Joaquim fazendo com que Olívia voltasse pra realidade.
“Fez muito bem, se valorize, mas ele parece ser legal! Joaquim, vamos achar Vitória e ir embora? acho que bebi vinho demais da conta.”
Levantaram e seguiram em direção ao local que haviam visto a amiga pela ultima vez conversando com o tal André. Não a localizaram de primeira, mas depois de andar um pouco mais à margem da festa encontraram-na com André próximo a uma duna de areia, em um amasso forte.
“Vitória! Que bom que encontramos você! Já estamos indo embora, vamos com a gente?” perguntou Olivia cortando o casal.
“Vamos sim” disse ela dando uma pausa nos movimentos, mas ele a puxou para perto e disse alguma coisa em seu ouvido que a fez rir.
“Então... vou ficar mais um pouquinho com o André, a propósito, esses são meus amigos Olívia e Joaquim.”disse Vitória enrolada e apresentando seus amigos.
“Olá, prazer” disse André abrindo um sorriso encantador e cumprimentando os dois. Realmente ele era um cara muito bonito, seus cabelos loiros queimados pelo sol juntamente com seu porte alto e visivelmente escultural com a roupa estilosa davam o ar de perigo mas ao mesmo tempo de segurança. Joaquim já estava babando por ele.
“Tem certeza amiga, vai ficar?” Perguntou em tom preocupada Olívia.
“Sim, logo menos eu vou, moro aqui perto, André me deixa na porta do meu prédio” disse Vitória segura.
“Manda mensagem quando estiver lá, tá bom?" Vitória assentiu com a cabeça e Olívia puxou o amigo antes que ele caísse em cima do boy da amiga.
Já distante Joaquim disse “ Menina, Vitória acertou em cheio, arrasou”
“Ele é muito bonito mesmo, mas algo nele não me agrada, não sei o que é..” Disse pensativa.
“Frescura e inveja sua” disse Joaquim brincando.
“Deve ser...” Pensou Olívia.
Resgataram a bicicleta de ambos e foram em direção ao caminho entre as dunas para o calçadão. Já era umas 2 horas da manhã quando voltavam. O vento forte agora pelo menos soprava a favor deles o que fazia o trajeto ficar bem mais fácil. Inclusive foram brincando em zig zag pela orla vazia com suas bicicletas.
Joaquim então gritou para a amiga. “Guria, já ia me esquecendo, vamos parar ali naquele banquinho por favor!”
Olívia achou estranho e hesitou em parar, mas o amigo já tinha parado e encostava sua bicicleta em um banco. A essa altura da praia, por conta da erosão, havia um pequeno precipício entre o calçadão e a areia. Era possível ouvir e ver o mar em fúria batendo lá em baixo na parte rochosa da encosta. O banco ficava bem ao pé do barranco de frente para o mar.
Sentaram os dois bem juntinhos enquanto Joaquim procurava em seus bolsos alguma coisa. Quando puxou era um espécie de cigarro pequeno bolado em papel bege.
“Achei!” Disse Joaquim mostrando para Olivia entusiasmado.
“Aí guri, só você mesmo! Tomei vinho, será que não vai dar ruim?” perguntou preocupada.
“Já estamos perto da sua casa, se passar mal dá tempo de chegar” e deu uma piscadinha para ela.
Repetiu o mesmo ritual de procura nos bolsos e achou seu isqueiro. Mordeu a ponta tirando o excesso de seda e acendeu o baseado. Começaram a fumar, intercalando as vezes. Joaquim então puxou um assunto.
“Ei, ultimamente tenho te achado distraída e distante, sei que as coisas não foram fáceis com o Raul, mas já faz mais de um ano e você precisa reagir”
“Eu sei Joaquim, mas fiquei muito tempo com a mesma pessoa, acabei me perdendo de mim, achar essa Olívia independente depois de tanto tempo é tão difícil, nem sei realmente se ela já existiu na verdade. Às vezes parece que eu não sei quem eu sou mais e nem o que eu quero ser.”
“Entendo”. Disse Joaquim puxando um trago e soltando lentamente. “Mas se você nunca tentar se abrir você nunca vai conseguir”. Joaquim disse em tom de conselho.
“Eu sei, tenho uma certa inveja de você nesse sentido, você é tão livre!”disse Olivia sorrindo para ele, realmente o admirava por isso.
“Teve e tem um preço, mas sou feliz.” Disse Joaquim dessa vez olhando nos olhos da amiga. “Talvez você precise de alguma oportunidade pra se soltar, vou arranjar alguma coisa pra você” Disse agora em um tom mais entusiasmado.
“Não sou das suas cachorradas Joaquim, olha lá hein” disse Olivia rindo.
Ele começou a dar risada e disse “ É porque você nunca experimentou as minha cachorradas”.
Eles riram alto e perceberam que já tinham fumado o suficiente. Pegaram suas bicicletas e pedalaram pela orla por mais um quarteirão até virarem à direita em uma rua comprida. Sua casa ficava em um pequeno condomínio de 12 casas há 2 quarteirões da praia.
Olívia perguntou se o amigo não queria dormir lá, mas ele recusou, sua casa era relativamente próxima. Pediu para mandar mensagem quando chegasse, ele deu um beijo em sua bochecha e piscou para ela. Já em cima de sua bicicleta gritou “Vou comer lasanha!”
A amiga riu e entrou pelo portão.
Abrindo a porta de sua casa, jogou sua bolsa, o cachecol e a touca no sofá próximo a entrada. Escutou patinhas se aproximando e sua cachorrinha Meg veio recebê-la ainda meio sonolenta. Fez carinho na doguinha e a pegou no colo. Meg era uma vira-lata de porte pequeno, com o corpinho gordo e malhado de preto e branco, tinha resgatado ela em um dia de chuva e frio na rua da sua casa.
Foi até o armário da cozinha e pegou uma barra de chocolate dirigindo-se ao seu quarto. Colocou o chocolate no móvel lateral e sua cachorrinha na cama onde aparentemente ela já estava a noite inteira. Trocou a calça jeans por uma de flanela e as blusas pesadas por um moletom antigo e manchado. Correu para sala novamente e pegou seu celular de dentro da bolsa. Deitou na cama e abriu a barra de chocolate, pegando a primeira fileira inteira. Enquanto uma mão segurava a barra a outra segurava o celular com os dedos mexendo rapidamente pela sua tela. Ela sabia o que procurava e digitou as únicas três letras que se passaram pela sua cabeça em suas redes sociais. M-A-Y.
Apareceram alguns usuários em sua pesquisa, mas um em especial chamou a atenção. Era a foto de um sorriso com as aspas entre a boca e as bochechas. Sabia que a havia encontrado. Agora era ela quem estava sorrindo. Mordeu o lábio inferior e clicou em seu perfil. As fotos eram tão enigmáticas quanto ela esperava. Mas já conseguia visualizar seu rosto mais nítidamente. A maioria eram apenas dela, com um pug pretinho, “Você ia gostar dele Meg”, disse para sua cachorra que estava enroladinha próxima a ela. Desceu mais em seu perfil e encontrou fotos com alguns amigos, mas poucas. Uma mais antiga chamou sua atenção. Era a foto de seu rosto com as mãos de uma pessoa tapando seus olhos e a legenda dizia “A melhor surpresa”. Ela checou mas não havia comentários ou marcações na foto datada de muitas semanas atrás. Ficou com vontade de adicioná-la mas se conteve. A essa altura ela nem sabia aonde queria chegar, mas pegou outra fileira de chocolate, fechou seu celular e virou para cima na escuridão da noite. As ondas do mar chegavam até seus ouvidos e o ronco de Meg era alto mas fofo.
Virou para o lado e suspirou com um leve sorriso no rosto. O som do violão não saiu de sua cabeça. A voz de May cantava em sua mente, doce mas forte. Dormiu enfim ao som do mar, do violão e do ronco de Meg.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 55
Comments