4. O Encontro de Dois Mundos

Ágatha

Depois de revisar os últimos relatórios do dia, envio tudo por e-mail ao meu chefe. Com a correria da rotina, cada segundo é precioso. Aproveito a hora do almoço para ir para casa. Minha pequena Maddie espera ansiosa, como se fosse o melhor momento do mundo — e talvez seja mesmo. Almoçamos juntas, ela fala animada sobre a aula de balé da manhã. Sua vozinha me acalma, me ancora.

Volto para a empresa com o coração leve, mesmo que meu trabalho não me traga prazer. Ser subgerente de análise na Construtora Montana me garante estabilidade, mas a verdade é que detesto a monotonia dos números, planilhas e metas irreais.

Hoje, concluo o planejamento para um novo projeto e encaminho para a diretoria. Nunca conheci o CEO pessoalmente. Apenas ouço seu nome pelos corredores: Cristian Montana, o poderoso chefão da construtora. Falam que o filho dele assumirá em breve — Dante Montana, se não me engano. Nunca o vi. E sinceramente, nem me interesso. Homens ricos demais sempre escondem algo sombrio por trás dos ternos impecáveis.

Meu expediente termina às 16h. Corro para casa — literalmente. Preciso chegar a tempo da aula com minha personal trainer. Treinar em casa é minha única opção. Assim, consigo ficar perto de Maddie. Ela adora imitar meus movimentos, e às vezes faz flexões com as pernas abertas dizendo que é "dança ninja de mãe".

Após os exercícios, tomo um banho, deixo Maddie deitada comigo por alguns minutos. Ela acaricia meus cabelos enquanto cochilo. Acordo assustada com o alarme. São 20h. Hora de fazer a janta dela. Comemos juntas e brinco um pouco, até que Dely, sua cuidadora, chega. Confio muito nela. É uma das poucas pessoas que conhecem minha vida dupla e guardam segredo.

Beijo Maddie várias vezes, como se o meu amor pudesse protegê-la enquanto estou fora. Visto a fantasia, retoco a maquiagem, coloco a máscara... e viro Angel.

Essa semana passou voando. Levei Maddie às sessões de quimioterapia, e os médicos disseram que ela está reagindo bem. Semana que vem, fará novos exames. Meu coração aperta, mas me recuso a pensar no pior.

Hoje é sábado, dia de balé. E como prometido, a levei para comer hambúrguer depois da aula. Passeamos pela cidade, compramos um brinquedo novo e rimos muito. São esses momentos que me fazem aguentar tudo — inclusive os olhares nojentos e propostas indecentes que recebo à noite.

Mas hoje... algo será diferente.

Dante Montana

Sou Dante Montana, filho do CEO da construtora. E hoje estou tentando convencer meu primo Gael de que não vou à maldita despedida de solteiro que ele organizou para o nosso outro primo, Adam.

— Cara, eu não curto esses lugares. Mulheres vendendo o corpo? Isso me dá asco — digo, já cansado da insistência.

Gael revira os olhos, como sempre.

— É a última noite do Adam solteiro! Precisamos dar a ele uma despedida memorável.

Nesse momento, Adam entra com David e Eric. São todos próximos, crescemos juntos.

— O que tem meu nome aí? — pergunta Adam, já desconfiado.

— Gael quer fazer sua despedida de solteiro num clube — explico.

— Eu topo! — diz David, sempre o primeiro a entrar em confusões.

— Também tô dentro — acrescenta Eric.

Gael vibra como um adolescente.

— Esse clube é o melhor da cidade. Mulheres lindas, danças provocantes. Tem uma que é chamada de Angel. Dizem que é um espetáculo.

— Emma não vai gostar disso... — resmunga Adam, claramente dividido.

— Eu dou um perdido na minha irmãzinha — diz Eric, referindo-se a Emma.

Respiro fundo. Esses caras enlouquecem só de ver uma saia curta. Adam ainda tenta argumentar, mas no fim, aceita — com a promessa de apenas olhar, nada mais.

Decidido. Vamos ao clube.

Gael, Adam e eu somos primos. Nossos pais são irmãos. Eric é irmão da Emma, a noiva do Adam, e David é nosso amigo de infância e sócio na empresa. Mia, sua esposa, não tem falado com ele nos últimos dias. Discussões, ciúmes... o de sempre.

Quando chegamos, o ambiente é tudo que eu odeio: música alta, cheiro de perfume barato e mulheres penduradas em varas de ferro como se fossem acrobatas exóticas. Algumas dançam nos palcos. Outras circulam entre os homens com bandejas de bebida e sorrisos falsos.

— Estou no paraíso! — diz Eric, encantado.

— Eu te disse! — vibra Gael. — Vamos pra área VIP. Depois a gente reserva uma sala privada.

Revirando os olhos, sigo com eles. Não entendo como conseguem achar prazer nisso. Não vejo beleza em mulheres sendo tratadas como mercadoria.

Uma funcionária nos recebe, explica as regras. “Não é permitido tocar nas meninas, exceto com o consentimento delas.” Como se isso fosse suficiente para evitar a humilhação embutida nesse tipo de ambiente.

Sentamos. A primeira dançarina entra. Quase nua, faz alguns passos exagerados. Nada de mais.

Adam se contorce na cadeira.

— Se Emma souber disso, eu tô morto.

— Relaxa — diz Gael. — Aproveita. É a última noite antes da coleira.

Eles riem. Eu apenas observo em silêncio.

As luzes se apagam.

E então... ela entra.

A música muda. O ritmo se arrasta. E os olhos da sala se voltam para o palco.

Ela caminha como se soubesse que o mundo gira ao seu redor. Tem uma presença que paralisa. Cada curva do corpo parece esculpida com precisão. Seus movimentos são controlados, sensuais sem serem vulgares. Uma dança elegante, envolvente... viciante.

Ela está de máscara.

Mas seus olhos brilham como se escondessem todos os segredos do mundo.

— Caralho... que mulher — sussurra David, boquiaberto.

— Não mentiram — confirma Gael. — Essa é a Angel.

— Tô vendo um anjo ou um demônio? — pergunta Eric. — Quero ela.

Adam assiste hipnotizado, mas sem segundas intenções. Ele é fiel à Emma. Isso é claro.

— E aí, Dante? O que achou? — provoca Gael.

Não consigo responder. Algo naquela mulher me prende. É como se já a conhecesse. Como se, de alguma forma, ela fizesse parte de um lugar dentro de mim que eu nem sabia que existia.

Ela não parece pertencer àquele lugar.

Ela é diferente.

É... especial.

E por algum motivo que não entendo, sei que ela também notou a minha presença.

E talvez isso mude tudo.

Continua...

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