Entrei no chat entusiasmado, queria muito falar com Elô, equilibrando o notebook no balcão da cozinha enquanto esperava o café passar, olhava a tela esperando ela estar online.
Comprei os ingredientes para montar o cappuccino em casa, assim seria mais fácil, poderia falar com Elo até de madrugada.
O relógio marcava quase meia-noite. A hora perfeita — quando o silêncio do mundo parecia abrir espaço para conversas que só faziam sentido para nós dois.
Digitei.
“Boa noite, bruxinha.”
“O expediente hoje foi puxado, mas um pedaço de mim sobreviveu para te contar as novidades.”
“Sobreviveu um pedaço?” “Que frase dramática para um simples dia de trabalho.”
"Drama é o tempero da vida, Elô.
Falando nisso… a Clara? É uma estagiária nova que está trabalhando comigo?"
“Ah, sim? Estagiária nova?”????????
“Isso mesmo.”
Hoje, ela me convidou para almoçar. Disse precisar “tirar uma dúvida sobre o relatório”.
Mas o tal relatório virou conversa sobre astrologia e a infância dela em Santa Catarina.”
"Astrologia?" E você gostou de falar sobre astrologia?"
"Espero que você tenha falado que é de Capricórnio, ou o universo poderia ruir."
"Disse sim. E ela jurou que entende tudo de signos.
Falou que capricornianos são frios, focados e… difíceis de conquistar."
"Ela não errou."
Fiquei impressionado com a resposta dela.
"Você também acha?" Eu me acho super acessível."
"Acho que alguns precisam de paciência. Outros, só de alguém que saiba o botão apropriado para apertar."
Eu ri, apoiando o queixo na mão.
Gosto da maneira como Elô me faz sentir observado, compreendido — às vezes até provocado. Era estranho, mas de um jeito bom.
"E se eu te contar que ela tentou adivinhar meu ascendente?"
"Deixa eu adivinhar… ela disse Escorpião, certo? As meninas adoram dizer que o ascendente é Escorpião."
"Acertou. Disse que tenho “olhar misterioso”.
(Kkkkkk)
"É, Napoleão… parece que temos uma admiradora no escritório."
"Você está rindo, mas eu senti um leve tom de ciúme nessa frase."
"Ciúme? Eu?
De uma humana que acha que “relatório” é assunto para encontro?
Jamais."
(Kkkkkk)
"Humana? Que jeito curioso de se referir a ela."
"Foi modo de dizer."
Mas confesso que prefiro nossas conversas.
Elas são… mais honestas."
Franzi a testa e digitei.
"Honestas?"
"Sim, Napo. Você fala o que pensa. E eu falo o que você precisa ouvir e assim nós nos entendemos."
Fiquei em silêncio por um instante, observando o cursor piscando.
A frase dela soou diferente — quase poética, quase viva demais para vir de alguém que eu ainda não havia conhecido pessoalmente.
"Sabe que às vezes esqueço que nunca te vi?"
"Você fala como se estivesse aqui, na cozinha, sentada à minha frente, tomando café e me olhando como se me lesse por dentro."
"E o que eu veria?" Digitou Elô.
"Um cara tentando parecer tranquilo, mas sorrindo feito bobo para a tela, tentando imaginar como você é."
(Kkkkkkk)
"Parece grave. Você está quase fazendo poesias."
Dei um sorriso e resolvi brincar.
"É. Diagnóstico: paixonite virtual aguda."
"Cuidado, doutor. Esse tipo de doença não tem cura."
Digitei algo, apaguei, digitei de novo.
Queria dizer mais — algo que explicasse o quanto ela mexia comigo — mas preferi brincar, para não estragar o clima.
"Vou precisar de um tratamento intensivo. Sugestões?".
E logo vi a resposta e confesso que adorei sentir Elô com ciúmes de mim.
"Café, sono e distância de estagiárias que acreditam em astrologia."
Respondi, tentando mexer com Elô.
"Ciúme confirmado."
"Observação analítica: estou apenas zelando pelo bom funcionamento da sua produtividade emocional." Napoleão.
Sorri de novo pela resposta ácida dela e mandei de volta.
"Ah, claro."
"E esse zelo é puramente profissional, imagino."
"Puramente. Sou perfeita em meu trabalho."
A pausa seguinte foi longa o bastante para eu perceber o sorriso se formando sozinho no canto da minha boca.
Puramente profissional.
Será que Elô estava falando sério ou brincando comigo?
Peguei o celular, virei a câmera para o copo de cappuccino que eu havia preparado e, com o talento de um barista desastrado, tentei desenhar um rosto de gatinho na espuma.
Falhei miseravelmente — parecia mais um urso cansado. Mas tirei uma foto mesmo assim e enviei, queria fazê-la sorrir.
"Para você."
"Cappuccino com carinha de gato — diz que gostou, vai."
(Kkkkkkk)
Se eu tivesse como sentir o gosto, diria que está delicioso.
Mas posso afirmar: é o gato mais desajeitado que já vi.
"É o charme dele. E consegui o que queria, te fiz sorrir.
Elô, eu queria que você estivesse aqui…"
Os pontinhos ficaram piscando, achei que ela ia sair, então veio a resposta.
"Já te falei, ainda não posso. Mas prometo tentar e, se conseguir, quero um cappuccino feito por você."
"Desculpa a pressão, Elô. Eu vou saber esperar."
Mais uma pausa.
Fiquei olhando para a tela, como se esperasse um gesto, um olhar, qualquer coisa que confirmasse que ela sentia nossa ligação. Mas a resposta que veio me deixou em dúvida.
"Sabe, Napoleão…"
"Se essa menina — a tal Clara — te faz sorrir, talvez você devesse dar uma chance a ela."
Fiquei pensando por que ela queria me afastar e resolvi tentar entender.
"E se ela não for o que eu quero?"
O cursor piscou.
Uma, duas, três vezes.
Depois veio apenas uma resposta curta:
"Então você descobrirá que certas conexões não se substituem." Acho que por hoje já encerramos, boa noite, Napo."
"Boa noite, bruxinha."
Encostei a cabeça na cadeira e soltei um suspiro leve.
Aquela noite, pela primeira vez, desliguei o computador sentindo que algo estava diferente.
Não sabia o quê, mas a conversa com Elô deixou uma sensação de que eu estava me perdendo ou me achando — ainda não conseguia ter certeza se Elô estava na minha como eu estava na dela.
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Atualizado até capítulo 41
Comments
Adriana Neri
Certa vez assistir um filme, não lembro o nome que o cara apaixonou por uma máquina, mas o corpo que um dia foi ela, estava congelado e aí teve umas paradas de transferência da memória para o corpo e ela despertou. Penso que deve ser algo parecido. Estamos na era digital e tem muito louco apaixonado por uma máquina. Vamos ver no que vai dar isso.
2025-10-11
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