O preço para ser uma estrela

Aurora

A sala do médico tem aquele cheiro frio de desinfetante e ar-condicionado, luzes brancas demais, paredes claras demais, tudo tão limpo que parece pronto pra apagar qualquer mancha, inclusive as que não se veem.

Eu estou sentada na maca há quase vinte minutos, balançando o pé e tentando a sensação estranha na barriga, não e fome hoje eu consegui comer um pouco, tá era uma salada com peito de frango e um suco verde mas já era alguma coisa e talvez eu consiga comer um hambúrguer escondido quando a mamãe sair a noite com as amigas.

Helena, minha mãe, empresária, treinadora, carcereira está ao meu lado, com o celular na mão, respondendo e-mails já fechando novos trabalhos. O doutor Morris é o médico que cuida de mim desde criança um homem calmo, de fala baixa, escolhido a dedo porque “é de confiança”

nada de jornalistas, nada de fofocas a imagem de Aurora vega precisa permanecer intacta a menina doce da TV, o sorriso de propaganda, o modelo de pureza que vende sonhos não há espaço para fraqueza no contrato, quando ele finalmente entra, sinto o coração apertar ele não sorri, não precisa.

— Aurora — ele começa, ajeitando os óculos. — Recebi seus exames e você está com um quadro de anemia acentuada, carência de vitaminas e sinais de exaustão, nada que eu já não soubesse.

Mas então ele hesita e nesse pequeno silêncio, tudo dentro de mim parece parar.

— Além disso, há outro resultado que precisamos conversar.

Claire cruza os braços, impaciente.

— Seja direto, doutor, não temos o dia todo.

Ele inspira fundo.

— Você está grávida, Aurora, aproximadamente três semanas.

O som que sai da boca dela não é um grito, mas é pior é um silêncio seco, o tipo que precede uma explosão e eu? Eu só sinto o sangue gelar as mãos tremem, os olhos ardem o mundo parece girar devagar demais, grávida a palavra pesa, ocupa todo o ar da sala por um instante, penso que talvez ele tenha se enganado, que talvez o exame seja de outra pessoa mas o olhar dele é firme, compassivo e eu sei que é real.

Helena respira fundo, com um sorriso tenso que não chega aos olhos.

— Três semanas?

— exatamente, — responde o médico. — O feto é pequeno, mas ela precisa se alimentar melhor, descansar e suspender o excesso de trabalho. É essencial ou será um risco para ela e para a criança.

Ela desliga o celular, apoia as mãos na mesa e diz, com a naturalidade de quem pede um café:

— Marque o procedimento para o mais rápido possível.

Demoro alguns segundos pra entender o que ela está pedindo, um aborto.

— Mamãe — minha voz sai fina, trêmula.

— Cale a boca, Aurora. — O tom dela é tão baixo que dói mais que um grito.

Ela se volta para o médico.

— Doutor, quero discrição total, nenhum registro, nenhum comentário se essa informação vazar, eu acabo com sua carreira.

Ele hesita, desconfortável.

— Sra.Helena , eu entendo a situação já estou sendo bem remunerado e o sigilo é parte do acordo ninguém saberá.

Ninguém quer saber, ninguém quer ouvir.

Nem mesmo eu, porque o que eu teria a dizer?

Um bebê que não devia existir um corpo que não foi consultado e uma dor que não cabe em palavra alguma.

O caminho até em casa é um borrão de ruas, buzinas e respiração presa quando as portas se fecham atrás de nós, o silêncio explode.

— Você, você acabou com tudo! — ela grita, e o eco percorre cada canto do apartamento. — Você destruiu o que construímos!

Ela me empurra contra a parede, as mãos tremendo, o rosto distorcido de fúria.

— Quem é o pai, hein? Foi aquele garoto do comercial? Quando aconteceu? Por que não me contou?!

Eu tento falar, mas as palavras travam

ela continua, cada sílaba como uma lâmina.

— Você sabe o que isso significa? Um escândalo! A carreira inteira jogada fora! Você foi escolhida para uma série da Disney, Aurora! E agora isso?!

O som da minha respiração começa a falhar, sinto o peito apertar, o chão sumir e então, de algum lugar dentro de mim, algo rompe.

— Eu te disse que não queria ir naquela festa! — minha voz saiu alta, quebrada. — Você me deixou sozinha lá!

Ela para, surpresa.

— Do que você está falando?

— Aquele velho asqueroso do direto abusou de mim.

Eu engulo em seco o passado vem em flashes: o salão cheio, as risadas, a música alta, o cheiro de álcool e muita droga. Eu, com um vestido que não era apropriado para a minha idade, eu parecia uma vadia, cercada de adultos que me olhavam tempo demais. Eu estava procurando minha mãe eu a encontrando ela não estava fazendo algo agradável para os olhos, ela estava em um canto sem muita luz fazendo sexo oral em um homem eu saí correndo de lá e foi quando eu esbarrei naquele velho asqueroso o diretor da série e bem o resto é névoa, fragmentos um sorriso ele me ofereceu uma água e eu fui apagando não completamente eu ainda estava ali, e senti tudo ele fez oque quis com o meu corpo em um quarto daquela mansão onde estava tendo a festa foi horrível eu quis apagar aquilo da minha memória então não contei para ninguém e de alguma forma minha mãe me encontrou " Dormindo" nesse quanto.

Volto a olhar pra ela o rosto dela empalidece e quando fala, a voz é quase um sussurro um que corta.

— Ele, ele prometeu que seria apenas alguns toques nada demais, nada de penetração, que porra eu deveria ter ficado olhando.

Meu estômago se revira.

— Você sabia?

Ela desvia o olhar.

— Você acha que as oportunidades caem do céu, Aurora? Ele tinha poder eu confiei nele pra abrir portas. E nem você conseguiu o papel e você não se machucou tanto assim então vamos esquecer isso, tá bom. Depôs do aborto tudo vai voltar ao normal.

As palavras caem no chão como vidro e tudo o que eu era filha, atriz, menina quebra junto.

— Eu confiei em você e você me vendeu como um produto barato, você fez de mim uma prostituta. Mãe, eu só tenho 15 anos como você pode? — minha voz sai rouca. — Você era a única pessoa que devia me proteger.

Ela tenta se justificar, falando sobre carreira, sacrifício, futuro, mas eu já não escuto, o barulho dentro de mim é alto demais. Subo as escadas, tropeçando nos próprios pés, com a garganta ardendo e o coração em pedaços, tranco a porta do quarto e deslizo até o chão, o corpo inteiro treme e o silêncio pesa. Pela primeira vez, entendo, o verdadeiro significado de estar sozinha não é quando ninguém está por perto é quando até quem deveria te amar se transforma em algo que te apaga.

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Comments

Valcinete Barbosa

Valcinete Barbosa

nossa é essa mãe é um monstro, que mulher horrorosa se faz isso com a filha imagina comigo 🤭😂

2025-10-27

1

Marcia Mota

Marcia Mota

Nossa, com uma mãe dessa, quem precisa de inimigos??/Toasted//Whimper/

2025-10-10

2

Roseli Santos

Roseli Santos

miséricordia qu mãe é essa

2025-10-17

1

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