3 Entre a vida e a Morte

O som da porta batendo com força me despertou de um sono leve e inquieto. Saltei da cama antes de entender onde estava. Aldo entrou, a expressão dura, a voz grave e urgente.

— Dottoressa, rápido. O Don está em colapso.

O coração disparou. Peguei o jaleco que estava dobrado na poltrona e corri atrás dele pelos corredores silenciosos. O ar gelado da madrugada entrava pelas frestas, fazendo a casa parecer um labirinto vivo. As luzes de emergência criavam sombras compridas, como se a mansão respirasse junto a nós.

Quando chegamos ao quarto, a cena fez o estômago se revirar. Adrian Lazzaro estava pálido como cera, o corpo imóvel sobre os lençóis brancos agora manchados de um vermelho escuro. O monitor improvisado apitava de forma irregular , a linha no visor ameaçava se tornar um traço contínuo.

— Ele parou de respirar — avisou Rocco, o homem do rosário, com a voz trêmula.

— Me dê espaço! — ordenei, jogando a coberta para o lado.

Avaliei rápido pulso fraco, respiração ausente, suor frio. O coração dele estava falhando. Sem pensar, subi na cama para alcançar melhor o tórax e iniciei compressões firmes, contando em voz baixa para manter o ritmo.

— Rocco, prepare a bolsa de oxigênio. Aldo, me traga a adrenalina do kit de emergência!

Minhas mãos afundavam no peito dele a cada compressão. O som seco das costelas me lembrava da fragilidade humana, mesmo de um homem tão temido. A mente focava no básico trinta compressões, duas ventilações. Repetir. Manter o fluxo.

Aldo voltou com a seringa de adrenalina. Peguei sem interromper o movimento.

— 1 miligrama, intramuscular — disse, aplicando com precisão.

Continuei o processo, ignorando a dor que subia pelos braços. O suor escorria pela minha testa, o coração disparado como se quisesse acompanhar o dele. Por um instante, o monitor soltou um apito contínuo. Respirei fundo, mantendo o ritmo, recusando-me a aceitar a linha reta.

— Vamos, Adrian, não morra agora — murmurei, quase sem perceber.

De repente, um espasmo percorreu o corpo dele. O monitor soltou um bip irregular, depois outro, e mais um, formando um padrão frágil, mas vivo. Inclinei-me para ouvir um batimento fraco, mas presente. Continuei por mais alguns segundos, até sentir o peito dele se mover por conta própria.

— Temos pulso — confirmei, a voz rouca.

Rocco suspirou, o rosário tremendo em sua mão. Aldo apenas observava, atento a cada gesto.

— Precisamos manter a pressão estável — continuei. — Preparem soro fisiológico com dopamina, vamos monitorar de quinze em quinze minutos.

Enquanto ajustava o oxímetro, senti as pernas fraquejarem. A descarga de adrenalina que me mantinha em pé começou a ceder. Ajustei o travesseiro sob a cabeça dele, chequei a respiração mais uma vez e me deixei cair ao lado da cama, o corpo inteiro pulsando de cansaço.

A visão girava levemente, mas consegui ver quando Aldo se aproximou. Ele não sorriu, mas seus olhos escuros transmitiam algo próximo de respeito.

— Fez um trabalho impecável, dottoressa — disse, a voz firme. — Salvou a vida do Don outra vez.

Respirei fundo, tentando controlar o tremor nas mãos.

— Ele não está fora de perigo — respondi. — Mas, por enquanto, vive.

Aldo assentiu. Rocco se ajoelhou do outro lado da cama, sussurrando uma prece rápida em italiano.

— Vamos reforçar a segurança — afirmou Aldo. — Ninguém entra ou sai sem a minha ordem.

Assenti, ainda sentada no chão, encostada na lateral da cama. O suor frio grudava o tecido do jaleco na pele, e meus músculos gritavam de dor. Olhei para Adrian. O peito dele subia e descia de maneira mais regular, um som frágil, porém constante.

— Preciso de água — murmurei.

Aldo se moveu sem hesitar. Em segundos, colocou uma garrafa em minhas mãos. Bebi devagar, sentindo a garganta recuperar um pouco de vida.

— Descansar não é uma opção agora — avisei, voltando a olhar para o paciente. — Quero checar os sinais a cada cinco minutos até estabilizar.

— Já organizei um revezamento — disse Aldo. — Mas não se force além do limite. O Don vai precisar de você lúcida.

A forma como ele falava, calma e direta, me fez notar que Aldo não era apenas segurança. Era o tipo de homem que carregava o peso de cada decisão. Havia algo sólido em sua presença que, por um momento, afastou o pânico.

— Obrigada — sussurrei.

— Não me agradeça. Você fez o que ninguém mais conseguiria. — Ele se inclinou levemente. — E isso, dottoressa, não passa despercebido.

Fiquei em silêncio. O quarto cheirava a desinfetante e sangue. O monitor continuava seu bip irregular, cada som uma pequena vitória. As primeiras luzes da manhã começavam a atravessar as cortinas, pintando a parede de um cinza suave.

Encostei a cabeça na lateral da cama, finalmente permitindo que o corpo relaxasse. Aldo permaneceu de pé, vigilante, como se pudesse afastar qualquer ameaça apenas com a presença. Antes que o cansaço me vencesse, ouvi sua voz baixa, quase um elogio.

— Parabéns, Elena. Você salvou o Don. De novo.

Fechei os olhos, exausta. Pela segunda vez em poucas horas, eu havia trazido um homem de volta da beira da morte. E, pela primeira vez, percebi que cada respiração dele me prendia ainda mais a aquele lugar e a um mundo do qual eu talvez não pudesse sair.

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Comments

Veranice Zimmer Ferst

Veranice Zimmer Ferst

Que pena que não tem fotos dos personagens ainda???
Assim a gente não consigo imaginar como eles são muito???

2025-10-10

2

bete 💗

bete 💗

foi exaustivo ela conseguiu demais ❤️❤️❤️❤️❤️

2025-10-11

2

Fátima Lima

Fátima Lima

que bom que ela conseguiu salvar ele 👏

2025-10-13

1

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