Capítulo 3: A Primeira Semente

A visita de Pedro ao café ecoou na mente de Mariana pelos dias seguintes. Era um sussurro constante, uma melodia suave que contrastava com o ruído habitual de seus pensamentos. Ela se pegava olhando para a porta na expectativa de vê-lo entrar novamente, um hábito que a irritava e a excitava ao mesmo tempo. A admiração dele havia plantado uma semente minúscula e teimosa em seu coração, uma semente de possibilidade que ela tentava, em vão, ignorar.

Pedro, por sua vez, deixou o café com uma estranha leveza no peito. A conversa com Mariana havia sido como encontrar água fresca após uma longa caminhada no deserto de sua própria rotina. Ele não estava buscando nada, a vida o havia ensinado a não esperar. Mas ali estava ela: uma mulher forte, inteligente e profundamente atraente, cuja luz não era ofuscada pelas sombras do passado.

Na sexta-feira, ele não resistiu. Enviou uma mensagem simples.

Pedro: O documentário sobre as aves do Pantanal passa no Canal Natureza hoje às 21h. Pensei em você.

Mariana leu a mensagem no celular, seu coração acelerou. Foi uma mensagem casual, mas íntima. Ele havia lembrado. Ela passou alguns minutos debatendo consigo mesma antes de responder.

Mariana: Obrigada pelo aviso! Vou tentar assistir.

A resposta dele veio rapidamente.

Pedro: Se assistir, me conta o que achou. Estou curioso para saber sua opinião.

Naquela noite, Mariana ligou a TV. Sentou-se no sofá, com uma xícara de chá, e assistiu ao documentário. As imagens eram deslumbrantes, mas sua mente divagava. Ela se imaginava comentando os detalhes com Pedro, rindo da narração solene do locutor. Era um sentimento estranho, compartilhar algo assim, mesmo que virtualmente, com um homem.

No final, ela enviou uma mensagem.

Mariana: As cenas dos tuiuiús em voo são lindas. Mas a parte sobre os hábitos noturnos da arara-azul foi a mais interessante.

A resposta de Pedro demorou alguns minutos.

Pedro: Concordo. A arara-azul roubou o show. E a narração, não acha um pouco dramática demais?

Ela riu sozinha no sofá.

Mariana: Muito! Parecia um novela das oito.

Foi o início. As mensagens se tornaram um hábito diário. Eles não falavam apenas sobre documentários. Pedro mandava fotos de um prédio com uma arquitetura interessante que vira no centro, perguntava sua opinião sobre um artigo de jornal que lia. Mariana compartilhava os sucessos e fracassos do dia no café – o bolo de laranja que não cresceu como o esperado, o elogio de um cliente famoso. Era uma dança de aproximação lenta e cuidadosa.

Cerca de dez dias após a primeira visita dele, Pedro apareceu novamente no café. Desta vez, não era hora da tarde. Era quase no fechamento, e o lugar estava vazio.

— Boa noite — ele cumprimentou, seu sorriso um pouco cansado, mas genuíno.

— Boa noite, Pedro. Tudo bem? — Mariana perguntou, surpresa com a hora.

— Dia longo de reuniões — ele explicou, esfregando a nuca. — Pensei em passar aqui para pegar um café para viagem. E talvez… um pedaço daquele bolo de limão para animar o final do dia.

— Claro — ela disse, começando a preparar o pedido.

Enquanto a máquina trabalhava, ele se apoiou no balcão. — E aí, como está o ajuste? A casa ainda muito quieta?

Mariana suspirou. — Ainda. Mas… estou me acostumando. A Cecília me manda fotos da lua de mel toda hora, o que ajuda.

— Ela merece toda a felicidade — Pedro comentou. — E você também.

Ela olhou para ele, e o cansaço em seus olhos era misturado com uma doçura que a comoveu.

— O seu café — ela disse, entregando o copo térmico. — E o bolo. Na verdade, leva dois. Um é por minha conta. Um homem crescido precisa de mais do que uma fatia para aguentar o resto da noite.

Pedro riu, um som baixo e agradável. — Você é muito gentil, Mariana. Obrigado.

— De nada — ela respondeu, sentindo um calor tolo no rosto.

Ele pegou a sacola e ficou parado por um momento, como se hesitasse.

— Ouça — ele começou, seu tom mais sério. — Eu sei que isso pode parecer… inesperado. E eu respeito totalmente o seu espaço. Mas eu gosto da sua companhia. Gosto de conversar com você. Se você não se importar, eu gostaria de… continuar fazendo isso. As visitas. As mensagens.

Mariana ficou sem ar. A honestidade dele era desarmante. Ela podia ver a vulnerabilidade por trás daquela fachada serena. Ele estava se arriscando, e ela sabia o quanto isso devia custar para um homem como ele.

— Eu… também gosto, Pedro — ela admitiu, sua voz um pouco mais baixa do que o normal. — Eu não me importo.

O sorriso que ele lhe deu então foi diferente. Era um sorriso de alívio, de alegria pura. Iluminou todo o seu rosto.

— Que bom — ele disse, simplesmente. — Então até a próxima, Mariana.

— Até a próxima, Pedro.

Ele saiu, e Mariana ficou parada atrás do balcão, o coração batendo forte. A semente que ele plantara não era mais minúscula. Tinha raízes. Ela olhou para o café vazio, para as mesas que ela arrumaria sozinha, e pela primeira vez, a solidão não pareceu um fardo, mas uma escolha. E talvez, apenas talvez, ela estivesse pronta para fazer uma escolha diferente.

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