A semana seguinte ao casamento foi um redemoinho de emoções para Mariana. A felicidade pela filha era vasta e real, mas a casa parecia estranhamente silenciosa. Cecília e Benício estavam em sua lua de mel, e o apartamento que outrora ecoava com a presença da filha agora só tinha o tilintar das xícaras e o zumbido da geladeira. Ela se jogou no trabalho no "O Sol" com uma dedicação ainda maior, mas as pausas eram mais longas, seus olhos perdidos na movimentada rua de São Paulo.
Foi numa dessas pausas, numa quarta-feira à tarde, que a campainha da porta do café tocou. Era um som comum, mas algo a fez olhar. Lá estava Pedro, parado na entrada, vestindo um jeans e uma camisa social casual, as mãos enfiadas nos bolsos. Ele parecia um pouco hesitante, mas seu sorriso era tranquilo.
— Pedro! — ela cumprimentou, surpresa. — O que te traz por aqui?
— A verdade? — ele disse, aproximando-se do balcão. — O café da minha máquina de cápsula não está à altura. E eu me lembrei que a dona do melhor café da cidade ficava por perto.
Mariana sentiu um calor subir por seu pescoço. — Bem, você veio ao lugar certo. O que vai ser?
— Me surpreenda — ele respondeu, seus olhos escuros fixos nela com uma curiosidade que fez seu estômago dar um volta.
Ela preparou um capuccino especial, com um toque de canela e uma roseta perfeita na espuma. Enquanto a máquina de espresso sibilava, um silêncio confortável se instalou entre eles.
— E aí, como estão as coisas por aqui? Sem a Cecília em casa — ele perguntou, quebrando o gelo.
Mariana entregou-lhe a xícara. — Estranho. Mais quieto do que eu imaginava. É… um ajuste.
— Eu entendo — ele disse, tomando um gole. — Mesmo quando achamos que estamos preparados, a mudança sempre nos pega desprevenidos. — Ele fechou os olhos por um segundo, saboreando o café. — Isso é divino. Melhor do que eu lembrava.
— O segredo está no grão. Eu mesma faço a torra — ela explicou, orgulhosa.
— E nos bolos? — ele perguntou, apontando para a vitrine. — Ainda tem aquele de limão siciliano que a Letícia não para de falar?
Ela riu. — Tenho sim. Quer uma fatia?
— Só se você se sentar comigo para tomar um café — ele propôs, seu tom era casual, mas seus olhos eram sérios. — A não ser que esteja muito ocupada.
Mariana sentiu um frio na barriga. Era um convite inocente, mas carregado de intenção. Ela olhou para o café vazio, para as mesas limpas. A última vez que tinha aceitado um convite desses tinha sido… bem, não conseguia se lembrar.
— Eu… acho que posso dar uma pausa — ela disse, sua voz um pouco trêmula.
Ela serviu duas fatias de bolo e se sentou com ele numa mesa perto da janela. Os primeiros minutos foram um pouco tensos, falando sobre o tempo, sobre o casamento. Mas então Pedro fez uma pergunta que mudou o rumo da conversa.
— E você, Mariana? O que você faz quando não está aqui, comandando este império de café e açúcar?
A pergunta a pegou de surpresa. As pessoas geralmente perguntavam sobre o café, sobre a Cecília. Raramente sobre ela.
— Eu… gosto de ler — ela confessou. — Romances históricos, principalmente. E adoro documentários sobre natureza. É a minha forma de viajar sem sair de casa.
— Documentários sobre natureza? — ele repetiu, um interesse genuíno em seu rosto. — Eu também. Você já viu aquele sobre as aves do Pantanal?
Ela não tinha visto. E assim, a conversa fluiu. Eles descobriram um gosto mútuo por livros de Yuval Noah Harari, uma paixão compartilhada por música MPB e uma opinião igualmente forte sobre a melhor praia do litoral norte de São Paulo. Pedro era um ótimo ouvinte. Ele a fazia rir com histórias de seus primeiros dias no "Casa & Limpeza Express", e ela se surpreendeu contando-lhe sobre os desafios de abrir o "O Sol", coisas que nem mesmo para a Letícia ela tinha se aberto completamente.
— Foi assustador — ela admitiu, olhando para sua xícara vazia. — Estar sozinha, com uma criança pequena, e todo aquele dinheiro do Fundo Sementes para administrar. Eu tinha tanto medo de falhar.
— Mas você não falhou — ele disse, sua voz suave. — Você construiu isso. Sozinha. É uma das coisas mais admiráveis que eu já vi.
A admiração na voz dele não era elogio vazio. Era um reconhecimento profundo. Mariana sentiu seus olhos marejarem. Ela baixou a cabeça, envergonhada.
— Obrigada, Pedro.
— Eu é que agradeço pelo café, pelo bolo e pela companhia — ele disse, levantando-se. — E pela conversa. Foi a melhor pausa que eu tive em… bem, em muito tempo.
Ele pagou a conta, recusando-se a deixar que ela oferecesse, e se despediu com um aceno.
Mariana ficou parada atrás do balcão, observando-o desaparecer na calçada. O café já não parecia tão silencioso. O ar cheirava a café fresco e a uma possibilidade nova e assustadora. Pedro Moraes não era apenas um amigo da família. Ele era um homem que a via, realmente a via. E pela primeira vez em dezoito anos, Mariana se permitiu pensar que talvez, apenas talvez, ela não precisasse enfrentar todos os ajustes sozinha.
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Atualizado até capítulo 31
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