A manhã seguinte nasceu fria e impessoal, um céu cinzento-chumbo pairando sobre a cidade. O calor do jazz, o gosto de uísque e o perfume de Liana já eram memórias distantes, arquivadas na mente de Yaruan em uma gaveta específica para momentos perfeitamente executados. Ao atravessar as portas de vidro automáticas do quartel-general da Montfleur Global, ele sentiu a mudança de atmosfera como um mergulhador sentindo a pressão da água. O ar do lado de fora era caótico e vivo; aqui dentro, era filtrado, gelado e rarefeito, com o cheiro sutil de metal polido e ambição contida.
O lobby era uma catedral de poder. O pé-direito de trinta metros, as paredes de mármore negro veado de branco e o chão de granito polido que refletia a luz como um espelho escuro eram projetados para intimidar, para lembrar a qualquer um que entrasse de sua insignificância perante o nome Montfleur. No centro, suspenso por cabos quase invisíveis, um globo de titânio girava lentamente, atravessado por linhas de luz que representavam as rotas globais de logística da empresa. Era um deus mecânico em seu próprio templo.
Yaruan não precisava se anunciar. Sua presença era seu crachá. Os seguranças se endireitaram, a recepcionista ofereceu um aceno respeitoso. Ele entrou no elevador privativo, um cubo de vidro e aço escovado que subia pela lateral do edifício. Enquanto o mundo lá fora encolhia, ele sentia seu próprio ser se expandir para preencher o vácuo de seu papel. O sedutor da noite anterior se desfazia, camada por camada, revelando o predador corporativo por baixo. O vermelho do dia era discreto: a linha fina da costura no couro de sua pasta e um único ponto de luz de seu brinco de rubi.
Seu escritório ocupava a totalidade do penúltimo andar. Era um espaço minimalista e funcional, dominado por uma mesa de carvalho negro e uma parede inteira de vidro que oferecia uma vista panorâmica. As outras paredes eram telas interativas, atualmente exibindo um fluxo silencioso de dados: cotações da bolsa, métricas de desempenho de frotas, preços de commodities. A Montfleur Global não era apenas uma empresa; era uma dinastia forjada por seu avô, um homem implacável com uma visão para o futuro. Ele havia construído o império sobre o aço dos navios e ferrovias. Seu pai o solidificou com o silício dos microchips e da fibra ótica. E cabia a Yaruan e seus irmãos levá-lo para a era da energia e da inteligência artificial.
Ele sentou-se em sua cadeira, o couro frio contra suas costas, e ativou a tela principal. O globo do lobby foi replicado ali, em uma projeção holográfica tridimensional. Com gestos ágeis, ele o manipulou, dando zoom em continentes, oceanos e cidades. Cada ponto de luz era um ativo Montfleur: um navio cargueiro atravessando o Estreito de Malaca, uma frota de caminhões autônomos cruzando o deserto de Nevada, uma fazenda solar absorvendo a energia do Saara, um centro de dados pulsando silenciosamente sob as águas de um fiorde norueguês. Era um sistema nervoso global, e ele era uma de suas sinapses mais cruciais. Ele via os padrões que outros não viam, o delicado balé do caos e da ordem que era a economia mundial.
Sua assistente, uma mulher de meia-idade chamada Helena, cuja eficiência era quase robótica, entrou sem bater.
— Senhor Montfleur. O relatório da crise no Porto de Singapura está em sua mesa. O conselho está em pânico. Gael está sugerindo uma realocação de emergência para o Porto de Klang, o que nos custaria uma fortuna em taxas e atrasaria a carga em pelo menos setenta e duas horas.
Yaruan nem olhou para o relatório. Ele já havia visto a notícia da greve dos estivadores eclodir em seus terminais de alerta antes mesmo de a mídia internacional divulgá-la. Pânico era para amadores. Para homens como seu irmão Gael.
— Ignore a sugestão de Gael, Helena. É um movimento de força bruta, não de inteligência.
Seus dedos voaram sobre a interface holográfica. O mapa se concentrou no Sudeste Asiático. Uma teia complexa de rotas marítimas vermelhas, as rotas da Montfleur, converjia para o ponto de estrangulamento de Singapura.
— Temos doze supercargueiros com destino a Singapura nas próximas quarenta e oito horas. Carga total estimada em vinte bilhões. Produtos eletrônicos, componentes farmacêuticos e peças de maquinário de alta precisão. Deixar isso parado é inaceitável.
— O que devo informar ao conselho?
Yaruan girou o holograma. Ele puxou dados de uma de suas aquisições mais recentes e subestimadas: uma pequena empresa de logística ferroviária na Tailândia. Ele sobrepôs as rotas ferroviárias às rotas marítimas. Um novo caminho se formou, um que ninguém no conselho jamais consideraria.
— Informe ao conselho que já resolvi. Desvie os seis primeiros cargueiros para o porto de Laem Chabang, na Tailândia. Acione nosso acordo com a ThaiRail. Quero a carga transferida para o transporte ferroviário e cruzando a fronteira com a Malásia em dezoito horas. De lá, ela desce até o Porto de Tanjung Pelepas, que está operando com capacidade ociosa e onde temos participação majoritária. Os outros seis navios diminuem a velocidade e esperam novas ordens.
Helena o encarou, a compostura dela finalmente rachando com um vislumbre de admiração.
— Senhor... A coordenação para isso... as taxas de alfândega, a capacidade ferroviária... é sem precedentes.
— Eu negociei pessoalmente a cláusula de "emergência logística" com o governo tailandês há seis meses, quando adquirimos a ThaiRail. Eles nos devem um favor. Acione-a. E contate nosso homem em Tanjung Pelepas. Diga a ele para se preparar para um bônus.
Ele se recostou na cadeira, observando o plano se desdobrar em simulações na tela. Uma crise que poderia ter paralisado a cadeia de suprimentos de uma dúzia de multinacionais, transformada em uma demonstração de poder e previsão. Ele não apenas evitou um desastre; ele acabara de mostrar a todos os concorrentes que a Montfleur Global não jogava no mesmo tabuleiro que eles. Ele via o caos não como uma barreira, mas como uma oportunidade de reescrever as regras.
O sentimento era estranhamente familiar. Era a mesma descarga de dopamina, a mesma sensação de controle absoluto que sentira na noite anterior, ao decifrar os desejos de Liana e guiá-la suavemente para fora da festa. A conquista de um mercado ou a sedução de uma mulher... no fundo, para Yaruan, o mecanismo era o mesmo. Era sobre entender um sistema complexo, identificar suas vulnerabilidades e prazeres, e manipulá-lo com uma elegância letal para alcançar o resultado desejado.
Ele olhou para a cidade lá fora. O império de silício e aço não era apenas sua herança. Era seu vício, seu campo de batalha e o maior jogo de todos. E ele era, inegavelmente, um mestre em jogá-lo.
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Atualizado até capítulo 49
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