Lilia
Enquanto estou no quarto, sentada no meu lado da cama, ainda tentando organizar a confusão dentro da minha cabeça, ouço a maçaneta girar. A porta se abre devagar e, de repente, ela entra.
Seus cabelos em cachinhos pretos caem soltos até a altura dos ombros, balançando a cada passo leve. As meias coloridas que ela usa chamam atenção de imediato, destoando de tudo ao redor.
Um detalhe vivo em meio ao ambiente cinza da minha mente.
Mas é quando meus olhos capturam seu rosto que me pego realmente surpresa. O nariz dela é um pouco mais arrebitado do que o normal, os traços delicados, mas diferentes.
E só então me dou conta do que estou vendo.
— Uma roedora! — ela mesma se apresenta, erguendo os ombros com naturalidade, como se fosse algo óbvio. — Sou das linhagens dos roedores.
Ela me lança um meio sorriso travesso, e por algum motivo sinto o coração acelerar.
— Você é linda… — as palavras escapam dos meus lábios antes mesmo que eu perceba. Automáticas, sinceras, quase impulsivas.
Ela arregala os olhos por um instante, surpresa, e logo sorri de volta, um sorriso que ilumina o quarto inteiro. Estende a mão para mim, envolta por uma luva cor-de-rosa de dedos de fora, delicada e ao mesmo tempo estilosa.
— Obrigada! Você também é linda. A propósito, me chamo Ylow, sua companheira de quarto.
Assinto, um pouco envergonhada pela minha espontaneidade, e aperto a mão dela.
— Eu sou Lilia.
Ela confirma com a cabeça e acrescenta, como quem compartilha um segredo que já corre por todos os cantos da Academia:
— A sobrinha da diretora Verusa, não é? A Academia só fala disso agora. Mais uma das linhagens das fadas. Seja bem-vinda.
O calor da mão dela ainda pulsa na minha, e pela primeira vez desde que cheguei sinto algo que quase se parece com… segurança. Talvez amizade.
Mas ao mesmo tempo, no fundo da minha mente, uma pontada de inquietação me lembra que nada aqui será simples.
(...)
Eu sei que ficamos conversando tanto que o tempo passou voando, e agora aqui estou eu, ajustando os últimos detalhes do meu vestido. Um vermelho escuro, quase vinho, que me faz sentir ao mesmo tempo poderosa e exposta.
Soltei parte do cabelo, que cai em ondas pelos ombros, e o resto continua preso, como se fosse um reflexo da minha própria hesitação.
— Uau! Você está ótima! — diz Ylow, se aproximando com aquele sorriso fácil que começa a me deixar mais à vontade.
Não consigo deixar de sorrir de volta.
— Você também está. Esse amarelo combinou muito bem com você.
Ela assente, satisfeita, e então saímos juntas do quarto.
Descemos as grandes escadas lado a lado, e é impossível não sentir o peso do que nos espera. À medida que o salão se revela diante de mim, minha respiração falha por um instante. O espaço é amplo, iluminado por lustres mágicos que parecem flutuar no teto.
As longas mesas estão tomadas por seres de todas as linhagens, e sobre elas repousam iguarias que jamais imaginei existir — carnes temperadas com ervas cintilantes, frutas que brilham como pequenas estrelas, cálices cheios de líquidos que mudam de cor a cada movimento.
Suspiro profundamente, sentindo o coração acelerar.
— Olha, só relaxa tá? — Ylow murmura ao meu lado. — Eles vão testar você. Provavelmente você vai ser atacada pelas fadas.
Meus olhos se arregalam, e eu me viro para ela quase tropeçando nas próprias pernas.
— Atacada?! Como assim atacada? Eu nem sei usar meus poderes!
Ela sorri, divertida com meu pânico.
— Calma, Lilia. Quando digo atacada, quero dizer que elas vão usar os elementos delas contra você, só para que você descubra que tipo de magia ou elemento domina. É como um ritual de iniciação. Mas não se preocupe, vai ser sob a supervisão de um dos mentores.
Engulo em seco e apenas assinto, tentando não demonstrar o medo que cresce dentro de mim. Mas então meus olhos o encontram.
Kael.
Ele está do outro lado do salão, recostado de maneira displicente, mas a forma como me encara é tudo menos desinteressada. Seus olhos dourados brilham de forma predatória, e o sorriso cínico em seus lábios me arrepia até a alma.
— Kael Blaster — Ylow sussurra, percebendo meu olhar. — Aquilo ali é pura encrenca. Um príncipe lobo, cujo pai financia praticamente tudo por aqui. Ele se sente o maioral porque é bonito, podre de rico e descendente da mais alta linhagem dos lobos alfas.
Ela revira os olhos, entediada.
— É alvo de conquista e desejo de quase todas as fêmeas de diferentes linhagens por aqui. Então, se quer um conselho, é esse: fique o mais longe possível dele. Kael é problema… do tipo que arrasta você para o fundo e sorri enquanto você afunda.
Assinto em silêncio, desviando o olhar dele, mas a sensação de estar sendo observada persiste. Quando ouso levantar os olhos outra vez, ele ainda está lá… me encarando com mais intensidade do que deveria.
O estômago se revira, e antes que eu possa dizer algo, Ylow aponta discretamente com a cabeça para uma loira do outro lado do salão.
— Aquela é Samara. Também da linhagem das fadas, como você. Mas não se engane… é fútil, egocêntrica e uma das mais populares daqui.
A loira me fita com um olhar carregado de desdém, como se já tivesse me julgado e condenado.
— E advinha? — continua Ylow. — Morre de amores pelo Kael. São insuportáveis, os dois. Ou melhor… ela e a obsessão dela por ele.
Eu suspiro, já pressentindo que essa noite vai ser bem mais longa do que imaginei.
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Atualizado até capítulo 37
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