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Acordei cedo naquele dia. O coração acelerava como se fosse o primeiro plantão da minha vida. Não era. Eu já havia vivido madrugadas em claro, cirurgias intermináveis, momentos de desespero e esperança. Mas aquele dia tinha outro peso. Era o meu recomeço em Portugal.
Escolhi a roupa com cuidado. Um vestido azul-claro, justo, de tecido macio que acompanhava minhas curvas sem exagero, com uma fenda discreta entre as pernas. O cinto bege acentuava a cintura, enquanto os saltos nude, com detalhe prateado, completavam a elegância. Os cachos negros caíam soltos pelas costas, meio presos no topo, e a maquiagem era suave, apenas o suficiente para iluminar o rosto. Não precisava mais do que isso.
Minha sala estava organizada, mas a terceira gaveta insistia em emperrar. Abaixei-me para tentar forçar o trilho quando ouvi um assobio prolongado, seguido de um pigarro. Meu corpo inteiro gelou por um instante.
Ao me virar, encontrei o contraste perfeito: o negro mais charmoso e o loiro mais enigmático que já vi juntos.
Pietro abriu um sorriso malicioso:
– Fiu fiu... esse bumbum seria perfeito para a propaganda que estou procurando.
Ri, balançando a cabeça.
– Seu besta! Pode tirar o cavalo da chuva.
Ele se aproximou sem pedir licença, me envolvendo num abraço demorado, quase possessivo, murmurando ao meu ouvido:
– Só sinto que você vai ter que trabalhar ao lado desse chato.
Atrás dele, Edgar pigarreou alto.
– Parem com esse cochicho. Não sabem que é falta de ética?
Pietro se virou de pronto, rindo:
– Ética? Você, Edgar? Logo você que... come suas enfermeiras?
Ri mais alto, mesmo tentando conter. Edgar permaneceu sério, os olhos azuis faiscando.
– Bom, afinal – disse eu, afastando-me de Pietro – o que vocês dois querem logo cedo na minha sala?
Pietro levantou as mãos em rendição:
– Vim convidar seu bumbum para a próxima propaganda.
Edgar rebateu seco, como quem cuspia palavras:
– Você não tem uma reunião agora?
– Tenho, sim – respondeu Pietro, piscando para mim – mas ainda preciso abraçar a Diana mais uma vez.
Ele me envolveu novamente, teatral, enquanto Edgar observava sem disfarçar o incômodo.
Naquele instante, percebi algo que não queria admitir. A raiva de Edgar não era apenas birra. Pietro sabia disso. Eu também.
E esse seria apenas o começo.
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A sala oval estava cheia de pastas, relatórios e gráficos projetados no telão. Era minha primeira reunião oficial na clínica, e eu me sentia observada a cada gesto, cada palavra. Sentei-me ao lado de Edmundo, enquanto os demais diretores iam chegando.
De repente, Pietro entrou como quem ilumina o ambiente. O sorriso largo, o terno impecável, aquele ar de charme natural que sempre o acompanhava. Sentou-se perto de mim, ignorando os lugares vagos.
– Vou precisar da sua visão para o próximo projeto de imagem da clínica, Diana – disse, olhando-me nos olhos. – Quero você por perto.
Eu ri, meio sem jeito:
– Pietro, ainda nem comecei direito e já está me colocando em pauta?
– Não é pauta, é destino – respondeu, com um tom que arrancou risadas discretas de alguns presentes.
Do outro lado da mesa, Edgar permaneceu em silêncio. Não havia expressão no rosto, apenas os olhos azuis fixos em nós dois, como lâminas afiadas.
– Você ainda tem uma hora livre antes do próximo compromisso – continuou Pietro, abrindo a agenda. – Pode vir comigo à sala de marketing. Vai adorar conhecer os projetos.
Eu hesitei. Parte de mim queria manter distância das brincadeiras dele. Outra parte sentia que, de certa forma, precisava respirar fora daquelas paredes pesadas.
– Tudo bem – disse por fim. – Mas só porque ainda tenho tempo.
Edmundo sorriu satisfeito, como se já esperasse a resposta. Pietro inclinou-se na cadeira, quase encostando o ombro no meu.
– Vai ser ótimo. Assim você já vai ficando mais perto da gente.
Edgar não disse uma palavra. Não precisava. Seu silêncio era um barulho que ecoava dentro da sala. Eu sabia que ele estava desconfortável. Pietro também sabia. Talvez fosse exatamente isso que ele queria.
Porque Pietro não era apenas o diretor de marketing. Ele era irmão de Paulo, advogado que hoje estava com Maria, a primeira esposa de Edgar. Era amigo da família há anos. Um homem fascinante, mulherengo, que já tinha tropeçado com minha amiga Joice — mas que me tratava com intimidade, como se houvesse entre nós uma ligação antiga, segura.
E, mais do que tudo, Pietro era o único que sabia ler Edgar apenas pelo olhar. Ele conhecia seus segredos, seus limites, suas obsessões. Sabia até das sombras que o amigo escondia atrás da frieza.
Mais de uma vez, Pietro havia me confessado em tom brincalhão:
– Eu até abriria mão de algumas paixões, Diana. Mas de você? De você eu já abri, porque sei que se um dia eu investir, vou perder um amigo rabugento,que eu amo muito .
Eu não entendia. Não queria entender. Mas naquela reunião, enquanto Pietro me puxava para a conversa e Edgar se mantinha em silêncio gélido, percebi que a minha presença não era apenas um detalhe. Era o estopim de uma guerra que eles jamais admitiriam em voz alta.
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Pietro Vegas
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Atualizado até capítulo 80
Comments
Decapitator
Começou com o pé direito! 😍
2025-09-06
1