A Primeira Ponte

Capítulo 4: A Primeira Ponte

A fuga de Laura no dia anterior ecoou na mente de Sophia como um pequeno fracasso. Ela reavaliou sua estratégia. Pressão era o inimigo. Clara estava certa em um ponto: Laura não suportava ser forçada. A menina precisava se sentir no controle, segura.

No dia seguinte, Sophia chegou com um novo plano. Ignorou a lista rígida de horários de Clara e focou apenas em uma coisa: criar um ambiente seguro.

Em vez de tentar se aproximar diretamente, ela se instalou na sala de estar, mas não no chão. Desta vez, sentou-se à mesa grande de madeira, com sua pasta de estudos de psicologia aberta, seus cadernos e, estrategicamente colocada ao lado, uma nova caixa de giz de cera—desta vez, de ponta grossa e com cores vibrantes—e um bloco de papel A3.

Laura observava de longe, sentada em seu canto no sofá, imóvel como uma estátua.

Sophia não a olhava. Fingia estar completamente absorta em um texto denso sobre desenvolvimento infantil e trauma. Sublinhava palavras, fazia anotações. Era uma performance de normalidade.

Minutos se transformaram em quase uma hora. O silêncio era pesado, mas Sophia o manteve, sua paciência sendo testada ao extremo.

Foi então que o primeiro movimento sutil aconteceu. Laura se ajustou no sofá. Um pequeno suspiro, quase inaudível, escapou de seus lábios. Sophia não ergueu os olhos, mas cada fibra do seu corpo estava alerta para a menina.

Mais alguns minutos. E então, o rangido leve do assoalho. Sophia manteve a respiração estável, os olhos fixos no livro, mas seu coração acelerou. Pela visão periférica, ela viu os pezinhos pálidos de Laura se aproximando da mesa.

A menina parou a uma distância segura, seus dedos enrolando-se na barra da camiseta. Seu olhar não estava em Sophia, mas fixo na caixa de giz de cera nova, tão colorida e convidativa.

Sophia continuou sua encenação, virando uma página com uma lentidão exagerada. "Vá lá," ela pensou, projetando calma. "É sua. Pode pegar."

Como se ouvisse seus pensamentos, a mão pequena e hesitante de Laura esticou-se. Seus dedos tocaram a caixa de plástico, puxando-a lentamente para seu lado da mesa. Ela pegou um giz azul—sempre o azul—e uma folha de papel em branco.

E então, sentou-se no chão, às costas de Sophia, criando uma barreira física simbólica.

Sophia não se virou. Permaneceu absolutamente imóvel, ouvindo o som suave e reconfortante do giz deslizando sobre o papel. Era um som de concentração, de criação. Era o som de uma porta se abrindo, milímetro a milímetro.

Assim que o som começou, Sophia fechou suavemente seu livro. A performance de estudar havia cumprido seu propósito. Agora, era hora de uma nova performance.

Ela pegou uma folha de papel em branco e um lápis comum. E começou a desenhar também. Desenhou flores toscas, uma borboleta desproporcional. Não era arte; era uma oferta. Uma linguagem.

"Nossa, essa borboleta ficou com as asas tortas", ela murmurou para si mesma, em um tom de voz baixo e casual, como se estivesse apenas pensando em voz alta. "Acho que vou precisar de mais prática."

Silêncio. Apenas o som do giz de Laura continuando.

Sophia não esperava uma resposta. Continuou rabiscando.

Foi quando ouviu um ruído suave. Um tap leve. Ela olhou para o lado.

Um pedaço de giz vermelho havia sido empurrado para debaixo de seu braço, parando ao lado de sua folha de papel.

Foi um movimento rápido, furtivo. Quando Sophia olhou para trás, Laura estava de costas para ela, concentrada em seu próprio desenho, como se nada tivesse acontecido. Mas o giz vermelho estava lá. Uma oferta. Uma correção silenciosa para a borboleta sem cor.

Era um convite. Um fio de linha jogado entre dois universos isolados.

Sophia sentiu um calor percorrer seu peito. Ela pegou o giz vermelho com uma reverência quase cerimonial. "Obrigada",sussurrou, direcionando a palavra para o ar, sem olhar para trás. "Vermelho é uma cor muito mais bonita."

E então, começou a colorir sua borboleta desengonçada de vermelho. Do outro lado da mesa, o som do giz azul de Laura continuou, mas agora um pouco mais rápido, um pouco mais confiante.

Ela não havia dito uma palavra. Não havia estabelecido contato visual. Mas naquela sala silenciosa, uma ponte frágil e preciosa havia sido construída. Era feita de giz de cera e silêncio, e era a coisa mais bonita que Sophia já tinha visto.

A fresta não estava apenas aberta. Agora, havia um caminho.

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