Os dias que se seguiram àquela noite chuvosa se arrastaram como se o tempo tivesse sido estendido de propósito, um fio tenso prestes a se romper. Para Elara, cada amanhecer parecia uma extensão da mesma vigília interminável. Dormir era quase impossível; quando fechava os olhos, via o vampiro parado sob a chuva, imóvel como uma estátua, sorrindo de forma cruel.
A ausência dele não era um alívio. Pelo contrário. O fato de não tê-lo visto novamente era ainda mais aterrorizante. A ameaça invisível é sempre mais poderosa do que aquela que se pode encarar de frente. Ele estava em algum lugar — observando, esperando, preparando-se.
Elara tornou-se hipervigilante. O som do metrô subterrâneo vibrando sob seus pés parecia um rugido disfarçado. As sombras projetadas pelos postes de luz eram longas demais. Os passos atrás dela, nas calçadas molhadas, soavam como perseguição. Até mesmo o cheiro das ruas — gasolina, lixo úmido, fritura vinda de carrinhos de comida — parecia corrompido por uma camada metálica, como se o ar trouxesse consigo o eco da presença fria que a havia encarado.
Ela tentava sorrir por Leo. Tentava ser a mãe que o levava ao parque, que o acompanhava na biblioteca, que comprava sorvete como se a vida fosse normal. Mas até mesmo nesses momentos, o perigo parecia se infiltrar por frestas invisíveis.
No parque, enquanto Leo corria atrás de pombos com sua energia incansável, Elara sentia o vento frio como um sussurro de alerta. Cada olhar prolongado de um estranho era interpretado como ameaça. Quando um homem em um banco próximo abriu o jornal e o dobrou devagar, o coração dela disparou. O simples gesto parecia carregado de segundas intenções.
Na biblioteca, a atmosfera deveria ser acolhedora. O cheiro de papel antigo e poeira sempre a tranquilizara. Ali, entre estantes altas, Leo mergulhava nos livros de animais marinhos, encantado com tubarões e baleias. O riso baixo dele ecoava, genuíno, como se nada estivesse errado.
Mas para Elara, até a biblioteca havia se transformado em território hostil.
Enquanto Leo folheava um livro ilustrado de tubarões, ela mesma buscava material para um projeto de restauração. Um volume sobre arte flamenga chamou sua atenção. Abriu-o, deixando os olhos percorrerem um tríptico detalhado que retratava uma batalha entre anjos e demônios. Era uma obra densa, carregada de simbolismos.
Então, algo chamou sua atenção. No canto inferior da gravura, quase invisível a olho nu, havia uma pequena marca.
Elara inclinou-se para enxergar melhor. Era uma runa.
Não uma marca qualquer. O traço fino, as curvas entrelaçadas, a energia sutil que parecia vibrar no papel — tudo aquilo era inconfundível. Uma runa de rastreamento.
Seu sangue gelou.
Não era apenas uma runa funcional, era um recado. Vampiros não deixavam sinais assim por acaso. Era como uma assinatura, um bilhete silencioso.
Elara fechou o livro de forma brusca, o som ecoando entre as prateleiras silenciosas. O coração martelava. Coincidência? Não. Aquilo era comunicação. Era a prova de que eles sabiam quem ela era, onde estava, e até o que fazia.
Ela engoliu seco e caminhou rapidamente até Leo.
“Vamos, querido. Hora de ir.”
Leo levantou os olhos dourados do livro, contrariado. “Mas eu ainda não terminei de ler sobre o tubarão-martelo!”
“Você pode pegar emprestado.” A voz dela saiu mais áspera do que pretendia, carregada de urgência.
Leo franziu a testa, mas obedeceu. Segurou a mão da mãe enquanto se dirigiam à saída.
Do lado de fora, o vento frio bateu contra o rosto de Elara. A sensação de estar sendo observada voltou com força total, como se dezenas de olhos invisíveis a seguissem. Olhou para trás, tentando identificar quem a vigiava. Mas via apenas pessoas comuns: uma mulher com sacolas de compras, um estudante de capuz ouvindo música, um casal discutindo baixinho.
Ninguém parecia prestar atenção nela.
E ainda assim, a loba dentro dela sabia. Estavam lá. Escondidos nas sombras, refletidos em vitrines, escondidos atrás de gestos banais.
A mentira confortável de “Ellie”, a artista, estava se despedaçando como tinta velha em uma tela.
Elara de Silverwood, a loba fugitiva, precisava encarar a verdade: a caça havia recomeçado. E não importava quantos muros ela tivesse erguido, o mundo estava se estreitando ao redor dela e de Leo.
A pergunta que a martelava era cruel e simples:
**Ficar e lutar em território inimigo? Ou fugir de novo, sem destino, quando o próprio mundo parecia persegui-la?**
Não importa o que ela pense, as paredes de seu esconderijo estavam ruindo, o tempo estava acabando e suas defesas evaporando como água em dia de muito calor.
Seus esforços de seis anos foi posto por água a baixo, Léo sobreviveu, mas até quando eles teriam que estar se escondendo nas sombras, temendo o desconhecido.
Ela sabia, não poderia evitar que desastres acontecessem, não seria possível, sua loba ficou adormecida por muito tempo e ela se questionava, seria capaz de defender seu pequeno?
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Atualizado até capítulo 55
Comments
CantStopWontstop
Que livro incrível! Parabéns, autora!
2025-09-01
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Maria Aparecida Alvino
seu livro são todos maravilhoso
2025-09-03
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