O nome permaneceu em sua mente, latejando como uma ferida recém-aberta: Noah.
Elisa recostou-se no sofá, a carta ainda aberta sobre o colo, e sentiu que o mundo girava ao seu redor. O ar parecia rarefeito, como se a casa inteira tivesse se transformado em um túmulo onde as paredes guardavam segredos que ela nunca suspeitou de existir. A traição já seria o bastante para dilacerá-la, mas o que Gabriel deixou escrito ia além de qualquer dor que imaginara carregar.
Um filho.
Um filho que não era dela.
Passou as mãos pelos cabelos, tentando afastar a tontura. Seu coração batia forte, cada pulsação reverberando nas têmporas como um lembrete cruel de que aquela não era uma ilusão. Era real. A letra era de Raul. O tom, as pausas entre as frases, até mesmo a forma como ele tentava justificar o injustificável — tudo era dele.
Elisa fechou os olhos e, por um instante, desejou não ter aberto aquela pasta. Talvez fosse mais fácil seguir vivendo na ignorância, mantendo apenas a dor da ausência, sem acrescentar a ela o peso de uma verdade que mudava tudo. Mas era tarde demais. Uma vez lida, a carta se tornará parte dela.
Levantou-se devagar, andando pela sala como quem vagueia sem destino. Seus pés se arrastavam no tapete, e cada objeto da casa parecia observação em silêncio. As fotografias do casamento, ainda penduradas na parede, os livros com as anotações de Raul, até mesmo a poltrona em que ele gostava de ler — tudo a confrontava, como se dissesse: Você não sabia de tudo. Você não conhecia o homem por inteiro.
A raiva veio primeiro, intensa, queimando-lhe a garganta.
— Por que, Gabriel? — murmurou, a voz trêmula. — Por que não me contou?
A pergunta ecoou no vazio da sala, sem resposta.
Ela pegou novamente a carta. Os olhos, já marejados, se detiveram nas últimas linhas, borradas pela pressa da escrita:
"Ele não tem culpa, Elisa. Ele é só uma criança. Eu nunca tive coragem de te contar, e agora… não tenho escolha. Se algum dia puder olhar por ele, mesmo de longe, eu sei que vai entender. Ele merece."
As lágrimas finalmente caíram. Elisa pressionou o papel contra o peito, como se assim pudesse alcançar Gabriel do outro lado da morte, como se pudesse exigir explicações que jamais viriam. O mais cruel não era a traição em si, mas o fato de ele ter partido sem lhe dar a chance de decidir o que fazer com a verdade. Havia deixado sobre seus ombros o peso de uma vida que ela sequer conhecia.
Noah.
O nome soava suave, quase delicado. Não era a criança que tinha culpa — sabia disso. Mas como olhar para aquele menino sem sentir que cada traço dele seria um lembrete da infidelidade de Gabriel? Como separar a dor do amor que, de alguma forma, ainda restava dentro dela?
Elisa caminhou até a janela. Do lado de fora, a rua seguia viva: uma vizinha passeava com o cachorro, o carteiro atravessava a calçada, uma criança corria de bicicleta. A vida continuava, indiferente à devastação dentro dela. E, pela primeira vez desde o acidente, sentiu um impulso que não era apenas sobreviver ao luto. Era algo diferente. Uma necessidade urgente de saber.
Quem era Noah?
Onde estava agora?
Será que sabia da existência do pai? Ou teria crescido acreditando ser apenas filho de Carla?
O nome de Carla surgiu como um soco. Elisa a conhecia apenas de longe, lembranças vagas de uma moça de olhar firme e sorriso insinuante, que aparecia em festas ou eventos na época da faculdade. Nunca imaginou que seu nome fosse voltar, costurado à sua vida de maneira tão amarga.
Elisa suspirou fundo e caminhou até o escritório de Gabriel. Abriu gavetas, pastas, cadernos. Buscava qualquer pista, um endereço, um número de telefone, algo que a levasse até aquela criança. Quanto mais revirava, mais percebia que Gabriel havia sido cuidadoso em esconder aquele pedaço de sua vida. Mas, no fundo da última gaveta, encontrou uma fotografia esquecida entre contas antigas: um menino de cabelos castanhos claros, segurando um carrinho vermelho. Os olhos, de um verde profundo, eram inconfundíveis.
Elisa levou a foto até o rosto, e seu coração disparou.
Era como olhar para Gabriel em miniatura.
Sentou-se na cadeira do escritório, exausta. Sentia-se dividida em mil pedaços: a esposa traída, a viúva enlutada, a mulher que descobria a existência de uma criança inocente que, de alguma forma, agora fazia parte dela.
O relógio marcava 23h12 quando Elisa finalmente fechou os olhos. A foto ainda descansava em sua mão, e a carta de Gabriel permanecia sobre a mesa. Naquele silêncio noturno, uma certeza começou a nascer, tímida, mas firme: precisava encontrar Noah. Precisava ouvir sua voz, ver de perto quem ele era.
Não sabia se estava pronta para aceitar, muito menos para amar.
Mas sabia que não conseguiria descansar enquanto não descobrisse quem era o menino com os olhos do homem que amara — e que, ao mesmo tempo, a havia destruído.
No fundo da foto tinha endereço do hospital
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Atualizado até capítulo 40
Comments
Marileide Alencar
Que facada, além de traidor deixou um filho, e ela não pode nem confrontar o babaca que dizia a amar, e na primeira oportunidade a traiu
2025-08-26
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Ana Flavia
Não sei por qual motivo eu alterei o nome do Raul para Gabriel ao longo da história, eu já estou fazendo as correções obrigada, pelo aviso.
2025-08-27
0
Severa Romana
não entendi nada..Raul ou Gabriel, qual é o nome verdadeiro?
2025-08-27
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