O sinal tocou ecoando pelos corredores como uma onda de liberdade momentânea. O leve burburinho da sala, que até então estava contido pela presença da professora, rapidamente se transformou em uma algazarra de vozes altas, risadas e passos arrastados. A docente se despediu com um sorriso caloroso, enquanto os alunos, como de costume, já se aglomeram em grupos animados.
Felipe, Hikaru e Kauro seguiram até a porta da sala, encostando no batente enquanto esperavam o próximo professor. Felipe ainda carregava a expressão de quem havia levado um golpe no ego — algo raro para ele, que estava acostumado a conquistar a atenção das garotas com pouco esforço. Hikaru, percebendo a oportunidade de provocar o amigo, foi o primeiro a falar:
— E então? — indagou, arqueando uma sobrancelha e cruzando os braços.
Felipe soltou um suspiro, os ombros levemente caídos. — Foi como conversar com um robô.
Kauro, que escutava calado, reprimiu um pequeno sorriso, mas foi Hikaru quem não conseguiu segurar a risada. — Hahahahah! Simplesmente porque você não a conquistou, recruta! — disse em tom de deboche, usando o apelido que costumava dar a Felipe sempre que queria diminuí-lo.
Felipe o encarou com seriedade, mas não conseguiu sustentar a pose por muito tempo. Acabou desviando os olhos para dentro da sala, onde Amalha, indiferente a tudo, permanecia sentada em sua carteira. Ela arrumava calmamente seus materiais, retirando da bolsa um livro volumoso de capa escura, que abriu sem cerimônia e começou a ler como se estivesse sozinha em outro mundo.
— Aquela garota não é normal... — murmurou Felipe, como se ainda tentasse justificar seu fracasso.
Hikaru ergueu o queixo, cheio de confiança. — Então vai desistir?
Felipe voltou a inflar o peito. — Claro que não. — Seus olhos voltaram a brilhar com orgulho renovado.
Hikaru, no entanto, sorriu de forma marota e se endireitou, como se estivesse se preparando para entrar em cena. — Bom, agora é minha vez. Com licença, recruta. Observe e aprenda.
Ele deu alguns passos para dentro da sala, ajeitando a gola da camiseta como quem arruma a armadura antes da batalha. O andar era firme, quase pomposo, como se cada movimento fosse calculado para parecer natural. Felipe e Kauro o observaram com expectativa: o primeiro, curioso para ver se o amigo teria melhor sorte; o segundo, apenas interessado em analisar como Amalha reagiria a mais uma investida.
Amalha, imersa no livro, sequer ergueu os olhos quando Hikaru se aproximou. Ele pigarreou discretamente, esperando que isso atraísse a atenção dela. Quando não surtiu efeito, resolveu começar direto:
— O que está lendo? — perguntou, inclinando levemente a cabeça para o lado.
Amalha ergueu os olhos apenas por um instante. Sem dizer nada, colocou o dedo delicadamente entre as páginas para marcar o ponto da leitura, fechou o livro e o exibiu à sua frente. A capa revelava o título: “Teoria da Física Quântica”.
Hikaru piscou algumas vezes, surpreso. Não era o tipo de livro que esperava encontrar nas mãos de uma colega do ensino médio.
— Isso é... ousado. — tentou comentar, ajustando o tom da voz. — Um livro desses não parece um pouco... avançado para uma garota do terceiro ano?
Amalha manteve-se impassível. — Não vejo restrição de idade neste livro. Portanto, não há problema. — Ela o observou em silêncio por alguns segundos, como se estivesse analisando não apenas o que ele dizia, mas a própria essência dele. Seus olhos eram frios, inquisitivos, quase clínicos. — Você é amigo daquele outro garoto, certo?
Hikaru coçou a nuca, sem jeito. — O Felipe? Bom... sim, somos amigos.
— Então, por favor, peço que não me atrapalhe. — disse ela com serenidade, devolvendo o livro ao ângulo de leitura, como se a conversa já estivesse concluída.
Hikaru, porém, não se deu por vencido. Tentou um sorriso charmoso, inclinando-se levemente para a frente. — Não é o Felipe que está aqui agora. Sou eu. E prometo ser menos... desagradável.
Amalha ergueu os olhos novamente, mas não sorriu. — Neste momento, o desagradável é você.
A frase foi dita em tom neutro, mas atingiu Hikaru como um soco no estômago. Ele recuou um passo, sem saber como reagir. Ainda tentou se recompor, abrindo a boca para dizer algo espirituoso, mas Amalha já havia baixado os olhos para o livro, cortando qualquer chance de réplica.
Do lado de fora da sala, Felipe e Kauro assistiam à cena como se fosse um espetáculo. Felipe deu uma gargalhada sonora, batendo palmas de leve, enquanto Kauro apenas arqueou uma sobrancelha e deixou escapar um sorriso discreto.
— Hahahahah! Essa doeu, não é, Hikaru? — zombou Felipe quando o amigo voltou, derrotado, para perto da porta.
Hikaru, com o orgulho ferido, tentou manter a compostura, mas a vermelhidão no rosto o denunciava. — Ela só precisa de tempo. Vai ver está fingindo ser difícil.
— Fingindo? — Felipe segurava o riso. — Aquilo foi um fora monumental, meu caro.
Kauro, ainda calado, observava Amalha de longe. Havia algo nela que o intrigava além da frieza com que rejeitava os avanços dos colegas. Não era apenas desinteresse. Era como se Amalha estivesse num plano completamente diferente, uma mente ocupada demais para se distrair com os jogos adolescentes ao redor.
O riso de Felipe e a cara emburrada de Hikaru preencheram o pequeno intervalo até que um silêncio súbito tomou conta da sala. A porta se abriu lentamente, rangendo, e um homem entrou carregando uma pasta volumosa debaixo do braço.
O novo professor se aproximou da mesa, batendo a pasta sobre ela com força suficiente para silenciar até os mais falantes. Era um senhor de meia-idade, com cabelos curtos já grisalhos, óculos de armação grossa e expressão carrancuda. Seu olhar sério percorreu a sala como se fosse capaz de atravessar cada aluno.
— Matemática. — disse em tom grave, sem sequer se apresentar. — Abram os cadernos.
Os alunos se entreolharam, alguns reprimindo risadinhas nervosas, outros já se endireitando em suas carteiras. A breve distração da troca de professores chegava ao fim, e agora a atenção deveria ser voltada para o novo desafio: suportar a rigidez de um professor que parecia não ter paciência para brincadeiras.
Amalha, indiferente, guardou o livro de Física Quântica em sua bolsa e abriu o caderno de matemática com a mesma serenidade de sempre.
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Atualizado até capítulo 27
Comments
Shibuya Luxi
Estou totalmente envolvida nessa trama! 💕
2025-08-30
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