A aula prosseguia em um ritmo que, para a professora Kamilly, parecia absolutamente normal. Entre cochichos, risadinhas e cadeiras arrastando, ela pensava consigo mesma: “Nada além do burburinho costumeiro. Primeiro dia nunca é fácil, mas é sempre igual.”
Na lousa, em letras redondas, estava escrito o exercício do dia: ler as páginas indicadas do livro de literatura e, em seguida, escrever uma opinião resumida sobre a obra de Shakespeare, Romeu e Julieta.
Para muitos, aquele título era apenas um nome batido, repetido tantas vezes que já não despertava emoção. Para outros, ainda carregava a força de um romance trágico capaz de arrancar suspiros. No entanto, ninguém parecia realmente interessado em mergulhar no dever logo de início. Quase ninguém.
Felipe, por exemplo, mal havia aberto o livro. O caderno estava em branco, a caneta girava entre seus dedos. A atenção dele estava ocupada com algo muito mais intrigante do que a tarefa escolar: Amalha.
A garota nova sentava-se impecavelmente ereta na terceira fileira, sem trocar olhares com ninguém. Os movimentos eram precisos, cada letra que escrevia parecia ter peso, como se houvesse pensado em cada frase antes mesmo de a caneta tocar o papel. Havia nela uma aura de seriedade que destoava do caos adolescente da sala.
Felipe a observava com crescente curiosidade. A primeira impressão dele havia sido de que ela era “estranha”, mas quanto mais olhava, mais se convencia de que havia algo magnético em sua postura firme, quase militar. E, acima de tudo, sentia o desafio pulsando dentro de si: conquista-la seria como ganhar um troféu raro.
Estufou o peito, ajeitou-se na cadeira, e com um sorriso confiante inclinou-se levemente em direção à carteira dela.
— Então, Amalha — chamou, num tom de voz estudado, carregado de charme.
Nenhuma reação. Ela não desviou os olhos do caderno, a mão continuava correndo firme, preenchendo linhas com rapidez impressionante.
Felipe franziu o cenho, mas não desistiu.
— Eu sou Felipe — insistiu, desta vez mais alto, para garantir que ela tivesse ouvido.
Ainda nada. Era como se ele fosse invisível. Amalha permanecia concentrada, terminando sua análise de Romeu e Julieta. Quando finalmente fechou o caderno, apenas seis minutos haviam se passado desde que a tarefa fora dada.
Felipe arregalou os olhos.
— Impossível! Você já terminou? — murmurou, quase incrédulo.
Amalha levantou-se com naturalidade e caminhou até a mesa da professora. Seus passos eram suaves, mas firmes, transmitindo uma confiança quase inumana. Felipe a acompanhou com os olhos, intrigado. *“Aquela garota é... diferente... Quase como se não fosse humana.”*
A professora Kamilly pegou o caderno, leu rapidamente e abriu um sorriso de surpresa.
— Excelente, Amalha! E tão rápido... Parabéns, sua visão é muito madura.
— Obrigada, professora — respondeu ela com serenidade, a voz firme e polida.
Devolvendo o caderno, Amalha retornou ao seu lugar. Ao se sentar, virou-se calmamente para Felipe. Seus olhos pousaram sobre ele como se o analisassem peça por peça, e sua voz saiu clara:
— Posso ajudar?
Felipe piscou algumas vezes, desnorteado.
— O... o quê?
— O que deseja? — repetiu ela, direta.
Seu coração acelerou. Essa era a brecha que precisava. Ele inflou o peito, ajeitou os ombros e sorriu de maneira confiante.
— Estou apenas... admirando sua beleza exótica — declarou, com orgulho.
O silêncio que se seguiu foi desconfortável. Amalha manteve a expressão neutra, sem rubor, sem sorriso, sem sequer desviar o olhar. Era como se estivesse analisando uma equação.
Felipe, incomodado, resolveu se exibir de outra forma. Afinal, se as palavras não bastavam, talvez os gestos discretos falassem mais alto.
Enquanto fingia prestar atenção ao livro, começou a dobrar lentamente as mangas da camiseta, revelando os braços definidos. A cada movimento, fazia questão de tensionar discretamente os músculos, como quem estica sem motivo. Fingiu ajeitar a postura, contrair o abdômen, alongar os ombros. Tudo calculado para parecer casual.
Ele então deixou cair propositalmente a caneta no chão. Quando se abaixou para pegá-la, flexionou o braço de forma exagerada, ressaltando os bíceps. Ao voltar à posição, lançou um olhar rápido para Amalha, certo de que ela havia notado sua “força disfarçada”.
— Você sabe — começou, em voz baixa, tentando soar casual —, muitos dizem que a disciplina não está só nos estudos, mas também no corpo. Eu, por exemplo, treino bastante.
Amalha o observou em silêncio, os olhos percorrendo brevemente os músculos que ele tanto se esforçava para destacar. Quando falou, sua voz foi cortante, mas ainda polida:
— Interessante. Mas exibir força de forma disfarçada em plena aula não é disciplina, é distração.
Felipe sentiu o rosto esquentar, mas não desistiu. Forçou um sorriso.
— Bom, nem todo mundo consegue fazer várias coisas ao mesmo tempo. Eu consigo estudar e cuidar do corpo. — Estufou novamente o peito. — Não é qualquer um que tem essa capacidade.
Ela piscou devagar, como quem pondera se valia a pena responder. E então, friamente:
— Felicito sua confiança. Mas inteligência e caráter sustentam muito mais que músculos. — Apoiou a mão no caderno, voltando sua atenção ao texto. — Se é só isso, por favor, me deixe continuar a aula.
Aquelas palavras foram como um golpe silencioso. Felipe sentiu o ar escapar dos pulmões. Pela primeira vez em muito tempo, sua confiança pareceu fraquejar.
Sem escolha, levantou-se e voltou para sua carteira. O andar, antes cheio de segurança, agora parecia pesado, derrotado.
Assim que se sentou, Hikaru, que havia assistido à cena como quem vê uma comédia ao vivo, começou a rir.
— Eu avisei, Felipe! — disse, entre gargalhadas. — Você não consegue todas, não.
Kauro, mais contido, deixou escapar um meio sorriso.
— Tentativa corajosa. Mas previsível.
Felipe escondeu o rosto entre as mãos, tentando manter a pose, mas o rubor denunciava sua derrota.
Amalha, por sua vez, simplesmente virou a página do livro e seguiu a leitura, como se nada tivesse acontecido.
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Atualizado até capítulo 27
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