A nova garota

O início de ano na Escola Particular Rubros tinha sempre o mesmo ritual.

O portão principal se abria e dezenas de jovens atravessavam-no com pressa, alguns sozinhos, outros em pequenos grupos barulhentos, carregando mochilas novas e expectativas renovadas. O prédio imponente, de arquitetura clássica, com colunas altas e janelas largas de vidro, refletia o sol da manhã, como se orgulhasse de receber mais uma geração. O jardim frontal, impecavelmente podado, exibia flores vivas em contraste com o uniforme branco e vermelho dos alunos.

Dentro dos corredores, o ar vibrava. As vozes juvenis ecoavam pelos azulejos claros: risadas, cochichos, reencontros, promessas de um ano inesquecível. Havia quem corresse, quem arrastasse mochilas pesadas, quem distribuísse abraços apertados. O som metálico das carteiras sendo arrastadas se misturava ao tilintar de canetas novas e ao cheiro de papel recém-impresso — aquele aroma característico dos livros que ainda não haviam sido manuseados.

Na sala do terceiro ano, o barulho era ainda maior.

Hikaru, sempre expansivo, gesticulava no centro do grupo como se fosse o apresentador de um programa de TV. Seu melhor amigo, Felipe, ria alto de cada exagero, completando as histórias com comentários ainda mais absurdos.

— Eu juro, você devia ter visto a cara dele! — dizia Hikaru, rindo tanto que mal conseguia continuar. — Parecia que tinha levado um choque!

Felipe caiu na gargalhada, inclinando-se para trás na cadeira.

— Um choque? Cara, ele quase desmaiou! Se não fosse eu, a ambulância teria vindo!

O grupo ao redor ria junto, contagiado pela energia dos dois. Era sempre assim: onde Felipe e Hikaru estavam, havia movimento, bagunça, vida.

Mas nem todos compartilhavam desse entusiasmo.

Um pouco afastado, sentado de forma relaxada, estava Kauro. Diferente dos amigos, ele raramente se deixava levar pela euforia. Observava mais do que falava. Seus olhos castanhos, por trás dos óculos, analisavam a sala como quem procura algo escondido. Rostos conhecidos, expressões repetidas, nenhuma novidade que chamasse sua atenção. Respirou fundo, decepcionado, e encostou-se na carteira, deixando o olhar subir ao teto branco.

"Mais do mesmo...", pensou.

A rotina parecia previsível demais.

Foi nesse instante que a porta se abriu.

Um rangido suave, quase despercebido, interrompeu por um momento o burburinho da sala. Alguns colegas voltaram a cabeça, curiosos. Outros nem notaram. Mas Kauro… ah, este ergueu os olhos de imediato, como se tivesse pressentido algo.

E então a viu.

A nova garota.

Ela entrou com passos lentos, sem pressa, como se o tempo tivesse um ritmo próprio só para ela. Não parecia nervosa, como os alunos novos costumavam estar. Também não demonstrava a confiança espalhafatosa dos que desejam chamar atenção. Não. Ela era diferente. Misteriosa.

Seus olhos não buscaram ninguém, não procuraram um sorriso acolhedor, nem mesmo mediram os olhares curiosos ao redor. Seguia reta, indiferente, como se os outros não existissem. Seu uniforme estava impecavelmente alinhado, sem um fio de cabelo fora do lugar. Os óculos realçam os olhos grandes e atentos, mas que naquele momento estavam fixos apenas no vazio à frente.

Ela caminhou até a terceira fileira, bem na frente, e sentou-se. Ajeitou o caderno sobre a mesa com precisão, alinhando-o perfeitamente com a borda, como se a ordem fosse uma extensão natural de sua personalidade. Depois, simplesmente cruzou as mãos e ficou em silêncio.

Houve um breve murmúrio no fundo da sala.

— Quem é ela? — sussurrou uma das meninas, curiosa.

— Nova aluna, talvez. — respondeu outra, sem dar muita importância.

E logo voltaram às próprias conversas.

Felipe e Hikaru, é claro, estavam ocupados demais discutindo sobre quem havia jogado melhor no último campeonato de férias.

Mas Kauro… Kauro não conseguiu desviar os olhos.

Havia algo nela que o desconcertava. Não era apenas a postura impecável ou a maneira calculada como havia se sentado. Era o silêncio. Um silêncio que parecia gritar.

Ele inclinou-se um pouco para frente, ajustando os óculos, como se assim pudesse enxergar melhor. Analisava cada detalhe, como fazia com todas as pessoas que chamavam sua atenção. O jeito como ela apoiava as mãos, sem ansiedade. O modo como mantinha a cabeça erguida, sem arrogância. A calma fria de quem não precisava provar nada a ninguém.

"Ela não é como os outros."

Seu coração acelerou um pouco, não de paixão — Kauro não era ingênuo ao ponto de confundir sentimentos tão rápido —, mas de curiosidade. Ele adorava mistérios. E ali, diante de seus olhos, havia um dos maiores que já surgira em sua rotina.

Por alguns segundos, esqueceu até dos amigos ao lado. O riso de Felipe e Hikaru se tornou apenas um eco distante, sem importância. A sala inteira parecia dissolver-se ao redor, até que restaram apenas ele e a nova garota.

Ela, no entanto, não parecia notar.

Nem mesmo levantou os olhos. Como se já soubesse o suficiente sobre todos e, ao mesmo tempo, não se importasse em saber mais.

Kauro franziu a testa, apoiando o queixo sobre a mão.

*"Será que ela é tímida? Não… tímidos olham para os lados, buscam segurança. Confiante, então? Também não. Os confiantes gostam de ser notados. Ela não é nem uma coisa nem outra."*

A campainha soou, chamando os alunos à ordem.

O professor ainda não havia entrado, mas o burburinho diminuiu aos poucos. Alguns abriram cadernos, outros ajeitaram os uniformes. A nova garota, porém, já estava pronta desde o início, como se tivesse se adiantado ao ritual.

Felipe cutucou Kauro no ombro, finalmente percebendo que o amigo estava em silêncio demais.

— Ei, o que foi? Tá viajando de novo?

Kauro piscou, despertando de seus pensamentos.

— Nada… — respondeu, curto.

Felipe ergueu uma sobrancelha, mas logo desistiu de insistir. Voltou a rir de alguma piada de Hikaru.

Kauro, entretanto, voltou o olhar à frente. E lá estava ela, imóvel, inatingível. Um enigma envolto em silêncio.

"Quem é você?"

A pergunta ecoava dentro dele como se fosse mais importante do que qualquer outra coisa naquele momento.

Mais populares

Comments

Achewalt

Achewalt

Não consigo parar de pensar na história, precisa continuar! 🤩

2025-08-25

2

Ver todos

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!