O peso do passado

Depois daquela noite, eu deveria ter esquecido Adrian Blackthorne.

Deveria ter enterrado sua voz, seus olhos e a sensação sufocante que ele deixara em mim. Mas não consegui.

Havia algo nele que me perseguia em cada sombra, em cada silêncio. Eu fechava os olhos e ainda sentia o calor de sua respiração tão próxima da minha. As palavras dele ecoavam como um aviso impossível de apagar: “Você vai se perder em mim.”

Talvez eu já tivesse começado.

Duas noites depois, voltei ao mesmo lugar. Não sabia se por impulso, teimosia ou uma necessidade que me corroía por dentro. Parte de mim queria respostas; a outra parte só queria vê-lo de novo, mesmo que isso custasse caro demais.

A antiga mansão Blackthorne erguia-se no alto da colina, como um fantasma que se recusava a desaparecer. Janelas fechadas, cortinas pesadas, um portão de ferro enferrujado que parecia mais uma barreira simbólica do que real. A cidade inteira a evitava. Eu, ao contrário, atravessava seus portões com a respiração presa e o coração acelerado.

Ele estava me esperando. Eu sabia.

Quando a porta se abriu, não precisei de palavras. Adrian estava ali, imponente, com a mesma aura de perigo e mistério. O casaco negro caía sobre seus ombros como uma segunda pele, e seu olhar cinzento pareceu me despir até a alma.

— Você não aprende, não é? — Sua voz soou fria, mas havia um traço de algo escondido, como se minha presença o incomodasse e o atraísse ao mesmo tempo.

— Talvez eu não queira aprender — respondi, tentando soar firme, embora minha voz denunciasse o turbilhão dentro de mim.

Um músculo em sua mandíbula se contraiu, e, por um instante, vi algo além da máscara. Cansaço. Dor. Um fardo invisível que ele carregava com orgulho e raiva.

— Você não entende quem eu sou, Elena — disse, mais baixo. — Nem o que significa estar perto de mim.

— Então me faça entender. — Minhas palavras saíram rápidas, como se eu tivesse medo de que, se demorasse, perderia a coragem. — Me diga por que todos têm medo de você.

Adrian riu, um som sem humor, quase amargo.

— Porque eles sabem o que eu carrego. O nome Blackthorne é uma maldição. Onde quer que um de nós vá, a destruição segue.

Ele deu as costas, caminhando até uma estante de madeira antiga. Pegou uma garrafa de uísque, serviu-se e ficou em silêncio por alguns segundos antes de continuar:

— Meu pai morreu de forma brutal. Minha mãe… nunca se recuperou. Meu irmão desapareceu sem deixar rastros. E eu… sobrevivo. Só isso.

A maneira como ele disse sobrevivo doeu mais do que qualquer ameaça.

— Isso não explica por que você me conhece — sussurrei, incapaz de esconder minha inquietação.

Ele virou-se, e seu olhar cinzento se acendeu como lâmina.

— Eu conheço você porque estive observando muito antes de você perceber.

Meu estômago se revirou. Parte de mim deveria ter se assustado com aquilo. Mas outra parte — a parte mais perigosa — se sentiu desejada. Como se eu fosse importante de uma maneira que ninguém nunca me fizera sentir antes.

Adrian se aproximou lentamente, deixando o copo sobre a mesa. A cada passo, o ar parecia mais pesado, mais denso. Quando parou diante de mim, estava perto o suficiente para que eu sentisse a vibração de sua presença.

— Eu deveria afastar você. — Seus olhos queimavam. — Mas não consigo.

E, antes que eu pudesse responder, sua mão roçou minha pele pela primeira vez. Um toque breve, quase hesitante, mas que incendiou cada parte do meu corpo.

Foi nesse instante que compreendi: a escuridão não apenas responde quando você a chama. Ela envolve, prende e nunca devolve.

E eu já estava dentro dela.

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Comments

StarJustStar

StarJustStar

O autor(a) conseguiu me transportar para dentro da história.

2025-08-22

1

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