O Mistério de Amanda

Andrew não conseguia tirar Amanda da mente.

Desde a primeira vez que a vira na livraria, havia algo nela que o desarmava. Não era apenas a beleza discreta, nem o rosto angelical iluminado pelo reflexo das prateleiras de madeira antiga. Era o contraste entre a suavidade dos gestos e a força silenciosa dos olhos escuros, olhos que pareciam conter histórias que ninguém nunca tivera coragem de ouvir.

Ele, um homem acostumado a controlar cada detalhe da própria vida, agora se via refém de uma curiosidade que beirava a obsessão. Quem era Amanda, além da mulher que recomendava livros com tanta paixão?

Naquela noite, sentado em sua sala ampla e fria, cercada de obras de arte que pouco significavam para ele, Andrew deixou que o silêncio o consumisse. O copo de uísque descansava intacto sobre a mesa. Pela primeira vez em muito tempo, não conseguia se distrair com contratos, reuniões ou cifras.

Pegou um dos livros que Amanda havia indicado, O Morro dos Ventos Uivantes. Abriu-o ao acaso e encontrou uma anotação em grafite na borda de uma página. Pequena, quase imperceptível, mas sua.

"O amor é tão selvagem quanto o vento."

Ele sorriu, encantado pela intensidade daquela frase. Era como se Amanda tivesse deixado uma parte de si dentro do livro, e agora ele a carregava consigo.

Nos dias seguintes, Andrew passou a tomar caminhos diferentes em seus trajetos pela cidade. Quase sem perceber, seus passos o levavam para perto da livraria, mas ele não entrava. Preferia observar de longe, através da vitrine embaçada pelo frio da manhã. Via Amanda organizar pilhas de romances, atender clientes, sorrir de forma educada, mas sempre com aquela melancolia discreta que ninguém parecia notar.

Às vezes estacionava o carro na rua oposta, apenas para vê-la fechar a loja ao entardecer. Amanda trancava a porta, ajeitava o casaco e caminhava sozinha pela calçada até a pequena casa no fim da rua. Não havia pressa em seus passos, mas havia uma solidão evidente, que Andrew captava de imediato.

Certa noite, ele pediu ao motorista que diminuísse a velocidade. As luzes da casa estavam acesas, e pela janela pôde vê-la sentada à mesa, lendo sob o brilho suave de uma lâmpada amarela. Havia uma xícara ao lado, vapor ainda subindo, e o silêncio parecia envolvê-la como um velho hábito.

Não havia luxo, apenas simplicidade. Mas o ambiente parecia mais vivo do que qualquer salão dourado que ele já habitara.

Andrew encostou-se no banco do carro, fechando os olhos. Estava decidido. Precisava descobrir quem era Amanda, não apenas como livreira, mas como mulher. E faria isso aos poucos, sem pressa, como quem desdobra página por página de uma história que se recusa a ser lida às pressas.

Porque ele sabia, no fundo, que aquela era a única história que realmente importava

A noite em que Andrew observou Amanda através da janela de sua casa não lhe saiu da mente. Havia algo naquela cena simples — a mulher curvada sobre um livro, com uma xícara de chá ao lado e a luz amarela iluminando seus cabelos negros — que o perturbava mais do que qualquer reunião milionária, mais do que qualquer disputa por contratos, mais do que os jogos de poder que sempre haviam alimentado seu espírito competitivo.

Amanda se tornara, para ele, um enigma vivo.

Nos dias seguintes, Andrew percebeu que havia criado um novo hábito, quase ritualístico. Saía de seus compromissos no centro da cidade, mas orientava o motorista a tomar o caminho mais longo, passando pela rua da livraria. Não entrava. Não ousava quebrar o delicado equilíbrio que havia se formado entre eles — ou melhor, entre ele e a imagem que fazia dela. Limitava-se a observar de longe, a espiar o reflexo de Amanda no vidro da vitrine, como se ela fosse uma pintura que jamais deveria ser tocada.

De dentro do carro, Andrew via Amanda se movimentar com uma graça natural. Organizava livros, falava com clientes, às vezes ria, mas era um riso breve, quase contido, que logo se dissolvia em silêncio. Essa contenção intrigava Andrew. Em seus círculos sociais, ele estava acostumado a mulheres que falavam alto, que buscavam atenção, que sabiam como girar a sala a seu favor. Amanda não. Ela parecia existir em um ritmo diferente, quase intocado pelo mundo.

E justamente por isso, chamava tanto sua atenção.

O contraste entre mundos

Na mesma noite em que observou Amanda de longe pela primeira vez, Andrew foi forçado a comparecer a um evento de gala. Salão espelhado, luzes douradas, mulheres cobertas de joias, homens em ternos impecáveis. Conversas fúteis se misturavam ao tilintar de taças de champanhe. Tudo, absolutamente tudo, lhe pareceu vazio.

Enquanto ouvia um investidor comentar sobre as vantagens de um novo empreendimento, Andrew se pegou lembrando do gesto de Amanda ao ajeitar os cabelos atrás da orelha. Enquanto uma socialite desfilava em frente a ele com o último vestido importado de Paris, Andrew só conseguia pensar no casaco simples que Amanda usava para voltar para casa ao entardecer.

O contraste era brutal.

Era como se o mundo de Amanda fosse feito de silêncio, de páginas de livros, de pequenos rituais cotidianos — e o dele fosse feito de ruído, de ostentação, de máscaras. Pela primeira vez em muito tempo, Andrew começou a se perguntar se sua vida realmente tinha algum sentido, além de cifras e aparências.

Primeiras descobertas

Andrew não podia simplesmente entrar na livraria e puxar conversa. Não queria parecer invasivo, nem apressar um destino que, em seu íntimo, sentia que precisava ser saboreado com calma. Mas também não podia ficar apenas com as imagens parciais que colhia de longe. Precisava de mais.

Foi então que começou sua investigação discreta.

— Michael — disse ele certa manhã ao motorista, enquanto o carro cruzava a rua ainda pouco movimentada. — A livraria na esquina… você sabe quem é a dona?

O motorista olhou rapidamente pelo retrovisor, surpreso com a pergunta. Andrew nunca demonstrava curiosidade sobre nada que não fosse ligado a negócios.

— Acredito que seja uma jovem chamada Amanda, senhor. Já a vi algumas vezes. A livraria não é muito movimentada, mas ela parece cuidar sozinha do lugar.

— Sozinha? — Andrew repetiu, como se a palavra tivesse um peso inesperado.

— Sim. Não sei muito mais, senhor. É uma mulher discreta.

Discreta. A palavra parecia ter sido criada para descrevê-la.

Nos dias que seguiram, Andrew arriscou novas perguntas, mas sempre de forma indireta. No café ao lado da livraria, ouviu dois clientes comentarem que Amanda era apaixonada por literatura inglesa. Noutro dia, ao passar pela banca de jornal próxima, escutou uma senhora dizer que a moça era “de uma bondade rara, mas sempre muito sozinha”.

Essas pequenas migalhas de informação não satisfaziam Andrew; ao contrário, apenas aumentavam sua fome de conhecê-la melhor. Era como montar um quebra-cabeça onde as peças nunca eram suficientes para revelar a imagem completa.

A observação silenciosa

Algumas noites, Andrew estacionava a alguns metros da casa de Amanda, sempre de longe, escondido pela sombra das árvores. Via a rotina dela se repetir: o jantar simples, a leitura na mesa, às vezes um rádio ligado em volume baixo. Nunca havia visitas. Nunca havia vozes além da dela.

Essa solidão o incomodava de uma forma que não sabia explicar. Ele próprio conhecia bem a solidão, ainda que a sua fosse diferente — rodeada de gente, mas sempre vazia. A solidão de Amanda, em contrapartida, parecia mais pura, quase resignada, como se ela já tivesse feito as pazes com ela.

Certa vez, enquanto a observava fechar as cortinas, Andrew sentiu um aperto no peito. Não era apenas desejo. Era algo mais profundo, mais raro. Um reconhecimento.

Memórias e reflexos

Em sua mansão, Andrew começou a reparar no quanto seu lar lhe parecia desprovido de vida. Cada sala era maior que a casa inteira de Amanda, mas nenhuma tinha o calor daquela luz amarela que iluminava sua mesa de jantar.

Ele se lembrava de seu passado, da infância rígida, do pai ausente e da mãe sempre ocupada em eventos sociais. Cresceu em meio a riqueza, mas nunca experimentou simplicidade. E agora, pela primeira vez, sentia-se atraído não apenas por uma mulher, mas pelo mundo que ela representava.

Um mundo que parecia inalcançável para alguém como ele.

Um encontro por acaso

Numa tarde fria, Andrew passou pela rua e viu Amanda ajudando uma senhora idosa a carregar sacolas de compras. O gesto não lhe surpreendeu; Amanda parecia exatamente o tipo de pessoa que faria aquilo. Mas havia algo em sua expressão — uma doçura genuína, um sorriso sem afetação — que o desarmou.

Ele permaneceu dentro do carro, apenas observando. A senhora agradeceu e Amanda sorriu mais uma vez, ajeitando uma mecha de cabelo atrás da orelha.

Andrew fechou os olhos, respirando fundo. Sentia como se estivesse se apaixonando por alguém que ainda era, de certa forma, uma estranha.

A promessa silenciosa

Naquela noite, Andrew não conseguiu dormir. Passou horas andando pela sala, o livro de Amanda aberto em suas mãos. As palavras escritas à margem, “O amor é tão selvagem quanto o vento”, ecoavam em sua mente.

Ele sabia que não poderia permanecer para sempre como um observador à distância. O desejo de conhecê-la de verdade crescia a cada dia, mas junto vinha o medo: e se, ao se aproximar, quebrasse a delicadeza daquele mistério?

Mas uma coisa estava clara para Andrew: Amanda já não era apenas uma mulher desconhecida. Ela era a história que ele ansiava para viver.

E, em silêncio, prometeu a si mesmo que descobriria quem ela realmente era — página por página, gesto por gesto, até que nenhum segredo restasse entre eles.

Mais populares

Comments

Scar

Scar

O jeito que a autora escreve é simplesmente maravilhoso.

2025-08-21

0

Ver todos

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!