O mundo parecia girar, mas eu sabia que não era tontura. Era o peso de tudo o que tinha acontecido, e do que eu ainda via diante dos meus olhos.
Thanus surgiu pela janela como um raio negro, o corpo se lançando sobre o outro cão com uma fúria que eu nunca tinha visto. Os dois rolaram no chão, dentes à mostra, rosnados cortando o ar. Meu coração batia tão forte que doía.
E então vi Leonardo. Ele não era o primo que conheci nas tardes tranquilas da infância, nem o homem que passava pelas salas da mansão com aquele silêncio seguro. Ele era mortal. Cada movimento dele era rápido, preciso, carregado de ódio. Juan não tinha chance.
A voz do meu pai me puxou de volta.
— Bella! — Ele chegou como uma muralha, ajoelhando-se para cortar as cordas que me prendiam. Senti suas mãos firmes, mas cuidadosas, segurando meus ombros como se pudesse me proteger até do ar.
Eu não conseguia falar. Só ouvia minha respiração entrecortada e o som seco de golpes atrás de mim. Quando percebi, estava nos braços dele, sendo carregada para fora do casarão.
O ar frio da noite bateu no meu rosto, mas não trouxe paz. Cada passo que ele dava parecia ecoar na minha cabeça, junto com os estalos dos choques, o rosnado do cachorro e o gosto metálico do sangue que vi.
Quando chegamos ao carro, meu corpo reagiu antes de eu entender. Me soltei de seus braços e me inclinei para o lado, apoiando as mãos na porta. O vômito veio rápido, doloroso, como se cada lembrança saísse junto.
Meu pai ficou ali, a mão no meu ombro, sem dizer nada. Ele sabia. Não havia palavra capaz de apagar o que aconteceu naquela sala.
— Coloca para fora filha, aquele maldito vai pagar, vamos ao médico ver este hematoma, e vamos para casa, sua mãe está uma pilha. — falou ele segurando meu cabelo.
— Lucca, vamos levar ela? Eles terminam lá. — falou tio Giovanni. — você está bem, minha princesa?
Eu respirei fundo, ainda sentindo o gosto amargo, e olhei para trás. Leonardo estava na porta do casarão, ofegante, as mãos manchadas. E quando nossos olhos se encontraram, não precisei ouvir nada para saber: ele tinha feito o que prometeu.
Eu estava viva. E ele tinha me salvado.
— Estou bem tio, graças a vocês, vamos pai, minha cabeça dói e ainda sinto os choques. — falei e ele entrou do outro lado.
O carro parecia andar mais rápido do que o normal, mas, ao mesmo tempo, cada quilômetro parecia durar horas. Eu estava no banco de trás, encostada no ombro do meu tio, que não parava de me segurar como se eu pudesse desaparecer a qualquer momento.
A ida ao hospital foi rápida, o nome sempre abriu portas e com três pontos no rosto e carregando um trauma seguimos para casa.
As ruas familiares da cidade começaram a surgir e, pela primeira vez desde que tudo começou, senti que podia respirar um pouco mais fundo. Quando entramos pelo portão da mansão, as luzes já estavam acesas.
Minha mãe correu aliviada, seu abraço foi consolo. Minhas tias nos esperavam na porta, e o abraço delas foi como um cobertor quente depois de uma noite fria demais.
Passamos as primeiras horas em silêncio. Chá quente, cobertores e mãos segurando as minhas, como se isso pudesse manter as lembranças afastadas. Eu me deixei ficar ali, no sofá, ouvindo as vozes baixas delas falando sobre qualquer coisa que não fosse o que aconteceu.
Foi quase madrugada quando ouvi o barulho de motores do lado de fora. Meu coração acelerou sem que eu pudesse evitar. Leonardo entrou primeiro, seguido por meu pai, meu tio Lucca e os outros que provavelmente falavam sobre o acontecido na rua. Ele estava sério, o olhar direto em mim.
Levantei-me devagar e caminhei até ele. Não pensei, apenas o abracei com força, sentindo o cheiro dele, a firmeza dos braços ao meu redor.
— Obrigada… — murmurei, a voz falhando. — Obrigada por me salvar.
Ele afastou o rosto o suficiente para me olhar nos olhos. Eu vi que ele ia dizer algo, talvez algo que eu queria ouvir há muito tempo, mas não… não agora.
Afastei-me um passo e balancei a cabeça.
— Não. — Minha voz saiu baixa, mas firme. — Eu só… agradeci. Acabou aqui. Você não me deve nada, Leonardo. Nenhuma dívida.
O silêncio entre nós foi denso, quase palpável. Ele apenas me observou por alguns segundos, o maxilar contraído, antes de dar um passo para trás.
Voltei para o sofá, entre minha mãe e minhas tias, enquanto ele seguia com os outros para o escritório. Mas, mesmo ali, cercada pelo calor da família, eu sabia que as palavras que não deixei ele dizer ainda estavam no ar, pesando sobre nós dois.
O silêncio na sala depois que todos saíram era estranho. Eu estava enrolada no cobertor, mas o frio vinha de dentro. Minha mãe sentou-se ao meu lado, e meu pai ficou de pé, encostado na mesa, como se quisesse me dar espaço e, ao mesmo tempo, me manter perto.
— Bella… — mamãe começou, a voz baixa — o que você sente pelo Leonardo… você sabe que não precisa esconder de nós.
Meu coração deu um salto doloroso. Olhei para o chão, mexendo no tecido do cobertor entre os dedos.
— Eu… — respirei fundo — eu sinto, mãe. Sinto desde que me entendo por gente.
Papai deu um passo à frente, a expressão séria.
— Já aconteceu alguma coisa? — perguntou, direto.
Levantei os olhos para ele, firme.
— Não. Nunca. Ele nunca… — engoli em seco — ele nunca deixou.
Mamãe suspirou, quase como quem já sabia a resposta.
— Bella… às vezes, o inevitável não se pode negar.
Balancei a cabeça, apertando o cobertor contra o corpo.
— Eu não quero. Não quero mais viver com isso. Quero ir para Paris, viver a minha vida.
Papai cruzou os braços, medindo minhas palavras. Mamãe trocou um olhar rápido com ele antes de falar:
— Só… espera. Espera até resolvermos o problema na Espanha. Depois que estiver recuperada, se ainda quiser ir, vai. Mas até lá… pensa. Fugir de um amor não resolve nada.
— Mãe… — minha voz falhou, quase num sussurro — esse amor só me machuca.
Ela pousou a mão sobre a minha, com um olhar suave, mas firme.
— Então aprende a lutar contra ele. Ou… a lutar por ele. Mas não foge.
Fiquei em silêncio, sentindo o peso de cada palavra. Lá fora, ouvi passos pesados nos jardins, Leonardo e os outros estavam ali. E, só de ouvir, percebi como minha decisão de fugir talvez fosse muito mais difícil do que parecia.
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Atualizado até capítulo 35
Comments
Irene Saez Lage
Estou curtindo demais este casal maravilhoso que ainda não se decidiu assumir de um vez o amor que sente
2025-08-18
2
Leitora compulsiva
o amor e mais forte, mesmo indo para outro lugar, se ela não for forte não vai da em nada
2025-08-19
0
Eliane Pampolini
Eu acho que eles deveriam lutar por esse amor ♥️♥️♥️
2025-08-20
0