Enzo narrando.
Eu nunca gostei do primeiro dia de ninguém. Funcionários novos me irritam. São inseguros, lentos, cometem erros estúpidos e sempre precisam que alguém os guie como se fossem crianças aprendendo a andar. O pior de tudo é que eu já perdi as contas de quantas secretárias passaram pela minha frente. Todas juravam que eram competentes, dedicadas, organizadas, mas não duravam um mês. Algumas sequer duas semanas. Outras pediam demissão depois de uma bronca mais dura. E, sinceramente, eu nunca fiz questão de segurá-las. Gente fraca não serve para trabalhar ao meu lado.
A diferença hoje é que aquela garota atrapalhada da recepção, a tal Isabela Mendes, conseguiu a proeza de me chamar atenção pela forma errada logo na primeira vez em que a vi. Parecia perdida no próprio corpo, tropeçando em nada, mas ainda assim sorriu para mim como se o mundo fosse cor-de-rosa. Quem em sã consciência chega atrasada em uma entrevista e ainda sorri? Patético. Mas, de algum modo, aquilo me fez parar por alguns segundos. Ela não parecia levar nada a sério, e esse é o tipo de gente que me tira do sério.
Quando Roberto entrou na minha sala trazendo-a pela primeira vez, percebi de imediato que a confusão dela não tinha sido apenas impressão. Ela abriu a porta como quem invade, quase esbarrando na mesa. Tentava parecer confiante, mas era nítido o quanto estava nervosa.
Isabela: Bom dia, senhor.
O tom de voz era educado, porém trêmulo, como se a qualquer momento fosse tropeçar nas próprias palavras. Eu me encostei na cadeira e fiquei observando, impassível.
Enzo: Sente-se.
Ela se moveu rápido demais, a cadeira quase derrapou para trás, e o barulho ecoou pela sala. Eu respirei fundo, buscando paciência.
A entrevista foi um desastre anunciado. Ela falava sem pensar, tropeçava nos termos mais simples, se enrolava com as frases e, em certo momento, começou a rir. Sim, rir. No meio de uma resposta séria sobre sua experiência profissional, ela simplesmente riu do próprio nervosismo. Eu a encarei como se ela tivesse perdido completamente o juízo.
Isabela: Desculpe, eu rio quando fico nervosa.
Era óbvio. E era irritante.
Poderia tê-la dispensado ali mesmo. Mas havia algo naquela garota que me deixava curioso, mesmo contra a minha vontade. Talvez fosse o contraste dela comigo, tão leve, doce e, bonitinha. Sim, bonitinha, mas isso não significava nada. Bonita não paga contas. Bonita não organiza minha agenda. Bonita não segura a pressão que eu coloco sobre meus funcionários.
Enzo: Está contratada.
O olhar dela se arregalou, surpresa. Ela parecia não acreditar.
Isabela: Sério?
Enzo: Sério. Mas não se iluda, Mendes. O inferno começa agora.
E o sorriso dela se apagou só um pouco, mas logo voltou. Ridículo. Ela não fazia ideia no que estava se metendo.
O primeiro dia dela foi exatamente como eu previ: um caos.
Ela chegou cedo, o que pelo menos me poupou de ter que dar um sermão logo pela manhã. Usava roupas simples, nada exagerado, mas dava para notar que tinha se esforçado para parecer profissional. O problema era que a confiança dela se esfarelava no primeiro detalhe. Esbarrou na mesa da recepção, quase deixou cair uma pilha de papéis que não eram dela e ainda se atrapalhou com o crachá de acesso.
Eu observava de longe, de dentro da minha sala, pela parede de vidro. O jeito estabanado dela poderia até ser engraçado, mas para mim era apenas mais um sinal de incompetência.
Roberto, o meu braço direito, pareceu se compadecer dela. Claro, Roberto sempre foi paciente demais com quem não merece. Vi os dois conversando perto da copiadora, e percebi Isabela rindo. Rindo outra vez. Aquilo me incomodava. Gente que ri demais durante o expediente me dá nos nervos.
Ela se aproximou da minha sala algumas horas depois, trazendo uma bandeja com café. O simples ato de atravessar a porta se transformou em espetáculo. Quase tropeçou no tapete, mas conseguiu se recompor rápido.
Isabela: Café, senhor Valentin.
Colocou a bandeja na mesa, mas o copo fez um barulho alto ao tocar a superfície. Eu levantei os olhos do computador e a encarei.
Enzo: Você pretende derrubar ou servir?
Ela ficou vermelha, quase engasgou com a própria saliva.
Isabela: Me desculpe, foi o nervosismo.
Enzo: Nervosismo não tem espaço aqui.
Ela assentiu, mordendo o lábio. E, claro, eu percebi. Mais um detalhe inútil que minha mente registrava sem que eu quisesse.
O resto do dia seguiu no mesmo ritmo. Dei ordens simples, e ela se atrapalhou em todas. Pedi que organizasse minha agenda, e ela confundiu dois horários. Solicitei um relatório impresso, e ela esqueceu de verificar a última página. Quando a chamei de volta, não escondi a irritação.
Enzo: Mendes, você consegue seguir instruções simples ou precisa que eu desenhe para você?
Ela respirou fundo, claramente tentando se manter firme.
Isabela: Eu consigo, senhor. Só foi uma distração.
Enzo: No meu escritório, distrações custam caro.
Ela baixou os olhos por um segundo, mas logo levantou o queixo e respondeu com calma.
Isabela: Não vai acontecer de novo.
A firmeza dela me surpreendeu. A maioria das mulheres que ocuparam essa cadeira já teria pedido demissão depois de duas broncas. Mas Isabela… parecia feita de uma teimosia irritante.
No final do dia, quando eu esperava encontrar um semblante cansado ou derrotado, lá estava ela, ainda sorrindo para Roberto, como se tivesse sobrevivido a uma maratona. O sorriso era sincero, leve, completamente fora de lugar em um ambiente como o meu.
E eu me peguei pensando, contra qualquer lógica, que talvez fosse exatamente esse sorriso que tornava impossível ignorá-la.
Mas eu não estava ali para reparar em sorrisos. Estava ali para ter resultados. E se Isabela Mendes não conseguisse acompanhar o ritmo, não duraria mais que as outras.
Enzo: Amanhã quero sua mesa organizada antes das oito. E traga o relatório correto na primeira hora.
Ela respondeu com um aceno firme.
Isabela: Pode deixar, senhor Valentin.
E, para minha própria irritação, terminou a frase sorrindo.
O inferno realmente tinha começado, mas, pela primeira vez, eu não tinha tanta certeza de quem sairia queimado no final.
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Atualizado até capítulo 80
Comments
Leitora compulsiva
o inferno vai ser pra ele rsrrsrsrrs brigando internamente por uma pessoinha que é o oposto dele, mais que não sai da sua cabeça 🤭🫣🤣
2025-08-22
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