Me chamo Enzo Valentin, tenho 34 anos. Desde que me entendo por gente, meu pai sempre soube exatamente o que queria para mim. Não havia espaço para sonhos próprios, dúvidas ou hesitações. O caminho foi traçado antes mesmo de eu nascer. Ele queria um herdeiro capaz de administrar e expandir o império da família, e eu me tornei exatamente isso. Não porque eu quis, mas porque não havia outra escolha. Cresci ouvindo que sentimentos eram fraquezas, que amizades eram riscos e que confiar em alguém era assinar a própria sentença.
Segui esse roteiro com perfeição. Estudei nos melhores colégios, me formei nas melhores universidades, me tornei o CEO mais jovem da história da empresa do meu pai. O sucesso, para mim, não foi uma opção, foi uma obrigação. E eu cumpri essa obrigação com disciplina quase militar. A minha vida era organizada, previsível e controlada, até o dia em que ela entrou.
Não vou falar sobre ela. Não é algo que me agrada lembrar. Apenas digo que foi a única mulher capaz de me fazer acreditar que talvez a vida fosse mais do que contratos e cifras. E foi também a responsável por me provar que tudo isso não passa de ilusão. Depois dela, tudo perdeu a cor. O que antes era prazer em fechar negócios se tornou rotina mecânica. O que antes era paciência se transformou em impaciência. Me tornei frio, calculista e, segundo alguns, insuportável.
Parte disso se deve ao fato de que não confio mais em ninguém. Principalmente em quem trabalha para mim. Já perdi as contas de quantas secretárias passaram pela minha sala. Todas inúteis. Algumas não aguentaram a pressão, outras cometeram erros imperdoáveis. E hoje, mais uma vez, lá estava eu, prestes a perder meu tempo com mais uma entrevista.
Meu assistente, Roberto, dizia que dessa vez havia boas candidatas. Eu não acreditava. Já havia ouvido isso antes. Para mim, todas pareciam iguais: currículo bonito, sorriso ensaiado, eficiência inexistente.
A manhã estava arrastada, e eu precisava de um pouco de ar antes da próxima reunião. Saí para frente do prédio, encostei na parede de vidro e fiquei observando as pessoas passarem. Eu gostava desse momento. O silêncio antes da tempestade. Meus olhos analisavam rostos, posturas, gestos. Era quase um exercício.
Foi então que a vi. Correndo como se a vida dependesse disso, com o cabelo bagunçado e um semblante que misturava pressa e desespero. Ela vinha tentando manter a dignidade, mas era visível que não estava conseguindo. Trazia uma pasta nas mãos e desviava das pessoas na calçada como quem estava em um campo minado. Por um instante, me perguntei se era possível que ela fosse a candidata que eu entrevistaria. Esperava encontrar mais uma mulher de postura impecável, saltos firmes e olhar calculado. Não alguém que parecia ter acabado de perder a luta contra o próprio despertador.
Ela parou a poucos passos de mim. Ficou alguns segundos olhando, como se não soubesse se deveria falar ou passar direto. Eu, por outro lado, mantive minha postura calma e entediada. Por dentro, já concluía que, se aquela era a minha próxima secretária, não duraria uma semana. Ainda assim, havia algo curioso nela.
Isa: Oi, oi! Bom dia!
A voz saiu meio apressada, meio nervosa. Ela acenou de forma desajeitada e eu ergui uma sobrancelha, permitindo um sorriso quase imperceptível.
Enzo: Você está bem?
Ela respirou fundo, tentando recuperar o fôlego.
Isa: Sim, claro, estou ótima. Só atrasada.
A forma como disse isso, como se quisesse parecer no controle e falhasse completamente, me fez quase rir. Quase. Ainda assim, meu julgamento inicial não mudou. Mais uma incompetente. Mas até que era bonitinha.
Observei-a por alguns segundos. Ela estava com as bochechas coradas, não sei se pela corrida ou pela vergonha. Os olhos, mesmo ofegantes, eram vivos. Não era o tipo de beleza calculada que eu estava acostumado a ver. Era algo mais... natural. Mas beleza, para mim, não servia de nada quando o assunto era trabalho. Eu queria eficiência, precisão, frieza. E não alguém que chegava atrasada na própria entrevista.
Ela, claramente desconfortável com o meu olhar, murmurou algo e seguiu para dentro do prédio. Fiquei ali por alguns instantes, observando-a entrar. Não sei explicar o motivo, mas uma pequena parte de mim se perguntou como seria tê-la como secretária. Uma parte ainda menor se perguntou se ela conseguiria aguentar mais de uma semana.
A verdade é que não importava. Para mim, entrevistas eram testes de sobrevivência. E na maioria das vezes, as candidatas se eliminavam sozinhas. Era só questão de tempo até cometerem o primeiro erro. E eu estava acostumado a cortar pela raiz qualquer problema antes que se tornasse maior.
Voltei para dentro do prédio, minha expressão voltando ao seu habitual estado sério e impassível. Roberto me encontrou no corredor e disse que a próxima candidata já estava chegando. Eu apenas assenti, sem demonstrar nenhum interesse especial.
Enzo: Traga o currículo dela para minha mesa.
Roberto: Sim, senhor.
Subi para minha sala, sentei-me na poltrona e fiquei olhando pela parede de vidro para a cidade. Lá embaixo, tudo parecia pequeno, correndo em seu próprio ritmo. Pensei na garota de instantes atrás. Na forma como parecia deslocada, como se aquele ambiente fosse grande demais para ela. Isso, normalmente, seria um motivo para eu descartá-la imediatamente. Mas havia algo ali, talvez a mesma teimosia que eu vi no meu próprio reflexo anos atrás, antes de me tornar quem sou hoje.
A porta se abriu e Roberto entrou com a pasta.
Roberto: Aqui está o currículo da senhorita Isabela Mendes.
Peguei o papel, passei os olhos pelas informações. Boa formação, algumas experiências interessantes, mas nada que me fizesse acreditar que ela fosse diferente das outras. Ainda assim, havia algo curioso. Talvez fosse só a minha memória recente do encontro lá fora.
Fechei o currículo e deixei-o sobre a mesa.
Enzo: Vamos ver se ela é tão atrapalhada quanto parece.
Enquanto aguardava que Roberto a conduzisse até minha sala, recostei-me na cadeira. Não esperava muito dela. Na verdade, esperava nada. Mas, por algum motivo, estava curioso para ver o que aconteceria a seguir.
E essa curiosidade, para alguém como eu, já era mais do que suficiente para transformar uma simples entrevista em algo, interessante.
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Atualizado até capítulo 80
Comments
Leitora compulsiva
me vejo todinha nela rsrrsrs, é querido essa atrapalhadas que fazem sua vida virar do avesso hahahahhaha
2025-08-22
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