olhos sobre mim

Já era outro dia, sol rachando na laje, movimento normal no Jacarezinho. Lobão acordou cedo, rotina de quem comanda uma guerra silenciosa todo dia. Já tinha feito a ronda, trocado ideia com os chefes de ponto e dado esporro em um vacilão que deixou o plantão sem vigia. No morro, cochilar é dar chance pro inimigo avançar, e isso ele não aceitava.

— Se tu quer dormir, pede pra sair! — ele gritou no miolo, voz firme, olhar de aço. — Aqui não tem moleza, porra. Aqui é guerra todo dia!

Depois, já de mente mais fria, acendeu um. Sentado no canto da laje, com a vista pra favela que ele comanda com pulso e respeito, puxou o baseado e abriu o Instagram fake. Nome falso, sem foto, conta fria só pra observar. Vida de procurado é isso: não pode dar vacilo, mas também não pode ficar cego.

Foi então que ele lembrou da garota. Aquela do vídeo.

Bruna.

A dancinha ainda rondava a cabeça dele desde a noite anterior. Abriu o perfil de novo, dessa vez com calma. Stalkeou cada post, cada story salvo, cada legenda. Cabelo preto escorrido até o quadril, corpo que parecia esculpido, olhos verdes tipo pedra preciosa. E um detalhe chamou atenção: em vários vídeos, o fundo era o próprio Jacaré.

— Como é que essa gata mora aqui e eu nunca vi?

Aquilo cutucou o orgulho dele. Lobão conhecia cada canto da favela, cada rosto, cada nome. Mas Bruna... era novidade. E que novidade.

Desceu mais o feed até ver um story marcado: @Estiloepoder. Um salão pequeno, mas bem falado ali na parte baixa do morro. Era ali que ela trabalhava como manicure e fazia extensão de cílios.

Lobão não pensou duas vezes. Troca de roupa rápida, boné enfiado na cara, bermuda larga e camisa neutra. Subiu na moto com um dos fiéis e foi até a frente do salão.

Parou do outro lado da rua, disfarçado, só observando.

E lá estava ela.

Bruna. De pertinho, ainda mais bonita que nos vídeos. Pele lisa, sorriso calmo, olhar doce. Atendia uma cliente com delicadeza, sem nem sonhar que o chefão da favela tava ali, sentado na moto, observando.

Lobão tragou o baseado devagar, sem desviar o olhar.

— Caralho... essa mulher é surreal — murmurou, sem perceber.

Mas manteve a postura. Nada de abordagem precipitada. Ele era Lobão, o rei do Jacarezinho. Quem manda não corre atrás — mas também não ignora o que quer. E naquele momento, ele sabia: ia ser dela. Mais cedo ou mais tarde, ela ia sentar no trono também.

Só não sabia que o jogo ia ser muito mais perigoso do que ele imaginava.

Bruna

Era mais um dia comum no Studio Estilo e poder aquele calor abafado do Jacarezinho batendo pela porta entreaberta, ventilador girando preguiçoso no teto e o cheirinho de acetona misturado com café forte na caneca da Lari. Bruna tava ali, focada, terminando o acabamento da unha de uma cliente, quando ouviu a voz da amiga sussurrando baixo no canto da orelha:

— Bru... cê jura que não viu quem tava te olhando agora pouco?

Ela franziu o cenho, sem entender.

— Que porra é essa, Lari? Tá falando de quê?

Lari, com aquele jeitinho fofoqueiro e assustada ao mesmo tempo, se inclinou ainda mais perto:

— Era o Lobão, Bruna. O próprio. Tava parado na moto do outro lado da rua, te encarando. Juro por Deus, mano. Até congelei quando vi.

Bruna gelou na hora. O nome Lobão não era qualquer nome. Fazia o sangue dela correr mais rápido, mas não de tesão — era medo mesmo. Medo e mágoa.

— Tá maluca, Lari... — ela falou baixo, tentando manter a mão firme na cliente. — Deve ter olhado na tua direção, só. Ele nem sabe quem eu sou.

— Ah, sei — Lari retrucou rápido. — Tu acha que eu não sei diferenciar quando um homem tá só olhando e quando ele tá secando? Ele tava te vendo, Bruna. Parado, de boa, só fumando um, te observando direto.

Bruna terminou o último detalhe da unha, tentando engolir o nervoso. Disfarçou, levantou e foi até o fundo do salão pegar um creme, só pra respirar.

No caminho, a cabeça dela já tava fervendo.

“Lobão? O mesmo que meu pai serviu por anos? O mesmo que meu pai idolatrava como se fosse rei? Aquele que prometeu que se alguma coisa acontecesse, ia olhar pela nossa família?”

Mas quando o pai dela foi morto numa troca de tiro, ela e a mãe ficaram à míngua. Nada de ajuda, nada de respeito. Só o silêncio da boca de fumo e o esquecimento.

Ela voltou pro balcão, jogou o creme com força na mesinha e falou baixo, só pra Lari ouvir:

— Ele não tava olhando pra mim. E se tava... azar o dele. Eu não sou dessas não.

Lari se calou, mas deu aquele sorrisinho de quem viu o que viu. Bruna tentou ignorar, mas por dentro, o coração tava uma bagunça.

Porque se era verdade...

Se Lobão tava mesmo olhando pra ela...

Ela sabia que nada ia ser simples daqui pra frente.

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Comments

jeovana❤

jeovana❤

estranho sera que alguém escondeu sobre a família do soldado ou sera que a mãe dela que ñ quis aceitar ajudar dele pq ela ñ gostava do envolvido do marido com o tráfico

2025-09-23

0

Leitora compulsiva

Leitora compulsiva

vixi bru vai virar uma lobinha🤭🤭

2025-08-16

0

Marineide

Marineide

Cadê a foto da Bruna?😊

2025-08-15

0

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