Ivaiporã, Paraná.
O ar da noite de sexta-feira em Ivaiporã tinha o cheiro de fim de semana: uma mistura do vapor dos espetinhos nas praças e do asfalto úmido de uma chuva passageira de fim de tarde. Para Agustín, de dezenove anos, era o som da liberdade. O som de desligar o computador da loja de eletrônicos onde trabalhava e caminhar para casa sem pressa, com os fones de ouvido tocando uma melodia qualquer que abafava o ruído do mundo.
Ele virou na Rua Jacarezinho, uma via residencial tranquila, onde as luzes das casas começavam a acender, pintando os muros com quadrados de luz amarela. O céu, acima, era um gradiente de azul-marinho a um laranja pálido no horizonte. Foi então que ele notou.
No fim da rua, a parede de um sobrado antigo, que ele sabia ser de um tom desbotado de pêssego, não estava da cor certa. Não era uma sombra ou um truque de luz do pôr do sol. A cor era... errada. Um magenta vibrante e elétrico, tão saturado que parecia zumbir baixo, uma cor que doía aos olhos e que não pertencia ao mundo físico, como um erro de renderização vazado da tela de um computador. A cor pulsava suavemente, uma única vez.
Agustín parou, tirando os fones de ouvido. O som ambiente voltou — um cachorro latindo ao longe, o zumbido de um poste. Ele piscou, esperando que a imagem se corrigisse. Mas a mancha magenta persistia, sólida e impossível.
Ele esfregou os olhos, um gesto instintivo na esperança de apagar a imagem. Abriu-os novamente. A mancha continuava lá, sólida, zombando da lógica. Não havia como registrar aquilo, nenhuma forma de provar. A experiência era unicamente sua.
Seu coração começou a acelerar. A primeira reação foi culpar o cansaço, um truque da luz do poste, qualquer coisa. Mas a lógica se esfarelava a cada segundo. O problema não estava em seus olhos. Estava na própria rua.
Como se percebesse que estava sendo observado, a cor anômala vacilou. Por uma fração de segundo, a textura da parede pareceu se desfazer em um mosaico de pixels pretos e magenta antes de estalar de volta à sua cor e forma normais. Tudo voltou a ser como sempre fora. A parede era pêssego. O céu era laranja e azul. O cachorro ainda latia.
Mas o silêncio que ficou na mente de Agustín era mais alto que qualquer ruído. Ele ficou parado, olhando para o fim da rua. O mundo parecia o mesmo, mas a sensação de solidez havia desaparecido, substituída por uma fragilidade aterrorizante, como se ele tivesse acabado de ver uma rachadura na tela da realidade.
Ele engoliu em seco, o ar agora parecendo mais frio. Lentamente, ergueu o olhar para o céu, onde a primeira estrela da noite começava a brilhar, indiferente. E, perto dela, um crescente fino e prateado começava a sua vigília. A Lua. Pela primeira vez na vida, a Lua não lhe pareceu um símbolo de tranquilidade, mas sim outro objeto frágil no céu. Um objeto que, como a parede do sobrado, poderia a qualquer momento ser reescrito numa cor que não deveria existir.
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Atualizado até capítulo 53
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