LIAM
Eu odeio cruzeiros.
Odeio o mar, odeio o balanço constante do navio, odeio ficar preso por dias em alto-mar cercado por turistas barulhentos e gente sorrindo à toa como se estivesse num comercial de margarina. Mesmo que, tecnicamente, eu só vá ficar três dias aqui — o suficiente apenas para fazer minha obrigação e parecer um bom anfitrião para o Edmond.
Como se não bastasse o tédio iminente, estou sem meu assistente. O Igor praticamente implorou para ir à maldita festa da minha família. E como sou um chefe razoável (às vezes), deixei. Resultado? Estou sozinho aqui, cercado de gente que não me interessa e de compromissos que eu não pedi.
Caminho pelo convés com as mãos nos bolsos, tentando não parecer tão deslocado quanto me sinto. Está quase vazio, o que não me surpreende — a maioria dos passageiros foi para a festa temática que está acontecendo no salão principal. Os poucos gatos pingados que ainda circulam por aqui são claramente os antissociais da vez: gente que prefere o som do mar ao som de gente bêbada dançando "Dancing Queen".
Alguns são funcionários — chefs de cozinha, pelo visto, dando uma escapada rápida antes da próxima rodada de pratos. Outros parecem apenas querer silêncio, o que, por um instante, até me agrada.
...❤️...
Desço para a sala onde está acontecendo a aula com o Chef Clear. O cheiro de ervas frescas e manteiga queimada no ponto certo invade o corredor antes mesmo que eu entre. Mas, assim que cruzo a porta, dou de cara com um rosto familiar.
Thabita.
Por um instante, esqueço completamente da aula, do cruzeiro, e até do motivo de eu estar ali. Ela está de costas, mas mesmo assim é impossível não reconhecê-la. A postura elegante, o jeito sutil como movimenta as mãos enquanto organiza os utensílios... é inconfundível.
Se há algo bom que posso dizer sobre o Agustín — e olha que não costumo ter muito a elogiar — é que ele, ao menos, teve excelente gosto. Thabita sempre me pareceu esplêndida. Não sei dizer se é a pele negra e radiante, os olhos amendoados que carregam uma calma cativante, o cabelo negro ondulado que ela usa com naturalidade ou o fato de que, quando sorri, é como se os olhos brilhassem junto.
Nunca deixei de reparar nela.
Claro, mantive a compostura — ela era a namorada do meu filho, afinal. Mas havia algo nela que sempre me chamou atenção. Presença. Força silenciosa. Classe.
Quando Agustín me contou que eles haviam terminado, confesso que fiquei... desapontado. Não por ele — Agustín nunca mereceu uma mulher como ela. Ele vive tão centrado em si, em suas próprias dores e frustrações, que nunca percebeu o valor do que tinha ao lado.
Fiquei triste por mim. Porque, com o fim do namoro, achei que não a veria mais. E perder a chance de ter Thabita por perto, mesmo que só de longe, sempre me pareceu uma perda maior do que ele foi capaz de compreender.
THABITA
Ouço com atenção cada palavra do chef Clear. A maneira como ele segura a faca, os cortes precisos, o respeito quase cerimonial com cada ingrediente… é hipnotizante. Ele trata os legumes como obras de arte, e a carne como um tesouro que exige técnica e paciência. É impossível não admirar a paixão que ele coloca em cada movimento. Uma aula tão rica que quase me fez esquecer onde estou.
Quase.
Assim que tudo termina, decido subir para o convés. O sol já começa a descer no horizonte, deixando o céu num tom alaranjado que beira o dramático. Mas não é o pôr do sol que me prende.
É aquele olhar.
De longe, sinto quando ele me vê. Como se houvesse algo invisível me puxando na direção dele. Meus olhos percorrem o espaço e então o encontro — Liam Caccini.
Os cabelos castanhos levemente desalinhados pelo vento, os olhos verdes que parecem sempre esconder mais do que mostram, e a barba rala que só acentua o charme maduro e perigoso que ele carrega com tanta naturalidade. Está encostado de forma quase displicente, com um sorriso preguiçoso nos lábios — o tipo de sorriso que não pede licença para invadir pensamentos.
Ele sorri. E, por instinto, eu retribuo. Um gesto curto, quase automático, mas que me expõe mais do que gostaria.
Desvio o olhar e sigo em direção a uma das mesas mais afastadas, onde pretendo jantar sozinha, com calma. Ou pelo menos era essa a intenção.
Porque mesmo de longe, mesmo sem uma palavra trocada, o ambiente já não é o mesmo. É como se a presença dele carregasse peso, cor e temperatura. O ar fica mais denso, o silêncio mais cheio de possibilidades.
O pai do meu ex-namorado. Só essa frase já seria suficiente para me manter longe. Mas com Liam... nunca foi tão simples assim.
Ele sempre teve um olhar que beirava o indecente quando se dirigia a mim — mas não era vulgar. Era algo mais sofisticado, perigoso, como se ele soubesse exatamente o efeito que causava. E pior: como se soubesse que eu gostava.
Ele nunca escondeu esse interesse. E eu... nunca fui tão boa em ignorar.
Porque, convenhamos, não estamos falando de qualquer homem. Estamos falando de Liam Caccini.
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Atualizado até capítulo 25
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