Flores queimadas

Narrado por Neji Hyuuga

A missão não foi longa, mas o corpo sentia como se tivesse atravessado uma guerra. Quatro dias fora de Konoha, carregando no ombro o peso constante da responsabilidade — e, no fundo, outro peso mais silencioso, que nada tinha a ver com o campo de batalha.

Tenten.

Nossa última conversa não havia terminado bem. Não era incomum discutirmos — ela tinha um temperamento firme, e eu, uma teimosia que herdara do sangue Hyuuga. Mas dessa vez, as palavras ficaram afiadas demais. Ela havia me acusado de frieza; eu a acusei de distração. E, como sempre, nos afastamos sem resolver nada.

Enquanto caminhava pelas ruas de Konoha, a luz suave do entardecer caía sobre os telhados, e pensei no quanto odiava deixar as coisas assim. Nunca fui um homem de gestos românticos — não precisava ser. Mas dessa vez… talvez fosse necessário. Talvez ela merecesse um sinal de que eu não queria que aquela briga fosse o último capítulo.

Foi quando passei por uma pequena floricultura na rua lateral. O cheiro doce escapava pela porta aberta, e o impulso me fez parar. As cores vivas das pétalas pareciam destoar do resto do dia, e por um instante, imaginei Tenten segurando um buquê. O sorriso que ela daria, o brilho nos olhos. O tipo de coisa que não admito em voz alta, mas que guardo para mim.

Escolhi lírios brancos e rosas vermelhas — uma combinação de paz e intensidade. Talvez fosse piegas, mas não importava. Paguei, agradeci à senhora que embrulhou as flores com cuidado, e segui em direção ao apartamento dela.

A cada passo, a exaustão parecia pesar menos. Eu não costumava fazer surpresas, mas a ideia de vê-la abrir a porta e esquecer a discussão me dava uma estranha sensação de… esperança.

Subi os degraus do prédio com calma, ouvindo o som distante de risadas vindo de outras janelas abertas. Ao chegar ao corredor, algo me chamou a atenção. A porta do apartamento dela estava encostada — não o suficiente para parecer abandono, mas também não trancada como de costume. Meu primeiro instinto foi achar que ela havia se esquecido. Mas então ouvi.

Um som abafado. Um gemido.

Fiquei imóvel por um segundo, os músculos tensos, como se o corpo tentasse decidir entre entrar ou recuar. Não queria pensar no que poderia significar. Me forcei a acreditar que ela talvez estivesse treinando com alguém, ou machucada. Mas então veio outro som. Mais claro. Mais íntimo. Não havia como confundir.

O ar no corredor parecia rarefeito. Meu peito subia e descia devagar, controlando a respiração como se estivesse prestes a entrar numa emboscada. O buquê, que antes me parecia um símbolo de reconciliação, agora pesava nas minhas mãos como um fardo inútil.

Empurrei a porta com cuidado, o suficiente para abrir uma fresta. O cheiro foi a primeira coisa que me atingiu — suor e algo mais, um perfume adocicado que não vinha das flores.

Dei mais um passo. E então vi.

Tenten estava ali, o corpo coberto apenas por lençóis desalinhados, os cabelos soltos colados à pele úmida. Ao lado dela, Rock Lee — sem a faixa na cabeça, respirando com força, o olhar cravado nela como se o mundo se resumisse àquele momento. A cama, o desarranjo, o silêncio carregado de um ato recém-consumado… tudo falava mais alto que qualquer palavra.

O som do meu próprio pulso foi o único que ouvi. Não houve explosão de raiva, nem grito. Apenas uma sensação de algo quebrando por dentro, tão profunda que quase não fez barulho. Eu sabia exatamente o que estava vendo. E, por mais que o corpo quisesse recuar, meus pés ficaram presos ao chão.

Tenten me viu primeiro. Os olhos dela se arregalaram, a boca se abriu para dizer algo, mas nada saiu. Lee se virou em seguida, um sobressalto evidente no rosto. Ele tentou se levantar, mas a vergonha o prendeu à cama.

— Neji… — ela começou, a voz trêmula. — Eu… não é o que parece.

Dei uma risada curta, sem humor.

— Não é? — perguntei, minha voz baixa, cada sílaba carregada de um gelo que eu mesmo não reconhecia.

— Nós… — ela tentou se cobrir melhor, evitando meu olhar. — Foi um erro.

— Um erro — repeti, mais para mim do que para ela. — Curioso como erros exigem tempo, oportunidade e… escolha.

Lee abriu a boca para falar, mas ergui uma mão. Não queria ouvir.

— Não tenho interesse em ouvir justificativas. — mantive o tom firme, quase calmo. — Só preciso deixar claro que… isso não tem volta.

O silêncio entre nós era mais pesado do que qualquer batalha que já enfrentei. Tenten abaixou a cabeça, talvez em vergonha, talvez em arrependimento. Mas, naquele momento, não importava. Tudo que eu tinha sentido por ela se recolhia, como um mar que, ao recuar, deixa para trás apenas pedras afiadas.

Olhei para o buquê nas minhas mãos. O papel delicado, as cores vivas, o cuidado com que havia sido montado. Passei os dedos pelas pétalas uma última vez e, sem dizer nada, deixei-o cair no chão do quarto. As flores tombaram lentamente, algumas pétalas se soltando, espalhando-se pelo tatame.

Sem esperar resposta, me virei e saí, fechando a porta com um clique suave. Mais suave do que o que eu sentia por dentro.

O caminho até a mansão Hyuuga foi longo. Não porque a distância fosse grande, mas porque cada passo parecia pesar mais que o anterior. A noite havia caído completamente, e as ruas estavam vazias. Eu caminhava com as mãos nos bolsos, sentindo ainda o perfume das flores no tecido da minha roupa, misturado ao gosto amargo da traição.

Ao atravessar os portões da mansão, não cumprimentei ninguém. Subi direto para meu quarto, fechei a porta e me sentei no chão. Não havia lágrimas. Apenas um silêncio denso, quase confortável, que preenchia o espaço onde antes havia qualquer coisa por Tenten.

Naquele instante, entendi algo simples:

A guerra fora das muralhas é brutal, mas previsível. A guerra dentro de nós é silenciosa, e não avisa quando vai começar.

E, para mim, ela tinha acabado de começar.

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