O relógio da biblioteca marcava quase quatro da tarde quando Kate entrou. A sala parecia retirada de um sonho antigo — ou de um pesadelo elegante.
Paredes forradas por livros em línguas que ela mal conhecia. O cheiro de madeira envelhecida e couro tomava o ar, misturado ao som distante de trovões. Lá fora, a tempestade ameaçava cair a qualquer instante.
Ela foi até uma das janelas, observando a névoa densa que cobria o jardim. Cada canto daquela mansão parecia esconder uma história... ou um segredo.
— Está mais pontual do que imaginei.
A voz surgiu atrás dela, profunda, grave, como um sussurro que tocava a pele.
Kate se virou. Era ele. Dante Moreau.
Vestia preto. Camisa parcialmente desabotoada. Um terno perfeitamente ajustado ao corpo, mas sem gravata. A luz da biblioteca desenhava sombras em seu rosto forte, de queixo marcado e olhos escuros demais para serem lidos com facilidade.
— Esperar em silêncio é melhor do que ouvir promessas vazias — ela respondeu.
Dante arqueou uma sobrancelha, com um leve sorriso.
— Está me provocando, senhorita Vasconcellos?
— Apenas sendo sincera.
— Gosto disso. Mas sinceridade tem um preço alto nesta casa.
Ele se aproximou lentamente, como quem já sabia que ela não fugiria. E Kate, mesmo tensa, não deu um passo atrás.
Não queria demonstrar medo.
E, estranhamente, também não queria recuar.
— Você sempre chega assim? — ela perguntou. — Como uma tempestade?
— E você sempre tenta se esconder atrás de perguntas?
O silêncio entre os dois foi cortado apenas pela chuva que começava a bater contra os vitrais da janela.
Kate cruzou os braços.
Dante continuava a observá-la como se cada gesto dela fosse parte de um enigma. E talvez fosse.
— Por que eu? — ela perguntou mais uma vez. — Por que me escolheu para esse trabalho?
— Porque você conhece a dor.
— Isso não é uma resposta.
— É a única que importa.
Ele andou até uma estante e puxou um livro antigo. O couro estava desgastado, com o nome quase ilegível.
— Este livro foi escrito por um homem que amava tanto a esposa... que a envenenou para não perdê-la.
Kate ficou imóvel.
— Isso é amor pra você? — sussurrou.
Dante se aproximou com o livro ainda nas mãos.
— Isso é obsessão. A forma mais pura e destrutiva de amar.
Os olhos dele ardiam em algo entre atração e um tipo de loucura elegante. Ele parou diante dela, estendendo o livro.
— Leia. Ou não. Mas se ficar aqui, Kate... vai precisar entender a diferença entre paixão e sobrevivência.
Ela pegou o livro com as mãos trêmulas. Por fora, estava firme. Por dentro, tudo nela era confusão.
Por que ele falava com tanta intensidade? Por que cada palavra parecia uma promessa não dita?
— Você parece conhecer bem essas emoções — ela murmurou.
— Eu vivi cada uma delas. E você?
Kate abaixou os olhos.
Sim. Ela também conhecia. Dor, medo, desejo... cicatrizes.
— Eu vim aqui por recomeço.
— Você veio aqui porque não tinha mais pra onde correr.
Dante se inclinou, a boca próxima demais da dela, mas sem tocá-la. O calor de sua presença era insuportavelmente viciante.
— E nesta casa, Kate… nada é o que parece.
Ela sentiu um arrepio subir pela espinha. Queria se afastar, mas seus pés não se moviam.
— Qual é a sua intenção comigo? — ela arriscou.
— Nenhuma. Ainda. Mas isso depende de você.
Ele então se virou e foi até a porta. Antes de sair, sem olhar para trás, deixou cair a frase que ficaria martelando na mente dela por dias:
— Não tente me entender. Tente sobreviver a mim.
A porta se fechou atrás dele com um estalo seco.
E ali, sozinha com o livro venenoso em mãos e o coração em chamas, Kate entendeu: ela tinha cruzado uma linha da qual não havia volta.
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Atualizado até capítulo 30
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