Línguas de Veneno

A capital de Aeloria erguia-se como uma miragem de mármore e ferro diante dos olhos de Seraphina. Torres pontiagudas cortavam o céu como adagas, e muralhas antigas envolviam a cidade como braços protetores — ou grilhões, dependendo de quem a observasse.

Ela mantinha a postura reta enquanto a carruagem se aproximava do portão leste. Cael, ao seu lado, retirava o capuz e vestia um novo disfarce: o de diplomata exilado. Um nome falso, documentos falsos, mas o mesmo olhar que a fazia sentir que estava sendo lida por dentro.

Os guardas nem questionaram. Um deles chegou a se curvar — curvar-se para um homem que se dizia apenas mensageiro.

Seraphina percebeu. E ficou mais certa de que aquele homem ao seu lado era mesmo o príncipe Cael.

Assim que cruzaram os portões, ela foi tomada por sons e cheiros novos. Multidões andavam pelas ruas de pedra polida, onde mercados fervilhavam com barracas de especiarias, tecidos, amuletos, pombas pretas e frutas douradas.

Mas o que mais lhe chamou atenção foi a atmosfera: não de paz, mas de vigilância. Cada rosto que sorria parecia esconder medo. Cada risada parecia forçada.

— Estamos sendo seguidos — disse ela, baixo.

— Sempre estamos — murmurou Cael, sem virar o rosto.

Ao fim da tarde, chegaram à casa de um velho aliado — ou assim Cael dizia.

E foi aí que ela o conheceu.

Thorne, o Informante.

> Thorne era um homem de aparência comum — e isso o tornava perigoso. Pele clara, cabelos curtos e barba por fazer. Suas roupas estavam limpas demais para um simples trabalhador, e seus olhos claros demais para serem honestos. Mas o que mais impressionava era sua voz: baixa, arrastada, como quem sempre sabe mais do que diz. Ao vê-lo, Seraphina sentiu o estômago revirar. Ali estava alguém que não confiava em ninguém — nem em si mesmo.

— Alteza — disse Thorne, em sussurro, ao ver Cael. — Nunca pensei que teria coragem de voltar.

— A coragem nunca me faltou — respondeu ele, com um sorriso.

Thorne riu, mas seus olhos estavam vazios.

— E quem é ela?

— Uma aliada — disse Cael.

Seraphina o encarou de lado. Aquele título não lhe agradava. Ela não era uma aliada. Era a lâmina escondida. A rosa de veneno.

Durante a reunião, Thorne revelou informações que mudaram tudo.

— A família real está dividida. O rei adoece e o Conselho busca um sucessor. Mas... há rumores. De que alguém do sangue real vive. Escondido. Preparando o retorno.

Seraphina congelou.

Estavam mesmo atrás de Cael.

Thorne então lançou um olhar direto a ela.

— E cuidado, Alteza... sua "aliada" tem olhos de cobra.

Seraphina não piscou.

— E você tem olhos de rato. O que me faz confiar ainda menos.

Um momento de silêncio pesou no ar.

Cael não os interrompeu. Queria ver até onde iam.

Thorne sorriu, divertido.

— Vai ser interessante ver como isso termina.

Quando saíram da casa, Cael falou:

— O que achou dele?

— Útil. Mas não confiável.

— Isso o torna perfeito para este jogo.

Naquela noite, no quarto alugado de uma estalagem nobre, Seraphina observava os papéis que roubara discretamente da casa de Thorne.

Um deles mostrava a planta interna do palácio real.

Outro... um nome.

Lady Evelyne.

Ela sublinhou o nome com a unha.

— Você será meu próximo passo — sussurrou.

Mas não sabia que, do outro lado da cidade, alguém também tinha o nome Seraphina escrito em tinta preta num pergaminho dobrado.

E que esse alguém... havia começado a caçá-la.

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