capítulo 04

Longe dali, escondida no silêncio das montanhas, havia uma verdade que ninguém ousava desafiar.

O governo sabia.

Sabia há décadas.

Sabia da existência daqueles seres resistentes, velozes, letais.

Uma alcateia Lycan. Dezesseis machos.

Criaturas que, em forma humana, enganavam qualquer um. Lindos, fatais, com corpos densos como soldados de guerra e rostos que mais pareciam talhados por deuses antigos. Mas havia algo de profundamente errado neles — uma energia animal que não podia ser disfarçada.

Eles raramente saíam de suas tocas. E quando saíam, sumiam entre as sombras da floresta como parte da própria natureza. A equipe de vigilância, acampada a poucos quilômetros dali, tentava há meses capturar imagens, estudar seus rastros, entender sua dinâmica.

Sabiam que qualquer erro seria uma sentença de morte.

Naquele dia, o vento mudou.

Uma corrente úmida atravessou as árvores, desceu pelas pedras, infiltrou-se nas grutas.

Um cheiro novo.

Doce. Quente. Feminino. Vivo.

Na caverna mais funda, os olhos se abriram.

O Alfa — o mais velho, o mais forte, o mais letal — levantou devagar, farejando o ar. Seu corpo musculoso se contraiu como o de um animal em caçada. Os outros começaram a rosnar baixo, se inquietando nas sombras.

Ele ergueu a cabeça. Sentiu de novo.

Estava ali.

A Bruma havia chegado.

O nome saiu em um murmúrio baixo, quase reverente.

— Bruma.

Foi o suficiente. A alcateia se calou.

Eles sabiam o que isso significava.

A presença dela mudava tudo.

Não era apenas o cheiro. Era o rastro energético. Algo ancestral se movia por dentro deles.

Na hierarquia Lycan, Bruma não era só uma fêmea qualquer. Era um sinal.

Era um chamado.

Naquela noite, o plano começou a ser traçado.

Eles iriam até ela.

Com precisão. Com fome. Com destino.

E Lya, mesmo distante, sentada em frente à lareira com uma taça de vinho nas mãos, não fazia ideia do que estava prestes a acontecer.

O clima era tenso.

Sempre foi. Mas agora, era diferente.

Algo os havia inquietado.

Algo novo, fresco, feminino.

Os sensores da equipe haviam detectado movimentação incomum — padrões que indicavam patrulhas maiores, rastros mais próximos da área habitada por civis. As gravações sonoras noturnas registraram uivos abafados e longos, carregados de um tom que ninguém da equipe havia escutado antes.

Eles pareciam… em alerta. Famintos. Atentos.

Como se algo que eles vinham esperando por séculos… finalmente tivesse cruzado a fronteira do território deles.

Dra. Elena Voss, líder da equipe científica, sabia o que isso significava.

> — Eles farejam. Eles sentem. Muito antes de qualquer satélite — murmurou ela, observando os gráficos no monitor com as mãos frias.

No interior da montanha, entre as raízes e as rochas, a alcateia estava se movimentando. Silenciosa. Coordenada. Viva.

Base de observação – encosta sul da montanha.

Os drones subiam todos os dias, religiosamente. Quase sempre voltavam com dados inúteis — pegadas fundas no barro, rastros circulares entre as pedras, às vezes um borrão térmico que mal servia pra análise. Outros simplesmente desapareciam. Nenhum som. Nenhum sinal.

Naquela tarde, a Dra. Elena Voss observava as telas com o cenho franzido. Ao lado dela, o assistente Jorn fazia anotações em silêncio, até não aguentar mais.

— Eles não são humanos, doutora. Isso tá cada vez mais claro.

Ela assentiu sem tirar os olhos da imagem ampliada de uma pegada gigantesca.

— O comportamento social deles é completamente diferente. Caçam em grupos pequenos. Comem carne crua. O Alfa e o Beta são figuras dominantes, mas o posto de Beta vive em disputa. Sempre tem desafio. Sangue. Fratura. Submissão.

Jorn ficou em silêncio por um momento, depois perguntou:

— E as fêmeas? Vocês já viram alguma?

Elena respirou fundo antes de responder.

— Não podemos afirmar com certeza, mas… pelos padrões que estudamos, eles só se relacionam com fêmeas da própria espécie. E mesmo assim, há rivalidade. Alguns se afastam da alcateia pra evitar o conflito. Escolhem viver sozinhos. Mais calmos, menos violentos.

— E com mulheres humanas?

Ela hesitou. Depois respondeu com um tom seco:

— Quando encontram grupos humanos... eles matam os homens.

E comem as mulheres.

Mas deixam uma parte intacta.

Jorn olhou pra ela sem entender.

— O útero.

Eles nunca tocam o útero. — completou ela, sem emoção na voz.

Silêncio.

O ar na barraca pareceu mais pesado.

Um dos soldados da equipe, deitado em uma cadeira improvisada, soltou uma risada nervosa.

— Vocês são malucos. Meter a gente nessa missão suicida...

Se um desses monstros cruzar com a gente no meio da trilha, não sobra nem os ossos.

E essas armas? — apontou para o fuzil encostado na parede — Isso aí não faz nem cócega neles, né?

Elena apenas ajeitou os óculos e respondeu sem alterar o tom:

— Tudo pela ciência, meu caro.

O silêncio voltou, mas dessa vez cheio de tensão.

Todos sabiam que alguma coisa estava mudando.

E ninguém ali se sentia seguro.

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