Chego em casa exausta, jogo as chaves na mesinha da entrada e tiro o tênis. Mal piso na sala, lá está ela: esparramada no sofá como uma diva aposentada, uma pantufa em formato de coelho numa perna e a outra já caída no chão, com uma cara cínica digna de vilã de novela mexicana.
— Você não tem jeito, né? — digo, e antes que ela possa se defender, pulo em cima dela no sofá como se fôssemos duas crianças de novo.
— Ei, sua maluca! Vai derrubar minha pipoca! — Ela tenta proteger o balde como se fosse um troféu olímpico.
— Que novela é essa? — pergunto enquanto me acomodo ao lado, já pegando um punhado da pipoca.
— Uma onde a mocinha ainda não aprendeu que tem que parar de sobreviver e começar a viver — ela me lança um olhar afiado, jogando um punhado de pipoca em mim.
— Ai! — faço drama, colocando a mão no peito. — Essa doeu, magoou mesmo!
— Era a intenção! — responde com um sorriso debochado.
Reviro os olhos e vou até a cozinha pegar uma água.
— Chata! — resmungo de longe.
— Ingrata! Agora me conta: como foi o dia com os dois bonitões? Porque olha... eu no seu lugar, já tinha dado umas mordidinhas — ela grita da sala, com segundas intenções escancaradas no rosto.
Volto com a garrafa na mão e arqueio a sobrancelha.
— Acredita que o Davi teve a audácia de perguntar de você?
Ela se ajeita toda no sofá como se fosse uma estrela prestes a entrar em cena.
— Qual o problema? Eles gostam das mais experientes. Temperadas. Com pimenta e história! — diz, piscando.
— Tia, chega! — rio, balançando a cabeça. — Mas falando sério... o outro bonitão, o que você sabe que eu gosto... ele vai me buscar sábado.
Ela se levanta tão rápido do sofá que a pantufa voa.
— É o quê?! COMO ASSIM? O que eu perdi?! — Seus olhos brilham mais do que o glitter da sombra mal passada.
— Calma, não é nada disso. É só um evento de carros esportivos. Um compromisso da empresa. Ele disse que viria me buscar às oito. Só isso.
— E o que você disse?! — Ela se aproxima com uma expressão de ultraje teatral.
— Eu recusei, claro.
— VOCÊ É DOIDA, GAROTA?! Foi isso que eu te ensinei?
— Ai, tia... É complicado. Ele é meu chefe. E é... o Lorenzo.
Ela coloca as mãos na cintura, fazendo aquela pose que só ela sabe.
— Isso é verdade. Mas olha, pra amor... sempre damos um jeito, nem que seja pela porta dos fundos.
Suspiro e me jogo de novo no sofá.
— E a senhora, hein? Vive me enchendo, mas nunca apresenta ninguém decente!
Ela dá um sorrisinho tímido e volta a se sentar.
— Na verdade... eu estou trabalhando nisso — responde, misteriosa.
— O quê?! Tem alguém?! — Me animo, largando o controle e voltando toda empolgada com o pote de sorvete na mão.
Ela se ajeita toda, dramática como sempre.
— Sim. Ele tem cinquenta e nove anos. Tem uma empresa de gerenciamento de mercados. Me levou pra jantar, me deu flores, chocolates... e pergunta como eu estou me sentindo.
Os olhos dela brilham de um jeito tão doce que me dá vontade de abraçá-la.
— Tia... acho que a senhora está apaixonada.
— Acho? Menina, eu estou quase aprendendo a usar emojis só pra mandar bom dia com coraçãozinho.
Rimos juntas e passamos o resto da noite no sofá, comendo sorvete direto do pote, assistindo novela e rindo de tudo e de nada. E ali, naquele cantinho simples e cheio de amor, por um momento esqueci que meu coração estava uma bagunça... por causa de um certo CEO de olhos verdes que prometeu vir me buscar.
O outro dia amanhece com uma notificação inesperada.
No grupo chamado “Os Subordinados” — sim, esse é mesmo o nome — onde só estão eu, Davi e claro, o próprio Lorenzo, aparece uma mensagem enigmática. Ele mandou uma localização seguida da ordem:
"Hoje, nada de empresa. Preciso ensinar algo a vocês."
Antes que eu pudesse digerir o susto, Davi já responde:
"Se eu desaparecer, deixei uma carta acusando nosso chefe de maus-tratos e escravidão corporativa."
Dou uma gargalhada tão alta que acordo o gato da vizinha — que dorme no parapeito da minha janela como se pagasse aluguel. Mando uma figurinha do Davi fazendo cara de pânico e ele responde:
"Sacanagem, Bruna. Lealdade zero."
Me arrasto até o banheiro ainda rindo e começo a me arrumar, mas, como de costume, acabo me atrasando. Coloco a tal localização no GPS e... bem, ou meu aplicativo surtou ou Lorenzo resolveu brincar de filme de ação.
A parada final? Em frente a uma academia de boxe.
Franzo a testa e encaro a fachada como se esperasse que ela falasse algo de volta.
"Você precisa me socorrer, estou sendo sequestrado emocionalmente," escreve Davi, e isso é o suficiente para me fazer entrar, já rindo.
O que eu vejo ao atravessar a porta? Lorenzo e Davi no ringue, como se estivessem ensaiando um spin-off de Rocky Balboa versão executivos.
— O que é isso? — pergunto, me aproximando, quase tropeçando de tanto rir. — O que estamos fazendo aqui?
— Ele quer nos matar de vez! — grita Davi, com o pescoço esmagado debaixo do braço de Lorenzo, como se fosse um urso tentando convencer a presa a entregar a senha do Wi-Fi.
Lorenzo, impassível como sempre, o solta e sai do ringue pegando uma garrafinha de água como quem terminou uma reunião de alinhamento trimestral.
— Olha, isso com certeza não estava no meu contrato — digo, cruzando os braços e tentando manter uma expressão séria, mas falhando miseravelmente.
— A partir de hoje, vocês vão receber treinamento de defesa pessoal — ele diz, como se fosse a coisa mais lógica do mundo.
Dou uma risada curta, sem acreditar.
— Treinamento? Defesa pessoal? Agora?
— Precisam estar preparados para qualquer situação. Vocês trabalham diretamente comigo. É o mínimo.
— Mínimo pra quê? Se a economia cair e a gente precisar assaltar um banco? — brinco, rindo ainda mais. — Olha, até que tô começando a gostar mais do meu emprego...
Davi geme ao fundo, caído no tatame como se estivesse repensando toda a vida profissional dele.
— Pode ir se aquecendo — diz Lorenzo, apontando pra mim com aquele tom de voz que não aceita "não" como resposta.
E ali estou eu: de tênis, rabo de cavalo e um uniforme emprestado da academia, tentando aprender a me defender... do meu próprio chefe.
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Atualizado até capítulo 31
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