Baran Cevrit.

Tinha 19 anos quando ouvi o nome dela pela primeira vez.

Meu nome é Baran Cevrit, filho de Akif e Alice. Turco por sangue, protetor por instinto. Cresci cercado por códigos de honra, armas escondidas em ternos de alfaiataria e sussurros sobre lealdade que podiam valer mais do que a própria vida.

Gosto do silêncio. Gosto de armas limpas. Gosto de vinho tinto no final de um dia em que tudo permaneceu sob meu controle.

E odeio covardes.

Talvez por isso minha obsessão por proteger tenha nascido tão cedo. Mulheres, para mim, são sagradas, minha mãe, minha tia-avó, minhas primas, minhas aliadas. Quem ousa encostar nelas, conhece o inferno que eu carrego no olhar.

Era uma noite quente em Istambul. Eu havia acabado de chegar do porto, onde tínhamos encerrado uma negociação com os aliados. Estava suado, cansado... mas ainda desperto. O telefone da sala tocou com um peso que fez meu pai parar de falar no meio da frase.

Ele atendeu.

— Noah?

A voz do Don era firme. Rara, carregada de urgência. E quando ele ligava, era porque algo estava por ruir.

Ouvi tudo, parado na porta, braços cruzados, olhos atentos ao rosto do nosso pai.

— A irmã de Alana... — ele disse baixo, como se experimentasse as palavras. — Ela tem 14. Sim... sim... um contrato de casamento falso é a opção. Para mantê-la longe do tio. Que filho da...

Ele respirou fundo.

Silêncio.

— Mande o nome completo. Eu vou falar com meu filho.

Meu pai desligou. Virou-se para mim.

Seu semblante era de aço, como sempre. Mas algo ali queimava nos olhos, responsabilidade, a mesma sensação de que devíamos fazer de tudo por uma menina em risco, a mesma coisa que ele fez pela minha mãe anos atrás.

— O nome dela é Isadora Duarte.

— Quem é? — perguntei, direto, e porque seu tio é um filho da puta?

— Irmã da Alana. Sobrinha do bastardo que quer a entregar em casamento a qualquer um que lhe dê um tostão. Noah pediu ajuda. Queremos manter a garota segura. E só há um jeito de colocá-la sob proteção sem levantar suspeitas.

Eu já sabia a resposta.

— Casamento — repeti. — se ela tem 14 anos é um contrato.

Meu pai assentiu, lento.

— Ela seria enviada para cá, para ficar com a gente. Mas o contrato precisa ser com alguém da família. Alguém novo, fora dos radares. Alguém que saiba proteger sem deixar rastros.

Minha voz não tremeu:

— Eu aceito.

Ele arqueou a sobrancelha, surpreso.

— Sem pensar? Com quatorze anos ela seria nossa responsabilidade por mais de 4 anos.

— Pai, se essa garota tem sangue inocente, se alguém cogitou encostar um dedo nela... já me basta.

— Você nem a conhece. — ele questionou.

— E isso muda o quê? Lembra de como salvou minha mãe, a idade era um empecilho?

Fui para o quarto, tomei um banho gelado e vesti preto. Sempre preto. Quando me olhei no espelho, enxerguei o que eu era:

Arma. Muralha. Sentença.

Era isso que ela teria ao lado dela. Um homem que não vacila.

E mesmo sem ter visto seu rosto, Isadora Duarte já era minha para proteger.

A mansão na Toscana estava silenciosa.

O tipo de silêncio que só existe quando algo importante está prestes a acontecer, ou quando todos sabem que sangue poderia ser derramado a qualquer momento.

Eu estava de pé ao lado da lareira, observando a porta de entrada, meu pai à frente, como sempre. Minha mãe sentada, inquieta, com as mãos cruzadas no colo. Todos esperavam a chegada do “tio”.

Aquele desgraçado.

Ouvi o motor do carro antes mesmo dele aparecer. Longo, caro, pretensioso. A porta se abriu. Primeiro, o velho. Postura ereta, o ego inflado até os olhos. Ele carregava arrogância como quem carrega um relógio de ouro, visível e ofensiva.

Atrás dele, uma mulher mais velha, a governanta. E então, entre os dois, ela.

Isadora Duarte.

Eu nem sabia o nome ainda, mas meu corpo soube.

Era ela.

A razão do contrato.

A irmã de Alana.

A garota que meu pai me designaria proteger, mas que, antes mesmo de qualquer ordem, já era minha.

Ela parecia frágil. Tinha os ombros tensos, a mochila pendurada no braço e os olhos… os olhos mais confusos e vazios que eu já tinha visto.

Era como ver alguém andando no meio de um incêndio sem perceber que estava queimando.

E aí o velho segurou o braço dela.

Firme. Como se ela fosse um objeto.

Meus punhos se fecharam automaticamente.

Eu senti o ódio subir, ácido, lento, real.

Tive vontade de atravessar o saguão e quebrar cada osso daquele homem, mas o olhar do meu pai me conteve.

Ele sabia.

Todos sabiam.

Mas naquele momento, eu decidi.

Não por ordem.

Não por nome.

Por instinto.

Aquela garota nunca mais seria encostada por ninguém.

**

No escritório, as negociações foram rápidas.

Noah e meu pai cuidaram de tudo. O velho só queria se livrar da responsabilidade, nem se preocupava em esconder isso.

Ele assinou os papéis sorrindo.

E eu só não matei ele porque não teria sido limpo o suficiente.

Quando saímos da sala, minha cabeça ainda fervia.

Subi até o quarto, peguei meu celular e procurei o número dela: Anya.

Ela atendeu na terceira chamada.

— Baran... você tá vivo? Sumiu — ela riu.

— Não posso mais te ver.

— O quê? — a voz dela caiu. — Como assim?

— Estou noivo.

— De quem? — ela soou quase ofendida. — Isso é brincadeira?

— Não.

— Baran, você me jurou que não ia se envolver agora.

— Eu não juro nada para ninguém. Isso acabou. É melhor você aceitar.

— Não faz isso comigo. A gente se conhece há anos...

— E não vamos nos ver nunca mais.

E eu desliguei.

Frio. Seco. Sem arrependimentos, agora sem distração, enquanto era sozinho tinha essa liberdade, mas agora acabou..

**

Na manhã seguinte, o jato estava pronto.

Levá-la para a Turquia era mais do que protocolo, era tirá-la do alcance daquele velho.

Durante o voo, ela mal falou.

Ficou o tempo todo olhando pela janela, encolhida no canto, como quem esperava acordar e perceber que tudo era só mais um pesadelo.

A mansão Cevrit em Istambul já estava pronta para recebê-la.

Minha mãe, Yasmin, Eymen, todos envolvidos.

Mas fui eu quem a guiou.

Mostrei os jardins, os corredores de pedra clara, os detalhes arquitetônicos do séc. XIX, os quartos preparados.

Ela andava devagar, silenciosa, observando tudo com receio.

Até que parei diante da porta do quarto dela.

— É seu — falei.

Ela me olhou.

Como se não entendesse.

— Você está segura aqui, Isadora. Isso não é só um contrato. É uma promessa.

Ela não respondeu.

Mas pela primeira vez, respirou fundo.

E naquele suspiro…

Eu soube que a guerra que eu teria que travar por ela — com o mundo e comigo mesmo — apenas começava.

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Comments

Renata Boaro

Renata Boaro

comecei ler ontem tudo indica que vai ser mais uma história boa . será que essa ex vai deixar para lá mesmo vamos ver nos próximos capítulos.

2025-07-15

3

Leitora compulsiva

Leitora compulsiva

que bom que ela achou alguém que se importa com ela

2025-07-17

1

Andreza Jacques

Andreza Jacques

comecei ler agora dia 22/07/25.
já estou amando.

2025-07-22

0

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