Florença amanhecia dourada naquela sexta-feira de céu limpo, mas dentro da mansão Bellini o tempo ainda caminhava devagar.
Aurora estava sentada no pequeno terraço anexo ao estúdio de dança. Vestia um robe azul-claro, os cabelos presos num coque alto, e os olhos fixos no horizonte. À sua frente, uma xícara de chá com mel esfriava sobre a mesinha. Ela não tinha fome. Nem sede. Só o vazio constante de quem foi traída onde menos esperava.
Leonardo passou por ela sem dizer nada, apenas tocou seu ombro com leveza. Donatella a observava à distância, tentando respeitar o tempo da filha. Salvatore lia o jornal, mas mantinha o olhar sempre vigilante, como se qualquer movimento em falso do mundo pudesse feri-la de novo.
Era o nono dia desde que ela voltara.
E nenhuma palavra havia sido dita sobre Dante Moretti.
Aurora não o mencionava. Não respondia às chamadas, às mensagens, às cartas entregues por empregados. Tudo era ignorado. Como se ele já não existisse.
E ainda assim… ele estava em todos os lugares.
No banco do jardim onde ela costumava falar com ele por videochamada nas viagens. No vitral da cozinha onde os dois riram enquanto ela tentava fazer massa e acabou coberta de farinha. Na ponta dos dedos dela, ainda trêmulos, quando tocava a barra do collant de ensaio.
Ela se perguntava, em silêncio: será que era possível esquecer alguém que destruiu seu coração, mas que também o preencheu por tanto tempo?
No décimo dia, Aurora voltou a patinar.
Sozinha. Ao amanhecer.
Leonardo encontrou o salão antigo aberto, e ali estava ela: no centro da pista, patins nos pés, os cabelos soltos, rodando em silêncio com uma lentidão quase hipnótica. O vestido branco flutuava com os giros leves. Seu corpo ainda estava rígido, os movimentos não eram os mesmos, mas... ela estava tentando.
Ela deslizou, girou, respirou.
Mas quando parou no centro, os olhos se encheram de lágrimas. Não por dor física — mas pela lembrança do olhar de Dante na primeira vez que a viu patinar.
Ela caiu de joelhos no gelo. Chorou baixinho.
Leonardo entrou, correu até ela e a segurou nos braços.
— Não precisa provar nada pra ninguém, irmãzinha.
Ela encostou a testa no ombro dele.
— Não é sobre os outros. É sobre mim. Eu não quero mais ser a sombra de ninguém.
Naquela mesma noite, enquanto Aurora tentava dormir no quarto que já começava a parecer seu novamente, um carro preto estacionou novamente diante dos portões da mansão Bellini.
Dante Moretti permaneceu dentro do carro. Não desceu.
Tinha nos olhos um vazio que nem o tempo conseguia curar. A barba por fazer, a camisa desabotoada no colarinho, e nas mãos uma pequena caixa com um colar de cristal azul — o mesmo que ela admirava numa vitrine em Capri, meses atrás.
Ele tentou uma última vez.
Mensagem enviada:
"Aurora, eu não sei como continuar sem você. Sei que te feri. Sei que não mereço. Mas eu te amo. Pela mulher que você é. Não pela lembrança de ninguém. Por favor… me deixe ver você."
Mensagem lida. Nenhuma resposta.
Ele permaneceu no carro por horas.
Até que, sem forças, foi embora novamente.
Em Roma, em uma cobertura cercada de luxo, Beatrice Conti caminhava em círculos pela sala, vestindo um robe de seda preta. Ela segurava um tablet com uma foto congelada de Aurora dançando.
Sim. Ela tinha um dossiê.
Cada passo da atual — ou melhor, ex — de Dante, estava sendo monitorado. O nome “Aurora Bellini” era uma obsessão que Beatrice alimentava em silêncio.
— Ela ainda está na casa dos pais — disse Matteo ao celular. — Não responde ao Dante. Mas não demora pra ele ir até ela de novo.
Beatrice sorriu. Um sorriso seco, venenoso.
— Ele vai se cansar de ser ignorado. E quando estiver mais vulnerável, eu estarei lá.
— E se ela voltar?
— Ela não vai. — Beatrice se aproximou da janela. — Mas se voltar… não vai durar.
Silêncio.
— Ela não sabe jogar, Matteo. Mas eu sei.
Beatrice se virou, jogando os cabelos para trás. Um olhar de guerra brilhava em seus olhos cor de mel
— Não se vence um Moretti com pureza. Só se vence com sangue frio.
Florença seguia calma.
Mas as primeiras peças estavam se movendo no tabuleiro.
E Aurora… ainda ignorava o caos que se aproximava.
Continua
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Atualizado até capítulo 60
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