Dez anos mais tarde...
Anthony caminhou até a vidraça de sua empresa e fechou os olhos, tentando esconder a dor que o corroía naquele momento. A secretária abriu a porta discretamente.
— Senhor? Estão todos prontos.
Ele se virou e assentiu com a cabeça.
Durante a caminhada fúnebre, Anthony não conseguia pensar em outra coisa a não ser em tudo o que havia vivido ao lado do tio. Emanuel cuidara dele após a morte dos pais. Era um homem de meia-idade na época, paciente, bondoso... Anthony nunca entendeu por que ele nunca se casou ou teve filhos. A verdade é que Emanuel dedicou a vida a vê-lo feliz. Foi ele quem lhe ensinou tudo, quem acreditou que ele seria capaz de manter o legado da família.
Anthony olhou para o céu e viu nuvens escuras se formando. Que dia horrível para morrer... O tio devia estar indignado em algum lugar do além — ele odiava dias chuvosos. Anthony sorriu de canto. Aquilo devia ser castigo por ele nunca dar a parte dos santos.
— O senhor está bem? — perguntou Sidney, o contador da empresa, sempre prestativo.
— Estou, sim. Meu tio não gostaria de me ver triste. Ele sempre dizia que queria um velório alegre... Mas fazer promessas é bem mais fácil do que cumpri-las.
Sidney suspirou.
— Eu entendo. Quando meu pai faleceu há cinco anos, fiz tudo como ele queria... Mas, no fim do dia, eu ainda me sentia quebrado. Como se nada fosse suficiente.
Anthony apenas assentiu. Deixar Emanuel partir estava sendo mais difícil do que ele imaginava.
As semanas seguintes foram de trabalho intenso. Anthony mergulhou de cabeça na empresa, como uma forma de fugir da dor. Evitava parar, pois sabia que, se o fizesse, pensaria no tio — e isso o deixaria ainda mais triste. Mas seu corpo já dava sinais de esgotamento. Os olhos pesavam, pediam descanso, e ele não sabia como conceder isso sem acabar se perdendo na escuridão.
Sidney entrou na sala com alguns papéis nas mãos.
— Senhor, podemos conversar?
— Pode falar.
— É sobre o haras Três Corações. Acho que teremos que vendê-lo.
— Vender? De jeito nenhum! — Anthony se levantou abruptamente. — Aquele era o lugar preferido do meu tio. Nem me venha com história de crise financeira, porque não é o caso. Tenho cavalos premiados lá, puro-sangue! E a empresa vai muito bem, cada vez mais forte...
— Eu sei, senhor...
— Então por quê?
— Por falta de funcionários. Desde que seu tio faleceu, começou uma demissão em massa. Já tentamos novas contratações, mas ninguém quer ficar por lá. Estão todos revoltados.
— Até o Andrew?
— Não, Andrew continua firme. Mas já perdemos mais de vinte pessoas. O serviço está acumulando, e a situação está ficando insustentável.
Anthony suspirou, derrotado.
— Eu estava tentando não pensar nisso... Mas talvez seja hora de dar atenção a isso. A empresa vai bem, está prestes a atingir um pico de lucros. Mas eu... estou exausto.
Ele hesitou.
— Avise que estou voltando.
— Para o haras?
— Sim. Vou passar um tempo lá. Recuperar os funcionários, dar um novo rumo àquele lugar. Avise a Anabelle para preparar tudo para minha chegada.
— Sim, senhor.
Sidney saiu e repassou o recado à secretária, que logo ligou para a casa da fazenda.
Anabelle recebeu a notícia com animação. Fazia pelo menos cinco anos que não via Anthony. Ele se afastara do haras quando o tio adoecera — não conseguia suportar vê-lo definhando. Anabelle, governanta da fazenda há quinze anos, crescera ali. Sabia que Emanuel sonhava vê-la casada com o sobrinho, e não foram poucas as vezes que ele lhe deu dicas para fisgá-lo. Mas Anthony sempre foi direto: não queria formar família, não era esse tipo de homem.
Mas agora ele estava voltando.
E machucado.
Talvez, pensava Anabelle, fosse o momento de conquistá-lo. Seria o ombro amigo, a mulher que o tiraria do fundo do poço... e quem sabe, o faria enxergá-la com outros olhos.
Os funcionários foram convocados às pressas, enfileirados como em um quartel. Na verdade, estavam mesmo em um regime quase militar. O motivo de tantas demissões tinha nome e sobrenome: Anabelle Lucenberg, mais conhecida entre os empregados como "a boneca do mal".
Nenhum funcionário gostava dela. Arrogante, antipática e mandona, era óbvio que não se via como uma simples funcionária.
Lourdes viu Aiana correr em sua direção e entrar na fila.
— Tá atrasada.
— Eu sei. A Marina fugiu de novo hoje cedo. Quase não consegui pegá-la.
Marina era a cabra de estimação de Aiana. Nascera cega, mas parecia ter um talento especial para encontrar cercas abertas. E, quando escapava, era um caos. Aiana tinha um jeito especial com ela, mas mesmo assim, dava dor de cabeça.
Anabelle se aproximou.
— O assunto parece tão divertido. Querem compartilhar com o restante?
Aiana suspirou. Já estava farta daquela mulher. Ergueu a cabeça e a encarou.
— Não acho que seja do seu nível de entendimento.
Os colegas engoliram a risada — alguns não resistiram. Anabelle estreitou os olhos. Odiava aquela petulante, sempre cheia de respostas afiadas. Em outros tempos, teria mandado Aiana embora. Mas com a chegada de Anthony tão próxima, não podia abrir mão de ninguém.
— Três noites na estrebaria devem refrescar sua memória sobre o seu verdadeiro nível aqui dentro!
Aiana abriu a boca, chocada. Dormir na estrebaria? Isso era desumano. Lourdes a olhou com pena, mas Aiana apenas cerrou os punhos. Estava fervendo por dentro. Queria socar o rosto daquela mulher... Mas precisava do emprego.
— Sem problemas — respondeu, virando-se. — Pelo menos lá, só tem vacas no sentido literal.
Saiu da fila, deixando risos e palmas para trás. Sabia que estava encrencada. Provavelmente ficaria sem almoço também, mas já não se importava. Não ia mais abaixar a cabeça. Precisava do trabalho, sim. Mas não aceitaria ser humilhada por ninguém.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 62
Comments