O jantar

Foi então que um dia, de repente, tudo mudou.

Minha mãe preparou um jantar lindo. A casa inteira estava arrumada, cheirando a comida boa e flores frescas na mesa.

— Hoje vamos receber algumas pessoas importantes — ela disse, sorrindo. — Quero que estejam bem arrumados, por favor.

Achei estranho. A gente nunca recebia visitas. Meu pai não gostava de movimentação em casa. Ele era discreto, misterioso...

Mesmo assim, não perguntei muito. Apenas subi para o quarto, vesti um vestido simples, ajeitei o cabelo e desci.

No fundo, alguma coisa dentro de mim dizia que aquela noite não seria como as outras. Que algo estava para acontecer. E eu não fazia ideia do que era.

Melissa

As visitas chegaram pontualmente às oito.

Meu coração acelerou sem motivo quando ouvi a campainha tocar. Desci devagar, meio curiosa, meio nervosa.

Meu pai, que raramente demonstrava qualquer emoção, ajeitou a postura e foi até a porta com um certo respeito no olhar.

Quando ele abriu, vi um homem alto, mais velho que ele, mas com uma presença tão forte que parecia dominar o ambiente só com o olhar.

Ele tinha olhos azuis profundos, como se escondessem segredos antigos. O cabelo grisalho combinava perfeitamente com a pele morena, bem cuidada. Mas o que mais me chamou atenção foi a maneira como ele observava tudo ao redor — com atenção, como se enxergasse muito mais do que qualquer um era capaz de ver.

Ao lado dele, uma mulher mais jovem, talvez uns 30 e poucos anos, linda como uma deusa. Ela tinha os olhos cor de mel, cabelos cacheados e longos que caíam como uma cascata até a cintura. Baixinha, com curvas perfeitas e um sorriso leve, mas enigmático.

Assim que me viu, ela virou-se para meu pai com uma expressão curiosa, quase surpresa, e disse com a voz suave, mas firme:

Eles entraram e foram recebidos com elegância. A mulher, que logo descobri se chamar Liza, era esposa do homem de olhos intensos — Dom, foi como minha mãe o chamou, com uma certa reverência.

— Ele é patrão do seu pai — ela me explicou, como se aquilo fosse suficiente para esclarecer tudo. Mas pra mim, não era.

Eu nunca soube com o que meu pai trabalhava, e ouvir aquilo só me fez ter ainda mais perguntas.

O jantar estava bonito, cheiroso, aconchegante. Minha mãe parecia feliz em receber visitas. Conversava com Liza como se fossem amigas de longa data, rindo, trocando elogios e histórias.

Meu pai, por outro lado, falava pouco. Estava mais sério do que o normal, e isso dizia muito. Seus olhos pareciam pesar mais do que nunca.

Lucas, meu irmão, ficou calado o tempo todo, observando tudo com atenção, como se tentasse entender algo que ninguém dizia em voz alta. Minha irmãzinha Ana, ainda inocente, comia e brincava como se nada importasse — e talvez, pra ela, ainda não importasse mesmo.

E eu…

Eu não conseguia dizer o que estava sentindo. Não era medo. Não era exatamente incômodo. Mas havia algo ali, suspenso no ar, como um segredo prestes a ser revelado.

Foi quando Dom, com sua voz grave e calma, que parecia cortar o silêncio como faca, se virou para mim:

— Quantos anos você tem, Mel?

Antes que eu pudesse responder, senti os olhos do meu pai sobre mim. Ele ficou rígido, como se tivesse levado um choque.

Olhei para ele, depois para Dom, e respondi devagar, tentando parecer natural:

— Tenho quatorze... vou fazer quinze Faltam quatro dias.

Dom sustentou o olhar sobre mim por um instante. Depois, deu um leve sorriso — pequeno demais para ser afetuoso, mas intenso o suficiente para me fazer arrepiar.

— quinze anos... — ele repetiu, como se esse número tivesse um significado especial que só ele compreendia.

O silêncio voltou à mesa, sutil, mas pesado. E foi ali, naquele instante, que eu percebi:

aquele jantar não era apenas uma visita social.

Era sobre mim.

Mesmo sem entender por quê.

Depois da pergunta de Dom, o jantar pareceu perder o sabor.

Meu pai ficou ainda mais calado, e minha mãe, mesmo sorrindo, percebia algo diferente. Olhava de um lado pro outro tentando entender o que estava acontecendo, sem coragem de perguntar.

Eu, sentada ali, me sentia como se fosse o centro de algo invisível, algo que só os adultos à mesa pareciam conhecer — mas se recusavam a dizer em voz alta.

Então, tentei mudar de assunto.

— Mamãe, o bolo da sobremesa é o de cenoura com calda de chocolate? — perguntei, forçando um sorriso.

Ela sorriu de volta, aliviada com a quebra da tensão.

— É sim, meu amor. Seu preferido, lembra?

— Hummm, que sorte a nossa — disse Liza, tentando entrar no clima. — Cenoura com chocolate... combinação poderosa.

Meu pai apenas respirou fundo, como se quisesse dizer algo, mas se segurou. Dom também não disse mais nada. Apenas me observava com aquele olhar firme e distante.

Melissa (mel)

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