A casa parecia respirar memórias em cada canto.
Depois do reencontro com Alessandro, eu tentei manter a pose. Mas a verdade é que meus passos estavam mais pesados e minha mente não parava de rodar. A maneira como ele me olhou, como falou meu nome... era como se nada tivesse passado. E, ao mesmo tempo, como se tudo tivesse se transformado em algo que não sabíamos como consertar.
Eu estava na varanda da frente quando ouvi uma gargalhada alta e inconfundível ecoando pelo quintal. Levantei os olhos a tempo de ver Lisa correndo em minha direção, descalça, com os cabelos soltos voando ao vento.
— Manuela! — ela gritou, com os braços abertos.
Levantei da cadeira antes mesmo de pensar. Quando percebi, já estávamos nos abraçando com força, como se os anos não tivessem passado, como se ainda fôssemos duas adolescentes inventando apelidos uma pra outra e dividindo sonhos sob a luz da lua.
— Meu Deus do céu, você tá maravilhosa! — Lisa disse, me segurando pelos ombros e me examinando de cima a baixo. — Você virou gente de novela, mulher!
— E você continua igualzinha. — sorri, emocionada. — Linda, escandalosa e com esse coração enorme.
— Eu quase não acreditei quando a mamãe disse que você vinha. Você prometeu voltar. E mesmo depois de tanto tempo, eu acreditei que um dia ia acontecer.
— Eu precisei fugir, Lisa. Você sabe... eu não consegui ficar depois do que aconteceu.
Ela assentiu, e por um momento o clima ficou mais sério.
— Vem, vamos andar um pouco. — ela disse, puxando minha mão. — Preciso te contar tanta coisa…
Caminhamos pela lateral da casa, em direção ao antigo pomar. O cheiro de laranja e terra misturado com o vento da tarde era exatamente como eu lembrava. Meus saltos afundavam na grama, mas eu nem ligava.
Nos sentamos sob o carvalho velho, o mesmo que tantas vezes foi nosso esconderijo.
— Você e Alessandro... — ela começou. — Foi tudo muito intenso, né?
Assenti, olhando para as folhas que dançavam com a brisa.
— Ele foi tudo pra mim naquela época. Meu primeiro amor. Minha primeira dor também.
Lisa mordeu o lábio, pensativa.
— Eu nunca entendi aquilo direito. Aquela noite no celeiro… tudo foi tão estranho. A Vitória sempre foi... manipuladora. Desde pequena.
Olhei pra ela, surpresa.
— Você acha que aquilo foi armado?
— Eu não acho. — ela disse com firmeza. — Eu tenho certeza. E já faz tempo que eu queria te contar.
Meu coração acelerou.
— Por quê você nunca disse nada?
— Porque você sumiu. Foi embora de um dia pro outro. E Alessandro... ele entrou numa concha. Ficou fechado, diferente. Meu irmão nunca foi de se explicar muito, você sabe disso. E eu... eu era só a irmã caçula. Ninguém me ouvia.
— Mas o que você sabe, Lisa?
Ela respirou fundo.
— Eu lembro que, naquela semana, a Vitória vinha falando pra todo mundo que ia "acabar com esse teatrinho de faz de conta" entre vocês dois. Disse que o Alessandro nunca ia se casar com você, que ele pertencia àquele lugar, e que você não. Eu achei que era só inveja… até que, um dia, ouvi ela conversando com uma amiga.
— O que ela disse?
— Que ia esperar o Alessandro estar sozinho no celeiro. Que ia provocá-lo. Que sabia como beijá-lo na hora certa... quando você estivesse perto.
Eu fiquei em silêncio. A cena ainda estava gravada na minha memória com tinta vermelha: os dois próximos, os olhos dele desviando dos meus, a mão dela tocando o rosto dele, o beijo. E a dor. A mágoa. A certeza de que eu não era o suficiente.
— Mas ele não se afastou, Lisa. Ele não reagiu.
— Você viu um segundo. Um momento. — ela disse suavemente. — Mas não viu o depois. Não viu o escândalo que ele fez com ela, nem como ele ficou. Eu lembro de ter escutado ele discutindo com mamãe. Ele dizia que tinha sido pego de surpresa, que não sabia o que fazer quando te viu ali. Que não acreditava que você tinha ido embora sem dar a ele uma chance de se explicar.
Fechei os olhos. A raiva que eu sentia era antiga, mas ainda viva. Só que, pela primeira vez, ela começava a rachar por dentro.
— Ele nunca tentou me procurar. — murmurei.
— Você mudou de telefone, de endereço, foi embora do país por um tempo. Como ele ia te encontrar?
Eu engoli em seco. Aquilo doía porque, no fundo, parte de mim ainda queria acreditar que ele teria me seguido. Que teria feito qualquer coisa. Mas a verdade é que talvez eu também tenha feito de tudo para não ser encontrada.
— Você... ainda ama ele? — Lisa perguntou, com delicadeza.
— Eu tô noiva, Lisa.
—Isso não responde minha pergunta.
Suspirei.
— Não sei o que eu sinto. Só sei que estar aqui mexe com tudo. Inclusive comigo mesma.
Ela encostou a cabeça no meu ombro, como fazia quando éramos mais novas.
— Talvez seja hora de descobrir o que ficou enterrado, Manuela. Nem tudo é como a gente lembra. Às vezes, a dor faz a gente inventar verdades pra se proteger.
Ficamos ali em silêncio por um tempo. O sol começava a cair, pintando o céu com tons de rosa e laranja. E o campo, com todo seu silêncio, parecia guardar mais histórias do que eu estava pronta para ouvir.
Quando voltamos para a casa, Alessandro não estava por perto. E isso me tranquilizou, por ora.
Mas lá no fundo, eu sabia: aquele reencontro não seria o último.
E a verdade... essa ainda estava cavando seu caminho até mim.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 45
Comments
Eloi Silva
queria foto deles por favor autora
2025-07-18
2
Fatima Gonçalves
CARAMBA QUE VÍBORA ESSA NOSSA
2025-07-23
1